Folhetim por Licínia Quitério | Casa de Hóspedes (21º. Episódio)

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FOLHETIM | Uma rubrica de Licínia Quitério

 

Casa de Hóspedes (21º. Episódio)

Já se notam os dias mais pequenos, temos o Outono à porta, é o cair da folha, não gosto desta época, vem-me uma tristeza que não sei bem explicar, eu não, até gosto, se não fosse a minha alergia, as férias passam depressa, o que é bom dura pouco, não tarda temos o Natal, se quiserem mais roupa na cama, a minha coluna já começa a dar sinal, pois, cuidado, segure-se bem nas escadas que são traiçoeiras, se o Albertino me arranjar uns marmelos, o meu pai tem lá tantos, o meu marido adorava a minha marmelada, não seja maroto, mais um anito e sai doutor, o pior vai ser a tropa, também lá fui e não morri, isso era dantes, o filho da minha amiga Zélia coitadinho ficou numa emboscada, malditos turras, então não comem mais, perdemos o apetite, que mosca lhes mordeu, é da mudança de estação, eu cá também ando nervosa, fique para a telenovela que hoje deve-se saber se foi o Danilo, aquele cínico, que roubou o anel, já estou farta é das notícias sobre essa coisa das acções, o Albertino parece que comprou umas, corre-lhe bem a vida, pudera, a vizinhança paga, eu de acções não percebo nada, nem das boas nem das más, até amanhã Sr. Mário, boa noite minhas senhoras.

O Gil foi-se escusando de amores com a Adelaide, os estudos, este ano tem de ser no duro, ela a entender o anúncio do fim, a chorar pelos cantos, a desabafar com a D. Balbina, é uma mulher livre, não tem contas a dar a ninguém, mas o prédio não perdoa desordens sentimentais, uma viúva deve respeito à memória do defunto, tem os filhos, e que belo exemplo lhes está a dar, D. Balbina foi compreensiva, aceitou a confidência, tomou-a como prova de confiança, de amizade até, ao mesmo tempo satisfazia a curiosidade por casos mais ou menos secretos, transgressões de que ela nunca tinha sido capaz, vontade não lhe faltou quando o Silveira a tentou, como um diabo, um diabo lindo, diga-se, mas casado e com filhos, resistiu, balançou mas não caiu, ele desistiu, ela ainda hoje não sabe se fez bem ou mal, nem poderá saber, no outro dia viu-o a descer do autocarro, o coração bateu-lhe forte, ele não a viu, ainda bem, atrás dele desceu a mulher, a legítima, a tal que ele dizia que deixava para ir viver com ela, histórias que já lá vão, a vida vai andando, agora era a Adelaide às voltas com um caso reprovado pelos bons costumes, pelas boas pessoas, e ela, Balbina, a confortá-la, a confortar-se.

(continua)

 


Pode ler (aqui) as outras crónicas de Licínia Quitério.


 

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