Crónica de Alexandre Honrado Escrever ou não escrever-me eis a questão Tenho de confessar que é um sintoma revelador dos meus desequilíbrios mais comezinhos o facto de não escrever. E às vezes a ausência é notória e dorida, acreditem. Quando estou feliz – ou pelo menos motivado – é na escrita que estabeleço os primeiros degraus de uma subida à tona, pois, mesmo sem grande objetivo a cumprir, sei que as ideias escritas fixam e fixam-nos enquanto seres, melhorando graus de entendimento e de sociabilidade, elevando os nossos…
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Crónica de Alice Vieira | Memória curta
Memória curta Por Alice Vieira Hoje vou falar de um grande amigo, meu camarada de redacção do “DN” durante vários anos, que morreu no passado dia 5, a meses de fazer 101 anos. Mas primeiro vou contar uma história divertida. Durante muitos anos o meu amigo foi padre. Chegou a ser director de um seminário, não me lembro bem onde. Mas um dia atravessou-se-lhe no caminho uma verdadeira luz, e não houve nada a fazer. Para ambos foi paixão, que duraria até à sua morte. Deixou de ser…
Ler maisCrónica de Mário de Sousa | Uma lata de Kenco
Crónica de Mário de Sousa Uma lata de Kenco Arrumar a minha garagem hoje convertida em biblioteca e arquivo, termina sempre numa viagem ao passado porque se relê um caderno de apontamentos, se descobre um disco (daqueles de vinil), uma fotografia, um convite, um ínfimo cartão-de-visita, um guardanapo assinado. Por vezes a lágrima resvala num qualquer pedacinho de argila a dizer ‘És o melhor Pai do Mundo’. Tudo isto me fez lembrar a minha lata de café Kenco. Vou-vos contar o porquê desta lata ser importante para mim.…
Ler maisCrónica de Licínia Quitério | De ontem e de hoje – Ir a Lisboa
De ontem e de hoje – Ir a Lisboa por Licínia Quitério Iam a Lisboa visitar as velhas amigas que há muitos anos, tantos quanto somavam três gerações bem contadas, emigraram para a cidade, levadas pelos pais, em busca, como todos os deslocados deste mundo, de melhor fortuna. Moravam numa grande cave que servia de habitação de porteiro, com muitos compartimentos e um longuíssimo corredor. Só menos de metade da casa recebia luz do exterior, através de pequenas janelas basculantes, abertas e fechadas com o auxílio de uma comprida…
Ler maisCrónica de Jorge C Ferreira | Aprender
Aprender por Jorge C Ferreira Eram manhãs que nasciam súbitas dos ventres das madrugadas. Um tempo que passávamos em claro. Não tínhamos dado que a noite tinha acabado. Só os néons e as luzes psicadélicas viviam nas nossas cabeças. Tão jovens e com tanta vontade de viver depressa. Assim nos enrolávamos com a vida. Os beijos eram intensos. Intensos foram todos aqueles amores perdidos. Vir a casa, tomar banho, mudar de roupa. A farda para o trabalho. A outra vida que ia durar muitas horas. Até que os…
Ler maisCrónica de Alice Vieira | E viva o Santo António
E viva o Santo António Por Alice Vieira No dia 6 de Maio, mas de 1957, era publicado o primeiro número do Suplemento Juvenil do Diário de Lisboa. Claro que os mais novos nem sabem do que eu estou a falar, até porque o “Diário de Lisboa” fechou em Novembro de 1990. Então parece que este ano vamos voltar a ter marchas populares. Desde sempre que me lembro de estar entre aquele maralhal todo na Av. da Liberdade a assistir às marchas, mais tarde a entrevistar todos eles …
Ler maisCrónica de Mário de Sousa | ‘Acto da Primavera’ – O Quotidiano Religioso
Crónica de Mário de Sousa ‘Acto da Primavera’ – O Quotidiano Religioso Em 1958, passeando por Trás-os-Montes na busca de moinhos que lhe pudessem ser úteis como elementos de um filme sobre o pão, Manoel de Oliveira tropeçou um dia em três grandes e toscas cruzes de madeira no topo de um cerro. Procurou o seu porquê, obtendo como resposta que aquelas cruzes eram utilizadas na Primavera, numa festa popular onde se recriava a Paixão de Cristo, na localidade de Curalha, arredores de Chaves. Interessa-se pela história e…
Ler maisCrónica de Alexandre Honrado – O que escrever quando é inútil a escrita (três)
Crónica de Alexandre Honrado O que escrever quando é inútil a escrita (três) Dizer o indizível – será o segredo. São Francisco[1], no Speculum perfectionis, afirma: “pois não serão os servidores de Deus senão uma espécie de jograis que têm por missão elevar o coração dos homens e conduzi-los à alegria do espírito?”. Fernando Pessoa estabelece como “as palavras são focos de energia com efeitos invisíveis”[2]. Os exemplos seriam infinitos. Limito-os. Na formulação do espírito, a palavra do Poeta, em geral, é não reverente[3]. Isso pode torná-lo, em…
Ler maisCrónica de Jorge C Ferreira | Viagens
Viagens por Jorge C Ferreira Uma esquina sombria e uma neblina ensombrada. A vida a andar ao contrário numa linguagem difícil de decifrar. Os cantos que deixaram de ser acolhedores. Os vértices que passaram a ser lâminas. O mundo a girar do avesso. É então que viver se torna difícil. Deixar de escutar as vozes, mesmo as mais doces, as que nos enchiam de doçuras. Ficar mudo de medo e as mãos presas e sem serem capazes de escrever uma linha. Sabemos que nos lugares mais longínquos do…
Ler maisCrónica de Alexandre Honrado – O que escrever quando é inútil a escrita (dois)
Crónica de Alexandre Honrado O que escrever quando é inútil a escrita (dois) Ao ser impossível a poesia – depois do triunfo da barbárie – a aceitação da derrota do Homem interior (aquele que descobre as vias da experiência interna, capaz da produção de leituras superiores de si, dos outros e do mundo que o rodeia, mesmo do intolerável), o homem ficar-se-ia pelo Real, impedindo o Irreal, ou o que, na sua capacidade de criar, permite suportar a realidade e vê-la de um modo elevado e amplo. Ou,…
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