Crónica de Alexandre Honrado – Margens opostas, tempos de asfixia

Alexandre Honrado

  Crónica de Alexandre Honrado Margens opostas, tempos de asfixia   Há frases tortuosas que me torturam, saem de livros e de outras impressões e perseguem-me como inimigos cruéis a quem procuro dar combate, eu que sou por natureza (apenas) combatente de guerras destas, ideias contra ideias como gládios de velhos romanos, avós perdidos no tempo e na razão. Gosto de ler autores incómodos, pelo que não me posso depois queixar. É o caso de Jean Dubuffet, que tem um apelido impagável, desses que me inspiram sarcásticos comentários, mas que…

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Crónica de Jorge C Ferreira | As pedras e o mar

Jorge C Ferreira

  As pedras e o mar por Jorge C Ferreira   As estátuas sem tempo. As pedras de todas as memórias. O lugar em que uma civilização começou. Os restos de uma biblioteca que nos fascina. Os corpos belos das mulheres e dos homens. Uma liberdade que vem de um tempo muito antigo. É sobre pedras que nos construímos. Pedra a pedra. Bloco a bloco. Corpo a corpo. Os restos de um monumento único e uma música que ouvimos com prazer. Uma sensação única a crescer dentro de nós. Uma…

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Crónica de Alexandre Honrado – Há coisas do diabo. Há

Alexandre Honrado

  Crónica de Alexandre Honrado Há coisas do diabo. Há   À mesa do café – e repare-se como hoje esta frase é quase memória, coisa de museu, à mesa do café entre fragmentos de frases – do tipo “a Deolinda acabou com o Nuno”, “o que achas desta sombra de olhos”, “viste ontem aquilo?”, “Sete a zero, pá! E não jogaram nada!” –, ali ao lado, um par de velhotes conversa animadamente, e um deles diz, enfático: há coisas do diabo! Porque escrevo estas crónicas e outras, porque dou…

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Crónica de Licínia Quitério | Mercados

  De ontem e de hoje – Mercados por Licínia Quitério   Agora que o Mercado Municipal de Mafra foi renovado, ao gosto dos modernos mercados por esse país fora, agora que já pouca gente lhe chama “Praça”, lembrei-me de deixar aqui excertos de um texto que escrevi há muito. Para memória futura, das gentes, das falas, desse ontem com outro sabor, outro ritmo: NA PRAÇA Vai-se à praça dar uma espreitadela. Da entrada, abarca-se com o olhar os tabuleiros mais distantes, semi-cerrando o olhar, aconchegando o casaco a afastar…

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Crónica de Jorge C Ferreira | Os pecados

Jorge C Ferreira

  Os pecados por Jorge C Ferreira   Mãos que benzem. Mãos que misturam a água e o vinho. Mãos que abrem o sacrário. Mãos que erguem o que chamam o Corpo de Cristo. Mãos que distribuem a fé em hóstias. O sinal da cruz. A persignação. A apologia do bem. Um Cristo que sofre pregado na cruz. Um Cristo que vai morrer. Mãos também do pecado. Mãos sem vergonha. Mãos sujas por actos indignos. Mãos que marcam gente para sempre. Mãos da perdição. Mãos da indignidade. Mãos sapudas.  Mãos…

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Crónica de Alice Vieira | As mulheres da minha vida

Alice Vieira

  As mulheres da minha vida Por Alice Vieira   Todos conhecem os homens da minha vida, mas ninguém conhece as mulheres. Mulheres que foram muito importantes para mim. Na minha infância e na idade adulta. Vou começar por ordem cronológica, ou seja, desde a minha infância até agora. São cinco. 1—A minha tia Aurora. Cai-lhe no colo tinha eu 4 anos. A tia com quem eu vivia tinha-a contratado para ela me ensinar inglês, mas passado pouco tempo, estava a tratá-la como se ela fosse criada-o que fazia sempre…

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Crónica de Jorge C Ferreira | Quando a terra treme

Jorge C Ferreira

  Quando a terra treme por Jorge C Ferreira   Há um som que assusta. Uma vela que se apaga. Um corpo que é engolido. Cai a vida e a morte entre pedras que deixaram de ter a sua função. Ninguém segura ninguém. Ninguém sabe de ninguém. Tudo é desastre. Tudo é colapso. Tristeza. Tormento. Ninguém acende uma vela. O sagrado oxigénio. A falta que o ar nos faz. Tudo treme uma e outra vez. Muitas vezes. O sossego que deixou de existir. Tudo o que, derrubado, não se ergue.…

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Crónica de Alexandre Honrado – Uma estranha adrenalina

Alexandre Honrado

  Crónica de Alexandre Honrado Uma estranha adrenalina   Ao espetar, cada vez mais firmemente, um dos eixos do compasso no plano irregular do estirador da minha vida, eu sabia que estava a correr um risco muito grande. Todavia, ao rodar o compasso e ao estabelecer a circunferência das opções, havia uma estranha adrenalina a percorrer-me, tão irresponsável como irrecusável: eu ia ser escritor. Geometricamente, o plano era perfeito – um conceito que se ia tornando mais apurado à medida que eu estabelecia a escrita como a consolidação de elos…

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Crónica de Licínia Quitério | A ouvidora

  De ontem e de hoje – A ouvidora por Licínia Quitério   Devo ser uma boa ouvidora, já que amiúde me procuram pessoas para que eu as oiça. Chegam e ficam, durante horas, a falar, a contarem-me histórias, verdadeiras ou inventadas, tristes ou alegres, vulgares ou inverosímeis. Vidas que parecem banais, lineares, que no desfiar da voz se desenrolam, se desdobram, se alimentam, se  excedem, se sossegam. Não sei quantas histórias já ouvi, quantos relatos de amores, de dores, de perdas, de carências, de desditas, também de comicidades, de…

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Crónica de Jorge C Ferreira | O valor das coisas

Jorge C Ferreira

  O valor das coisas por Jorge C Ferreira   Aprender o valor das coisas. Saber do valor das pessoas através dos seus princípios, através das suas acções. Tudo tem um valor. Não falo de valor material. Falo do valor que existe dentro de cada um de nós. Do que somos capazes de fazer pelos outros. Do quanto nos entregamos ao outro. Da verticalidade. Da hombridade. Da força enorme que brota de cada mulher. Do seu sublime fruto. Os amores incondicionais, o cordão umbilical que teima em fazer-se sentir. As…

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