Uma madrugada
por Jorge C Ferreira
Era madrugada alta. Sei isso porque já dormia. O telefone tocou. Atendi a chamada. Do outro lado uma voz, trémula de emoção, disse-me: «vê a televisão». Não me lembro quem era. Veio-me à memória outra antiga madrugada em que me telefonaram perto da mesma hora e me disseram: «ouve a rádio, estão a colocar marchas militares e acho que andam militares nas ruas». Nessa altura o telefone era fixo e a televisão não funcionava vinte e quatro sobre vinte e quatro horas. No rádio diziam-nos para ficar em casa e nós fomos para a rua.
Procurei o comando da televisão no meio da barafunda nocturna. Seleccionei um canal informativo. Estavam a dar notícias e havia rodapés que passavam rápido. Procurei os óculos, fixei o ecrã e o título de última hora era surpreendente: ACABOU A PANDEMIA O PRESIDENTE DA REPÚBLICA FALA HOJE AO PAÍS. Fiquei espantado! Então já posso sair, safei-me desta? Fui ter com a Isabel que continuava na sala nos seus trabalhos nocturnos e disse-lhe o que tinha visto. Não tinha reparado em nada. Ficou incrédula. «Vamos tomar um duche e sair». Entretanto fiz alguns telefonemas fora das horas decentes. O motivo era bom. Eram vozes adormecidas que me respondiam, vozes que logo despertavam. As respostas foram as esperadas: «estavas com insónias e lembraste-te dessa treta» , «e se fosses dar tangas a outro?» entre outras. Depois acabaram por ir ver a televisão e acordarem com o sítio para nos encontrarmos.
Duche tomado, roupa vestida e estávamos prontos para sair. O encontro era no sítio do costume. Mal saímos vimos uma grande algazarra na rua. Gente que escorria de todos os sítios apesar da hora. Ao fundo estrelejavam foguetes. A festa estava a começar, a acontecer. No entanto devíamos estar todos em casa. Que veracidade teria aquele anúncio? A verdade é que todos acreditámos. Estávamos ali. Estávamos libertos e felizes. Há, no entanto, quem seja pessimista. Era o caso de um amigo, sempre de máscara e desinfectante no bolso, que continuava a repetir: «Olhem que esta porcaria não acaba por decreto!»
«Que se lixe dissemos os restantes em uníssono, vamos para Lisboa.»
Chegados à capital a Avenida da Liberdade era já um bonito encontro de emoções. Chegavam pessoas por todas as ruas adjacentes. Nasceu uma palavra de ordem de imediato:
-FIM À PANDEMIA, VIVA A ALEGRIA-
Havia quem cantasse para as luas apagadas das janelas:
“Acordai, acordai…”
Já era dia. Já estávamos no dia de todas as alegrias e o tal amigo pessimista continuava de máscara e a desinfectar as mãos repetidamente, enquanto dizia: «Esta coisa não acaba por decreto, ainda nos vamos lixar todos. Oiçam o que vos digo.»
Entretanto a Avenida da Liberdade ia ficando cada vez mais cheia, nunca com gente a mais, pois à Liberdade todos são bem-vindos. A multidão não se cansava:
-FIM À PANDEMIA, VIVA A ALEGRIA-
Uma marcha sem fim. Uma Avenida que tinha cheiros de gente feliz. Também havia quem chorasse. O meu amigo pessimista tinha companhia de mais gente. Gente que continuava a usar máscara.
Ouço, entretanto, um toque estranho. Agora sim, era o telemóvel. Não era nenhuma chamada. Era o despertador. Eram nove horas da manhã e finalmente acordava. A Isabel dormia. Estávamos confinados.
Que raio de sonho!
«Só faltava esta. Isto não te está a fazer bem.»
Fala da Isaurinda.
«Foi um sonho inventado, não posso? Olha que tu!»
Respondo.
«Então não podes? Nem te digo mais nada. Estás bonito estás.»
