De ontem e de hoje – Conta-me uma história por Licínia Quitério Bendito e louvado, o meu conto está acabado. Com esta ou outras fórmulas tradicionais, podem fechar as suas histórias os contadores, os conta-contos, esses andarilhos que percorrem o país a desenterrarem tesouros para os salvarem do esquecimento e depois os partilharem com adultos e crianças, em praças, em escolas, em bibliotecas. Recolhem histórias, às vezes dão-lhes novas roupagens e depois contam-nas, com vozes bem moduladas e gestos expressivos. Neste nosso mundo de desalentos, será sempre bom…
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Crónica de Jorge C Ferreira | O mundo do avesso
O mundo do avesso por Jorge C Ferreira Cheias no Oriente, uma chuva inclemente, devastadora. Na Coreia do Sul procuram-se desaparecidos. Túneis que se enchem de água. Morrer entre paredes e metal. Afundar-se na lama, desaparecer. Os mergulhadores tentam o impossível. Só buscam mortos. Que triste deve ser. Noutros sítios há pontes, viadutos, estradas que se quebram. A inesperada queda no vazio, um voo não marcado para o fim de tudo. Mais desaparecidos. Um vulcão zanga-se na Islândia. La Palma arde de desgosto depois de o seu vulcão…
Ler maisCrónica de Alice Vieira | Ir às escolas
Ir às escolas Por Alice Vieira Às vezes—confesso—sinto-me um bocado cansada de ir às escolas que me chamam. Parecendo que não, há coisas que já não são para uma octogenária como eu. E quando me vêm com aquela de que “o que é preciso é juventude de espírito,” eu respondo logo como respondia a minha prima Maria Lamas, quando vivi com ela em Paris: “o pior é que a juventude de espírito não me ajuda a descer escadas” Voltando às escolas. É claro que depois de lá estar, eu…
Ler maisCrónica de Jorge C Ferreira | Os velhos tempos
Os velhos tempos por Jorge C Ferreira Gosto das ruas estreitas, das travessas, das sinuosas canadas do Corvo. Das ruas de fugir aos piratas das ilhas gregas. Gosto dos pequenos espaços onde todos nos conhecemos. Gosto de ser vida de outras vidas. Estar lado a lado com os que caminham comigo. Conheci ruas de muitos modos de andar. Ruas que percorri em passo lento e acelerado, onde corri e suei, onde passeei de mão dada e namorei. Onde me sentei cansado de correr. Onde roubei e me roubaram…
Ler maisCrónica de Alexandre Honrado | Kundera – A insuportável ideia da partida
Crónica de Alexandre Honrado kundera A insuportável ideia da partida Tive muitos escritores como meus heróis, nem sei se é essa a palavra exata, antes materializações de ideias novas contra as ideias feitas, alguém que me entrava pela cabeça e sem um único ruído me gritava assim, num eco que me ficava pelas veias, vá lá, por todo o sempre, se é que existe isso, o todo o sempre. Sempre dei graças aos livros e não concebo a ideia do seu desaparecimento, ou da prisão que pode constituir não…
Ler maisCrónica de Licínia Quitério | Anos 50 do século XX
De ontem e de hoje – Anos 50 do século XX por Licínia Quitério Em Lisboa, no 34 da Avenida da República, viviam as velhas amigas que há muitos anos, tantos quanto somam três gerações bem contadas, emigraram para a cidade, levadas pelos pais, em busca, como todos os deslocados deste mundo, de melhor fortuna. Moravam na grande cave do prédio que servia de habitação de porteiro, com muitos compartimentos e um longuíssimo corredor. Só menos de metade da casa recebia luz do exterior, através de pequenas janelas…
Ler maisCrónica de Jorge C Ferreira | Que mundo?
Que mundo? por Jorge C Ferreira O mundo em ebulição. Panela sem tampa. A água a ferver. Os bicos de um fogão de lume bruto. Uma nova explosão. O cheiro a carne queimada. As guerras que não terminam. As mortes sempre desnecessárias. A monstruosidade das mortes a sangue-frio. A polícia a não saber que o seu comportamento tem de ser um exemplo. As infiltrações de corpos estranhos nas várias corporações. As pandemias de várias índoles. Os subúrbios de todo o mundo. Os cemitérios nos mares. Tanto mar e…
Ler maisCrónica de Alice Vieira | Palavra puxa palavra
Palavra puxa palavra Por Alice Vieira De vez em quando ouço uma palavra e essa palavra leva-me logo a recordar coisas muito antigas. Por exemplo, aqui há dias uma amiga, bastante mais jovem do que eu, estava a dizer-me que tinha ralhado com a filha porque esta insistia em tomar banhos de imersão em água quase a ferver. “Olha”, digo eu, “foi assim que morreu a Maria Montez!” Ela esbugalhou os olhos: “Quem??” Eu desatei a rir, quem é que hoje sabe quem foi a Maria Montez! Em criança…
Ler maisCrónica de Jorge C Ferreira | Quem somos
Quem somos por Jorge C Ferreira Andar sempre preocupado com o futuro, com o que nos vai acontecer. Saber que a ansiedade pode crescer de uma forma perigosa. A ansiedade que nos vai corroendo. As esperas que nos vão definhando. Saber que o tal bem nem sempre é bom. Saber que muitos pensam que se não nos dói nada não estamos doentes. E nós ansiosos ouvimos e não acreditamos. Não saber o que se tem ou não se tem. Saber que há luzes que se vão apagando e…
Ler maisCrónica de Alexandre Honrado – Nunca estarei longe da cidade
Crónica de Alexandre Honrado Nunca estarei longe da cidade “Mas o esforço humano nunca se apaga totalmente, e velhos mapas de terras, de mares, do firmamento, dizem-nos como é profundo o domínio, o saber deste povo de que somos filhos legítimos, herdeiros e servidores simultaneamente: do hoje prisioneiro ao livre amanhã que ganharemos” Salvador Espriu in O Atlas Furtivo, de Alfred Bosch. (BOSCH, Alfred. O Atlas Furtivo. (2012). Lisboa: Livros do Brasil). Longe da cidade, evoco a cidade. Há tanto para dizer – eu próprio já disse tanto e, sobretudo, calei outro tanto.…
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