Crónica de Alice Vieira | Um agradecimento aos tios

Alice Vieira

  Um agradecimento aos tios Por Alice Vieira   As tias que me criaram tinham uma paixão mórbida pelos mortos. O tipo podia ter sido um canalha—morria e era um santo. (Como cantava a Juliette Gréco, “os mortos são todos uns tipos bestiais!”). Além disso, para elas era quase um crime deixar morrer os parentes no hospital. Tinham de vir morrer a casa. À nossa, claro. De vez em quando havia um telefonema a avisar: “O tiozinho já vai para aí.” Tios que nem eram tios. Tios que eu nem…

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Crónica de Alice Vieira | Um conto de Natal

Alice Vieira

  Um conto de Natal Por Alice Vieira   Desembrulha o presente que o marido lhe deu e fica muito tempo a olhar para ele, sem saber se há-de rir se há-de chorar. –Que raio de prenda – murmura a filha—Um papel velho numa moldura… Mas quem é que emoldura papéis velhos? Ela não responde. E olha para aquele papel velho, com os nomes escritos todos em maiúsculas,e no fim de tudo, “Madrinha Teresa” e de repente a voz da mãe há 40 anos gritando “claro, esqueceste-te da Madrinha Teresa,…

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Crónica de Alice Vieira | Bruxas com pão

Alice Vieira

  Bruxas com pão Por Alice Vieira   Eu bem me esforço, eu juro, eu prometo e eu faço (agora até parecia a Bárbara Tinoco…) mas não dá : assisto aos jogos de hóquei em patins mas  não acho graça nenhuma àquilo. Mas como ? Como é que foi possível? Em tempos que já lá vão, o hóquei era o nosso desporto! Mas qual futebol!,  o hóquei aparecia e tudo o mais deixava de ser importante. Lembro-me de estar num cinema e o filme ser interrompido para aparecer no écran…

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Crónica de Alice Vieira | Bruxas com pão

Alice Vieira

  Bruxas com pão Por Alice Vieira   Cada país tem as suas tradições, e isso é uma das riquezas de cada um. Não se encontram em mais lado nenhum, senão em Portugal, as danças dos pauliteiros, o cante alentejano, o vira do Minho, os caretos de Podence,  o banho de mar de São Bartolomeu em Esposende—já para não falar dos santos populares e das romarias e procissões por esse país fora. Durante a pandemia tudo deve ter ficado muito abalado, mas esperemos que a alegria inicial regresse. Quero eu…

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Crónica de Alice Vieira | No centenário de Matilde Rosa Araújo

Alice Vieira

  No centenário de Matilde Rosa Araújo Por Alice Vieira   “Conheci a Matilde Rosa Araújo há 60 anos, e fiquei logo amiga dela”—disse há dias, quando participava por zoom num encontro a propósito do centenário do seu nascimento. Mas houve logo quem me corrigisse o tempo verbal, dizendo que as amizades se escrevem sempre no presente. Mas essa é uma daquelas frases que se dizem sempre quando temos saudades de alguém e queremos apaziguar um pouco os nossos corações. Mas a verdade é que as pessoas desaparecem e vamos…

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Crónica de Alice Vieira | Doutores Por Extenso

Alice Vieira

  Doutores Por Extenso Por Alice Vieira   Todos os meus amigos sabem que odeio que me tratem por “você” (“você é estrebaria”, sempre me lembro de ouvir isto em miúda.) Uma vez, eu estava num restaurante, o almoço estava a demorar e eu perguntei ao empregado se ainda faltava muito. “O que é que você  pediu?” Então eu chamei-o e disse-lhe “trate-me como quiser, pelo meu nome, por tu—mas não me trate por  você.” Passados uns dias voltei lá–e ele ,“então o que vai ser hoje, minha querida?”  E…

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Crónica de Alice Vieira | E lá fomos a votos

  E lá fomos a votos Por Alice Vieira   E pronto, lá se passaram mais estas eleições. Aqui pela Ericeira quase não se deu por isso, a não ser pelos cartazes—e mesmo assim não eram muitos. Adorei aquele que dizia “Vamos libertar Mafra”, com a variante “Liberdade para Mafra” Quando o vi pela primeira vez, até me assustei, palavra de honra! Mafra teria sido invadida e nós não tínhamos dado por nada?  E invadida por quem? Pelos Afegãos—a obrigarem todas as mafrenses a andarem de burka? Por extra-terrestres com…

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Crónica de Alice Vieira | Quem é que ainda fala português?

  Quem é que ainda fala português? Por Alice Vieira   Aqui há dias li um artigo num jornal, intitulado “Haverá alguém que ainda fale português em Portugal?” Isto até podia ser uma palermice se não fosse, infelizmente, verdadeiro. Anda por aí o pessoal muito preocupado com o acordo ortográfico, ai que horror, agora não se põe “c” nem “p” quando eles não se pronunciam, ai meu Deus, e não se põe acento no ”para”—e depois fecham os olhos (ou até são eles próprios a fazê-lo) aos erros, ao português…

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Alice Vieira entrevista neta de Palmira Bastos

  “Para a Mlle. Alice Vassalo Pereira, por gostar tanto de teatro” Uma conversa com a neta de Palmira Bastos por Alice Vieira   Olho para a fotografia, com estas palavras escritas a tinta verde e, de repente, volto à minha infância, quando eu ainda me chamava assim,  princípio dos anos 50,  e ando pela mão do Sr. Acácio pelos bastidores do Teatro Nacional, e entro em todos, os camarins, e falo com todos os actores, e eles acham-me graça e falam comigo e deixam-me andar por ali. Ainda hoje…

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Crónica de Alice Vieira | A correr, a correr

  A correr, a correr Por Alice Vieira   Como muito bem sabem os que me conhecem, tenho uma (quase ) obsessão pela pontualidade. O meu marido costumava dizer que eu devia ter tido um antepassado inglês. Se calhar… Lembro-me sempre, estava eu ainda no Diário de Notícias, de estar à espera de alguém que me devia levar  a uma biblioteca de Sines, para um encontro com os miúdos das escolas, que devia começar às 10 da manhã. Claro que às 9.30 já eu estava à porta. E vieram as…

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