De novo Isaurinda e vai. O indicador da mão direita a apelidar-me de doido.
Jorge C Ferreira Março/2021(292)
Pode ler (aqui) todas as crónicas de Jorge C Ferreira
Esta noite também sonhei um sonho diferente do habitual.
Um abraço.
Obrigado Sofia. A importância de sonhar. Grande abraço
O sonho de uma madrugada emergergente que tarda a acontecer. Quase, quase…
” Fim à pandemia, viva a alegria ”
Belíssimo texto que partilhei. Bem haja!
Obrigado Lina. Vamos esperar. Vamos ter ciragem e resistir. Abraço.
Sonhos que nos pregam partidas!
Um abraço, Jorge!
Obrigado António. Vamos acreditar. Um grande abraço.
Que belo sonho. Deixei-me levar por este sonho. Após noites sem fim, em pesadelo constante, o sonho do fim da pandemia. E tal como no dia, em que o grito de Liberdade saiu para a rua, também agora a rua está em festa. Voltamos aos abraços, ao convívio, sem máscaras.
Que belo sonho, que bela comparação.
Obrigada por continuar a sonhar.
Obrigada por escrever desta forma única e estarsempre desse lado.
Vamos esperar que o sonho se realize.
Um grande abraço, amigo.
Obrigado Eulália. Temos de sonhar e pensar que vamos akcançar a liberdade. Poucos sabiam que seria naquela madrugada tão bela. Quando nos libertaremos disto? Esperança. Grande abraço
Sonho que terminou, um sonho mágico.
Muito bem construído é enorme o seu poder de invenção, querido escritor de espírito admirável.
Na verdade será um sonho, quando a pandemia acalmar, quem sabe se numa madrugada.
Foi também, numa madrugada que alguém fez o favor, de nos livrar de um enorme “pesadelo”. Que não tinha fim.
Vamos ter esperança, que outra madrugada aconteça.
Até lá pode continuar a inventar, mais sonhos lindos, meu amigo. Gostei muito. Abraço enorme.
Obrigado Maria Luiza. Todos os que vivemos essa outra nadrugada, sabemos da alegria imensa que nos abraçou. Agora lutamos por outra madrugada que nos deixe voltar a todis os afectos. Abraço imenso
Foi só um sonho. Um sonho mágico.
Muito bem construído. É enorme o seu poder de invenção, querido escritor, espírito admirável. Na verdade será um sonho, quando a pandemia acalmar.
Quem sabe se numa madrugada.
Foi também, numa madrugada que alguém fez o favor, de nos livrar de um enorme “pesadelo”, que não tinha fim.
Vamos ter esperança, que outra madrugada aconteça. Gostei muito, continue a inventar mais sonhos lindos, meu amigo. Abraço enorme.
Obrigado Maria Luiza. Já comentado. Outro Abraço.
Texto muito intenso de vontades. Muito inteligente a forma como escreves o que todos desejamos. A Liberdade que se conquista porque acreditamos ser possível. Sonho lindo a tornar-se realidade. Este texto é mesmo teu. Tem os teus sentires Jorge. Abraço meu amigo.
Obrigado Regina. A Liberdade é sempre o nosso bem maior. Depois somos dos afectos. Sem esses afectos ficamos amputados de algo muito importante na nossa vida. Vamos acreditar. Abraço imenso
Jorge.
Entrei no teu sonho.
Eu sou assim. Saí pelo buraco da fechadura pois gosto de tudo o que é incrível e mágico e entrei, num ápice, no teu sonho!
E nem sequer tenho os dons da Alice que vive em maravilhosos países. Se agiganta e se torna minúscula. Não!
Foi mais um sonho dentro de outro sonho… Foi isso!
“Fim à pandemia, viva a alegria!”
Uma multidão multicolor dançava e cantava, gesticulava, bandeiras agitavam-se como aves, naquela avenida que era a da Liberdade!
