O Baile
Dos passos não dados, das pegadas apagadas, dos voos adiados, dos beijos esquecidos, dos textos errantes. De tudo isto também se faz o nosso caminho. Somos o somatório do conseguido e do inconseguido. Somos a festa do alegre desejo alcançado e do morrer de sede com um cantil cheio na mochila. Somos o baile, a cadeira e a vassoura. Muitas vezes dançámos com a tia velha, porque chegar à princesa era impossível.
Vou caminhando e vou pensando no quanto me falta caminhar. Um passo? Quanta vida no próximo caminho. Tanta questão sem resposta. Tanta resposta sem razão. O eterno desafio. Quando terá lugar a próxima dança.
Um banco de madeira. O pinho bruto. O desejo de correr. O estar sentado virado para a parede. Um monólogo sem espectadores. Um texto sem pontuação. Respirar no sítio certo. Descobrir o sentido das coisas. Um colete de forças num cenário branco. A companhia que não chega.
O passeio ondulado. Ondas de diferentes cores e feitios. Um caminhar embalado. O perigo do enjoo. Passar pelos outros e outros que passam por nós. Outras vidas que caminham. Cabeças cheias de sonhos. Cabeças vazias. Cabeças cheias de tudo e de nada. Uma coisa difícil de se ver pelo modo de caminhar.
Sempre o cheiro do mar e o voo das gaivotas. A areia clara a um salto. Ouve-se o rebentamento. Uma onda a acabar a sua enorme viagem. Um mar que chega e parte. Um veleiro para parte nenhuma.
O sol. O calor. O suor. As pernas que se movem de forma mecânica. O coração tão longe. O outro lado do mundo. Partir numa jangada e ser capaz de chegar. Porque sempre se chega quando a vontade é grande.
Havia um conjunto que tocava todas as semanas no baile da sociedade recreativa. Vestidos de igual. Bem apresentados. As músicas do momento. Cantigas para sonhar. Coisas de fazer amor. Muito juntinhos sem sair do mesmo sítio. Os desejos a crescerem. Ir ao baile. Levar as damas ao buffet. O inesquecível pirolito.
Como no caminhar o caminho vai mudando. O piso muda de feitio e de material. Também nos bailes a música foi mudando. Novos conjuntos. Nova música. Nova maneira de dançar. Novas bebidas no bar. Novas luzes na escuridão.
Crescem os espaços a percorrer. As nossas pernas com mais dificuldade em alcançar a próxima etapa. O tempo a escassear. A roleta que não pára. Continuar a andar é obrigatório. Não podemos parar. – É proibido – grita-nos alguém ao ouvido. Alguém que não vemos só sentimos. Continuamos.
Uma namorada arranjada no baile. Um beijo roubado a caminho do bar. O rubor. O amor. A ilusão. O proibido. O acontecido. A primeira ida ao cinema as mãos sempre dadas. Um filme esquecido. Duas cadeiras lembradas para sempre. O namoro.
Cada vez mais suor. Cada vez a roupa mais colada ao corpo. Cada vez mais automática a forma de caminhar. Os seios dela na transparência do tecido. Uma provocação que corre. O suor a sair por todos os poros.
Entre o baile e a caminhada nos percorremos hoje. Um monólogo pelo meio. Afinal, tudo isto não passa de um monólogo. Tão estranha esta nossa forma de passar por aqui. Esta viagem de encontros e desencontros. Este desassossego.
Caminhar sempre!
Beijos enormes Isaurinda, hoje não te leio isto. Ias dizer que estou louco, que apanhei muito sol. Ias-me aconselhar a usar um chapéu. Vou andar mais uma semana à vontade.
Jorge C Ferreira(Reino de Valência) Maio/2018(170)
Reviver a juventude e tido o seu explendor!!!
Desbravar novos caminhos no tempo que ainda temos para aqui andar!!!
Hoje….vinte anos após a expo 98…..vem me à memória tanta juventude, tanta lembrança boa!!!
Caminhei pelas suas/nossas memórias…
Abraço, não só porque é o dia do abraço…mas pirque para mim será sempre!
Obrigado Raquel. A caminhada. O baile. A vida. Outro abraço de volta.
Assim caminhei ao som do seu bailado. Muito bem pensado, melhor escrito. E cada dia que nasce a dança é diferente se a música mudar. Vamos caminhando acertando o passo com a vida. Belíssima crônica amigo Jorge.
