Opinião Política – Alexandre Nascimento (Partido Aliança)
Nevoeiro
Ponto de partida…
É sabido que a participação dos portugueses em atos eleitorais tem vindo a descer sempre acima da média das restantes democracias europeias, ao longo dos últimos anos. Muito se discute acerca das razões para que tal aconteça.
Diz-se, de forma absolutamente perentória, que este fenómeno é explicado pelo distanciamento que se foi agudizando entre os eleitores e os políticos e pelo crescente desinteresse por tudo o que tenha a ver com matéria política de uma forma geral.
Sabemos todos que é verdade. Sabemos bem que as pessoas estão cansadas de promessas e das tricas políticas, que estão cansadas de esperar por um país melhor que nunca chega, que não se revêm nos atuais protagonistas, que não se interessam pelas propostas ou mensagens partidárias e que, por todas estas razões, não retiram qualquer vantagem no ato de votar.
Algumas perguntas…
Mas será apenas por causa disso? Alguém pode afirmar, em plena consciência e de forma inequívoca, que os elevados números de Abstenção em Portugal são um reflexo exclusivo do descontentamento com a política e com os seus protagonistas? Como é que o podemos confirmar? E se, de facto, esta é a causa principal, qual é o seu peso no universo dos milhões de portuguese que não vão votar? Quantos estavam a trabalhar? Quantos estavam doentes, hospitalizados ou em Lares? Quantos optaram pela praia? Quantos não o conseguiram fazer por falta de informação adequada? Quantos não o puderam fazer por falta de meios? Quantos não votaram por razões que desconhecemos em absoluto?
Não é lícito, nem sério, afirmar que a explicação reside exclusivamente na descrença em relação aos políticos e às suas propostas. Mas mesmo que assim fosse, haveria sempre lugar à pergunta… e agora? Ficamos assim? Não fazemos nada? Não reagimos?
Estas perguntas levam-nos, por sua vez, a outras… votar é apenas um direito ou é também um dever? A cidadania não é, também, feita de compromisso com a comunidade? Compromisso com a comunidade não é, também, participação ativa e responsável?
E estas novas perguntas remetem-nos para a questão essencial… pode uma nação ser verdadeiramente democrática sem a participação e o contributo de todos?
Dados relevantes…
Hoje em dia, Democracias com sociedades modernas e consolidadas como a Austrália, a Bélgica ou o Luxemburgo têm consagrado o Voto Obrigatório, com os elevados níveis de participação cívica que tal facto acarreta e sem que essa obrigação constitucional seja encarada como algo atentatório da sua dignidade enquanto cidadãos. A obrigação de votar é encarada como algo absolutamente natural e decorre da própria condição enquanto membros de uma comunidade com direitos e obrigações. Sendo absolutamente honestos, temos que concordar que mesmo para os mais céticos e mais acérrimos defensores dos Direitos Liberdades e Garantias, seria preciso uma grande imaginação argumentativa para afirmar que se trata de países menos livres ou menos democráticos.
Outro dado relevante a ter em conta é a fraca participação em atos eleitorais das pessoas com menos rendimentos, dos cidadãos com baixos níveis de literacia e dos jovens. Encarar o voto como uma obrigação é contribuir para maior inclusão social e para a diminuição das disparidades.
Por outro lado, estudos recentes demonstraram que, ainda que superficialmente, os cidadãos com obrigação de voto sentem a necessidade de se informar melhor acerca das suas escolhas. Ora, mais participação obriga a aumentar os níveis de exigência e, consequentemente, a melhorar a qualidade da ação política.
A questão da obrigação…
A Democracia vincula os cidadãos a algumas obrigações… colocar os filhos na escola, pagar impostos, obedecer às autoridades ou colaborar com a Justiça. Os jovens, por exemplo, têm a obrigação/dever de participar no Dia da Defesa Nacional quando atingem os 18 anos. Mais… quando não cumpridas, estas obrigações têm penalizações, nalguns casos, ou mesmo coimas, como, por exemplo, no caso do pagamento não atempado dos impostos.
Mas a verdade é que todos estes são deveres sociais ou económicos. E os deveres de Cidadania? E os destinos do País? E o futuro dos nossos filhos???
Será legítimo, que um qualquer cidadão que não vota… que não participa… que se abstém de tomar decisões acerca do futuro do seu país e das futuras gerações, possa concorrer a cargos públicos, ser funcionário da Administração Pública, concorrer ao Ensino Público ou a Bolsas ou, mais grave ainda, receber subsídios por parte do Estado que provêm da contribuição do Coletivo? Muito para além de não me parecer justo, não me parece sequer lógico! Talvez resida aqui a solução…
Um novo paradigma para o ato de votar…
Defendo, por isso, não o Voto Obrigatório mas uma outra opção intermédia e mais justa. Um voto mais responsável, mais inclusivo, com benefícios para quem participa e com consequências para quem não o exerce. Um voto onde ninguém é obrigado a escolher (o Voto em Branco é sempre uma opção) mas sim a comparecer, a participar!
Poderão afirmar… é a negação da Democracia! Pelo contrário… trata-se de a defender. Uma Democracia só é saudável com uma Cidadania forte e participada. Aliás… voltamos à questão… pode uma nação ser verdadeiramente democrática sem a participação e o contributo de todos?
Não se trata apenas de resolver o problema da Abstenção. Vai muito para além disso. Trata-se de contribuir para menores índices de desinformação, para menos desinteresse e para esbater as assimetrias participativas.
Uma coisa é certa… como está, não pode continuar! Não só atingimos os níveis de participação mais baixos de toda a Democracia como está em causa ela própria… a Democracia!
Se nada fizermos, corremos o risco de vir a viver num país onde nunca saberemos o que as pessoas querem porque as escolhas serão determinadas por uma pequeníssima minoria que continuará, ainda assim, a participar… os militantes e simpatizantes dos partidos.
Viver no Nevoeiro não é uma opção!
(…)
Ninguém sabe que coisa quer.
Ninguém conhece que alma tem,
Nem o que é mal nem o que é bem.
(…)
Tudo é disperso, nada é inteiro.
Ó Portugal, hoje és nevoeiro…
É a Hora!
“Nevoeiro” Fernando Pessoa
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