Crónica de Alexandre Honrado – Leituras e revisões durante o confinamento

Leituras e revisões durante o confinamento Por Alexandre Honrado   Não sei bem, pelo menos ao certo, porque me detenho tão longamente sobre textos de autores com os quais discordo. Alguns desapontam-me tanto que acho incrível terem sido escritos por seres humanos sem marca visível de humanidade. Pode parecer masoquismo; estarei longe disso, porém. Não tenho o menor gosto pelas ideias deste e daquele, no entanto reconheço que a forma como as defendem e lançam ao mundo, acabam por interessar-me e ajudam-me a produzir maior firmeza nas minhas próprias ideias…

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Crónica de Jorge C Ferreira | As vacinas e as vácinas

As vacinas e as vácinas por Jorge C Ferreira   Fui pedir um café e um queque ao postigo. Depois sentei-me num muro a deglutir desejos. Estava sol e os raios dardejavam a cara, o cabelo e a barba. Estou ainda com ar de homem encontrado, com o cabelo comprido e a barba por desfazer, após ter estado metido numa caverna. Sou a figura desenhada da pandemia. Passo por pessoas que me falam e eu respondo. Tenho de perguntar quem são. As pessoas estão diferentes e as máscaras não ajudam.…

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Crónica de Alice Vieira | Sair ou não sair – Eis a questão

Sair ou não sair – Eis a questão Por Alice Vieira   Há um conto de um autor húngaro, de que não sei o nome, (mas que pertence a uma antologia de contos húngaros, traduzida pelo meu amigo Ernesto Rodrigues),  de que me tenho lembrado muito nestes últimos tempos. É um conto brevíssimo. A história de uma mulher presa há muitos anos e que, de repente, foi posta em liberdade. Ela vivia na prisão com uma filha pequenina, que nunca conhecera outra vida. Então, uns dias antes de ser posta…

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Crónica de Alexandre Honrado – A história é muito feia

A história é muito feia Por Alexandre Honrado   A História mostra-nos a fealdade da progressão humana, desde as raízes mais remotas às desilusões dos dias que vivemos. Somos o resultado de muitos ancestrais que, para levarem pão à boca, à sua e só às vezes às dos seus, não olharam a meios para atingirem fins que não eram mais do que os do egoísmo cruel a que chamamos sobrevivência. A esmagadora maioria das sociedades históricas só o foram por eliminação, progressiva e consciente, das sociedades que as tinham precedido. …

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Crónica de Jorge C Ferreira | Resistir

Resistir por Jorge C Ferreira   Continuamos, por aqui, neste tempo perdido. Tanto tempo desperdiçado! Sonhamos com a liberdade. Uma festa breve e, por vezes, com ressaca. Sinto-me uma ilha. Um espaço que ocupo e espera que o mundo o venha visitar. Sou do mar, sou amante das ilhas. Sou filho do mundo. Nasci das águas mais puras. Fui aspergido por águas bentas. Vivi sempre como pude. Algumas vezes como me deixaram viver. Nunca sobrevivi assim. Somos duas ilhas que por este espaço navegamos. Encontramo-nos num beijo de espuma. Somos…

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Crónica de Alexandre Honrado – Companheiro, aqui estou!

Companheiro, aqui estou! Por Alexandre Honrado   Gosto desta palavra: companheiro. Fazer companhia é uma arte subtil, é preciso saber como fazê-lo, isto é, parcimoniosamente, sem atropelos, sem dar demasiado ou sonegar em demasia, respeitando. Dar sem esperar receber, ou receber inesperadamente uma dádiva que, inconscientemente, era o que mais precisávamos. (Uma golfada de afeto para o coração funcionar a plenos pulmões? Ou esta é uma frase suficientemente confusa para saltar por cima?). Há companheiras e companheiros para a vida e repare-se que não falo apenas de seres humanos, incluo…

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Crónica de Licínia Quitério | De ontem e de hoje – O senhor Leocádio

Licínia Quitério

O senhor Leocádio por Licínia Quitério Quem havia de dizer que o senhor Leocádio também existe fora do seu sítio de pacotes, latas, frascos, caixas, todos de variados feitios, tamanhos, cores, a cada um o seu rótulo, o seu logótipo, o seu apelo mudo ao cliente, ao potencial cliente, ao curioso visitante, na oferta das bolachas, dos cogumelos, do atum, da margarina, do fiambre. Há que referir ainda os produtos frescos, e os secos, avulsos nas caixas, nas tulhas, para o cliente, o potencial cliente, avaliar a cor, a frescura,…

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Crónica de Jorge C Ferreira | Uma madrugada

Uma madrugada por Jorge C Ferreira   Era madrugada alta. Sei isso porque já dormia. O telefone tocou. Atendi a chamada. Do outro lado uma voz, trémula de emoção, disse-me: «vê a televisão». Não me lembro quem era.  Veio-me à memória outra antiga madrugada em que me telefonaram perto da mesma hora e me disseram: «ouve a rádio, estão a colocar marchas militares e acho que andam militares nas ruas». Nessa altura o telefone era fixo e a televisão não funcionava vinte e quatro sobre vinte e quatro horas. No…

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Crónica de Alice Vieira | O sacristão de S. Paulo

O sacristão de S. Paulo Por Alice Vieira   Hoje vou contar uma história, que é para animar o pessoal que já anda a bater um bocado com a cabeça nas paredes neste confinamento –necessário, é certo—mas prolongado. E uma história verdadeira. Pelo menos o amigo inglês que ma contou jurou a pés juntos que se tinha passado mesmo assim. A história de um homem que era sacristão na igreja de São Paulo, em Londres. Um dia, por motivos burocráticos, foi-lhe pedido que assinasse um documento e, para espanto de…

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Crónica de Alexandre Honrado – Tudo hoje me parece mera ficção

Tudo hoje me parece mera ficção Por Alexandre Honrado   Engole grandes baldes de ar. É assim que lhe parece, pelo menos. Grandes baldes de ar a invadi-lo quando aos pulmões chega apenas um pedaço ínfimo, um segredo de vida que lhe permite a quase ilusão de respirar. Ilusão é o termo mais apropriado, ilude-se na confusão dos sentidos que provoca a distorção da perceção – a que se inflige e a que lhe é provocada. Nem sabe bem porquê, passa-lhe por instantes o pensamento de que isto não é…

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