Obrigado Isabel. Essa dança danada que se chama vida. Esse caminhar. Abraço
Belíssimo texto
Obrigado Isabel. Amiga generosa. Abraço
Lindíssima esta crónica. Entre o baile e a caminhada chegamos aqui. Continuo a ouvir a música ao longe. A magia do baile!
De repente a música muda. Os passos mais lentos, procuram encontrar o ritmo entre as pedras da calçada.
Vamos continuar a caminhada.
Obrigada.
Obrigado Eulália. Podemos fazer do caminho uma dança. Podemos saber da música todas as pautas. Caminhemos. Abraço
Belíssima crónica. Todo o percurso de uma vida nela contido. O baile da vida e a troca de passos a que a dança nos obriga. Adorei. É tão bom sentir tudo o que escreves, meu amigo.
Continuemos, pois, a dançar…
Um grande abraço, Jorge.
Obrigado Manuela. A dança da vida. O nosso bailar. Abraço.
Que percurso de vida,encontros e partidas que contam como regresso nostálgico de memórias.Passagens por caminhos com vontade de querer ir para voltar sempre que a saudade comanda o retorno.Obrigada meu querido amigo,é sempre com vontade de sentir que anseio pelas segundas feiras.Abraço!
Obrigado Célia. Que bom ler os teus comentários. Vamos dar a volta à vida num passe de dança. Abraço
Adorei Jorge. Que bela crónica escreveu hoje.Grande abraço e até para a semana.
Obrigado Maria da Conceição. Até para a semana, espero. Outra dança. Abraço.
Cada parágrafo uma reflexão. Reunir, divertir, conviver acontece “O Baile”. Viver, quantas vezes em monólogo por decisão ou imposição. A agitação por companhia por caminhos nem sempre fáceis. Desafios constantes. A renovação! Um banco e a magia acontece. Belíssimo texto. Abraço Jorge.
Obrigado Regina. É como o nosso caminhar. Em ziguezages nos vamos encontrando. Abraço
La valse a mille temps!!! Jacques Brel?. .. e os pirolitos …
Gostei da crónica, apesar da sensação de tristeza. Fases…
Abraço.
Obrigado Fernanda. Uma mistura de sentimentos. Assim é a vida! Abraço
A dança da vida . Tão bela esta crónica, com ela fui buscar de imediato à memória as nossas divas , Bethânia, com o seu “tocando em frente “ e Amália, com a sua “ estranha forma de vida “ entre tantos outros nossos poetas, que assim , como tu , nos trazem a magia no requinte da palavra.
Ao contrário do que tu dizes, claro que a Isaurinda ia adorar este bailado de palavras, mas também estou como sempre com ela – Não te esqueças do chapéu. Abraço, meu querido amigo Jorge.
Obrigado Cristina. Há uma multiplicidade de vidas em cada viver. Assim são também as leituras e os leitores. Quem escreve agradece penhoradamente. Abraço.
O nosso muito obrigada. Sempre.
Abraço
O baile, a vida. entre um e a outra, passos de uma dança que se sabe onde começa, mas não se sabe quando muda a música, ou onde se tropeça. Assim se caminha desde o primeiro grito do nascer, até ao crescimento, aos encontros, os trilhos para encontrar os outros com quem viremos a bailar. E sempre o fazemos, porque haverá uma ” tia velha ” em vez da ” princesa,” para que as pernas se movam ao som das músicas de cada dança. E é neste interregno, entre danças, desejos cumpridos e inesquecíveis, que nos chega o monólogo do amigo que, junto ao mar nos mostra as vidas percorridas, que estarão sempre ” entre o baile e a caminhada”. Sem a Isaurinda, não tenho o seu pano para agarrar,mas continuarei ” nesta forma estranha de andar por aqui” à espera da magia das tuas palavras. Beijinhos amigo/irmão, querido Jorge.
Obrigado Ivone. É tão bom ler as tuas palavras. Só por isso merece a pena escrever. És tão generosa. Abraço
“Caminhar sempre apesar dos encontros e desencontros”
Que belo texto de reflexão sobre a nossa caminhada e as pausas…boas ou não são para recordar.
Que siga a dança…!
Obrigado Idalina. Sim, caminhar sempre. Fazer do caminhar uma dança. Abraço
Gostei muito da sua crónica “Caminhar sempre” é o nosso lema. Um abraço amigo.
Obrigado Esmeralda. Sim, minha amiga, há sempre uma marcha que espera por nós. Vamos caminhar. Abraço