Crónica de Alice Vieira | Dormir com fantasmas

Alice Vieira

  Dormir com fantasmas Por Alice Vieira Quando os meus netos eram pequenos viviam em  Inglaterra, na cidade de Leicester (a mais nova até nasceu lá, o que a deixa muito orgulhosa…). Um dia a minha neta mais velha tinha uma visita de estudo e eu fui com ela. Uma visita perfeitamente normal, daquelas que a escola fazia quase todas as semanas. “E se tivéssemos ligado antes,  a marcar, até lá podíamos ter dormido”—oiço a minha neta. Arrebito a orelha, de que é que ela estava a falar?, dormido onde?…

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Crónica de Alice Vieira | A santa da família

Alice Vieira

  A santa da família Por Alice Vieira Toda a família sabia que a tia Mafalda era santa. De resto, tinha tudo para ser santa: era muito feia, muito boazinha, e muito infeliz, porque o tio César lhe dava tareias de meia-noite. A tia Mafalda vivia numa rua muito feia de um bairro muito velho, num prédio de escadas de madeira a cheirar a gatos e peixe frito, numa casa com um grande corredor, muitos quartos sem janelas, e com um estranho perfume a incenso. Íamos muito pouco a casa…

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Crónica de Alice Vieira | A minha tia Carlota

Alice Vieira

  A minha tia Carlota Por Alice Vieira   A minha tia Carlota era uma mulher extraordinária. Mas sempre muito séria, nunca me lembro de alguma vez a ter visto rir, nem sequer sorrir. E sempre muito rigorosa. Uma grande professora primária, mas que exigia muito de todos os alunos. Com uma enorme força de vontade, aquilo que ela queria, ela conseguia. Devido a problemas familiares (mas que não tinham nada a ver com ela) conheceu a família paterna muito tarde. Desculpas destes e daqueles e tudo acabou por se…

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Crónica de Alice Vieira | O que dizem as palavras

Alice Vieira

  O que dizem as palavras Por Alice Vieira   As mesmas frases, exactamente as mesmas frases, lidas por pessoas diferentes podem, por vezes, ter significados completamente diferentes para cada um… Lembro-me sempre de uma peça que vi numa pequena sala das Amoreiras que dava teatro e que já fechou há muito, que se chamava “Inox-Take 5”,  interpretada pela Maria José, a mãe da Rita Ribeiro: cinco pessoas à janela presenciaram na rua uma agressão. E quando a polícia os interrogou—todos eles disseram coisas diferentes, mas que eram, ao mesmo…

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Crónica de Alice Vieira | Novos tempos

Alice Vieira

  Novos tempos Por Alice Vieira   Às vezes, quando estou de manhã na esplanada da praia do Sul (sim, podem lá ir ter comigo, se quiserem) e olho para aqueles miúdos que andam por lá (surfistas e não só), começo a pensar como tudo mudou nestes últimos anos — e ainda bem! Nunca me lembro de dizer “ah! No meu tempo é que era bom!” Ai era? Os que dizem isso têm a memória muito curta… Como cantava a Juliette Gréco (espero que ainda alguém por aqui se lembre…

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Crónica de Alice Vieira | Cautela com as viagens

Alice Vieira

  Cautela com as viagens Por Alice Vieira   Antes de mais, juro que se trata de uma história verdadeira. Isto porque muitas pessoas a quem a tenho contado riem e dizem “lá estás tu com as tuas histórias”. Tudo se passa com um rapaz chamado Ricardo  que vivia na aldeia em que eu nasci. Nunca cheguei a conhecê-lo, mas toda a gente da aldeia conta esta história O  Ricardo tinha um único desejo na vida: enriquecer. Ficar muito, muito rico para poder fazer tudo o que lhe apetecesse, coisa…

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Crónica de Alice Vieira | Por caridade

Alice Vieira

  Por caridade Por Alice Vieira   “Se não fosse a caridade da família que as acolheu, nem sei o que teria sido delas” — ouvi eu esta manhã na esplanada da praia. E todo o grupo estava de acordo e acenava a cabeça. Eu também devia ter acenado, elas estavam cheias de razão, eu até conheço a miúda de quem elas falavam. Mas não consegui. Nunca consigo. E acho que se souberem porquê me vão dar razão. As 4ª feiras eram o dia em que as velhas tias que…

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Crónica de Alice Vieira | A história da minha vida

Alice Vieira

  A história da minha vida Por Alice Vieira   Eu só vou contar aqui o que me aconteceu há dias porque tenho muitas testemunhas, de contrário não dizia nem uma palavra porque ninguém me acreditava. Estava eu na esplanada da praia, aqui na Ericeira. Relia um dos meus livros, porque às vezes os miúdos fazem-me perguntas muito específicas, e eu já não me lembro bem de todos. Chega-se ao pé de mim uma senhora, que eu nunca me lembrava de ter ali visto, olhou muito bem para o que…

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Crónica de Alice Vieira | “Uma Questão de Língua”

Alice Vieira

  “Uma Questão de Língua” Por Alice Vieira   Há amigos que de repente me fazem muita falta. Numa altura ou noutra, por uma razão ou por outra Aqui há dias uma amiga minha começou a falar de um amigo basco que já não via há muito tempo—e eu desatei a rir. Claro que ela não percebeu porquê e eu tive de lhe explicar que ,de vez em quando ,tinha muitas saudades do meu amigo António  Alçada Baptista, que contava histórias extraordinárias, para lá de termos uma coisa em comum:…

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Crónica de Alice Vieira | Memória curta

Alice Vieira

  Memória curta Por Alice Vieira   Hoje vou falar de um grande amigo, meu camarada de redacção do “DN” durante vários anos,  que morreu no passado dia 5, a meses de fazer 101 anos. Mas primeiro vou contar uma história divertida. Durante muitos anos o meu amigo foi padre. Chegou a ser  director de um seminário, não me lembro bem onde. Mas um dia atravessou-se-lhe no caminho uma verdadeira luz, e não houve nada a fazer. Para ambos foi paixão, que duraria até à sua morte. Deixou de ser…

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