De todos os lados se escutavam vozes e cânticos. Palavras de
regozijo. Um ânimo que parecia ter sido esquecido, estava de volta. Uma esfuziante e deslumbrante luz iluminava os rostos que pareciam ter ganho vida…
Eu? Feliz!!!
A felicidade é algo que durante muito tempo nos escapou mas, nesta noite, quis surpreender-nos.
Nem cravos. Nem rosas. Nem crisântemos ou gladíolos. Apenas rostos e risos!
“Fim à pandemia, viva a alegria!”…
Mestre. Mentor. Guia.
Meu poeta de sonhos. Ilusionista. Senhor das magias e artes afins…
Nâo quero acordar!
Não quero acordar!
Por favor, não deixes o despertador tocar… 💙
Obrigado Mena. Sempre tão belos os teus comentários. Entre uma chuva de flores nos abraçaremos. Somos os afectos. Abraço enorme
Um sonho? Ou premonição? Nestes tempos e dias só sei que nada sei…
Os que exigiram e apontaram o dedo ao tardio confinamento, são hoje os mesmos a proclamarem e a exigirem o fim (… ) um jogo necessário, mas perigoso. 66% andam em passeio como se nada se fosse, se nada tivesse acontecido. Assusta-me o que virá despois deste comportamento que nada trará de bom. É necessário o desconfinar como é necessário impôr responsabilidades aos incumpridores que esquecem ter avós e pais como grupo de risco, aos festarolas que se dizem depressivos por estarem a perder a juventude… Enfim! Eu mesma estou confusa com tanto cientista, virologista, matemáticos, muitos primeiros ministros a governarem com o apontar de dedo com tantas sugestões. I have a dream… todos os dias permito-me sonhar como foi e será a vida de todos os que vivem entre guerras e ditaduras, esses sim, perderam, perdem a esperança dos seus sonhos. Meu amigo, cuida-te porque não tarde tu e a Isabel voltarão a ir por aí nesse vosso arco íris… Abraço!
em passeio
Obrigado Cecília. Sonho, porque sonhhar é importante. Um sonho criado entre a berraria dos esoecialistas de tudo e mais alguma coisa. Vamos manter a coragem e a esperança. Vamos resistir. Abraço forte
Sonho maravilhoso que lembra a Primavera, Abril.
Palavras de ordem muito adequadas, que apelam à Liberdade.
O Sonho não está confinado, valha-nos isso.
Excelente crónica. Adorei.
Abreijos
Obrigado Fernanda. Sim, minha Amiga. Sonhar é livre. Toda a liberdade tem o perfume dos cravos de Abril. Vamos acreditar. Abraço grande
Anteriormente, Fernando Lopes Graça, tinha escrito o Poema: ” ACORDAI ” !!! , Num sono mais leve, lembraste-o: !” Acordai, homens que dormis………”.. O teu sentir mais interior adivinhou que algo se passava. Tinha chegado a Primavera em Março. Abril já ia quase no fim. Era a LIBERDADE. VIVA A LIBERDADE!!!!!!!!!!! FIM À PANDEMIA. VIVA A LIBERDADE. Foi um belo sonho. Diz à Isaurida que valeu a pena ” inventares sonhos.”. Beijinhos amigo/irmão Jorge.
Obrigado Ivone, minha Amiga/Irmã. Sim o Acordai do Fernando Lopes Graça. Homem que vivia aqui nesta minha terra. Foi nele que pensei. Foi em Abril nossa Liberdade Maior. Foi naquela Avenida que havemos de descer. Foi o sonho que consegui inventar. Beijinhos
Mais uma crónica que apela a todos os nossos sentidos.
Viva a Liberdade!
Abraço, querido mestre <3
Obrigado Cristina. Tantos sentidos amarrados. Tantos afectos calados. A nossa nova luta pela liberdade. Abraço imenso
❤️