Resistir
por Jorge C Ferreira
Continuamos, por aqui, neste tempo perdido. Tanto tempo desperdiçado! Sonhamos com a liberdade. Uma festa breve e, por vezes, com ressaca. Sinto-me uma ilha. Um espaço que ocupo e espera que o mundo o venha visitar. Sou do mar, sou amante das ilhas. Sou filho do mundo. Nasci das águas mais puras. Fui aspergido por águas bentas. Vivi sempre como pude. Algumas vezes como me deixaram viver. Nunca sobrevivi assim.
Somos duas ilhas que por este espaço navegamos. Encontramo-nos num beijo de espuma. Somos abençoados por quem não nos procura. Tentamos ser rocha dura, lava, areia negra e ouvir o mar. Sonhamos com outras terras. Sonhamos com outros sonhos. Resistimos e assim vamos sobrevivendo. Não temos grilhetas nem correntes. Temos máscaras e desinfectantes. Saímos pouco. Andamos com sonos trocados. Esperamos a palavra FIM neste filme com um guião tão triste e tão estranho.
Queria poder ir para um lugar que fosse único. Uma ilha que navegasse pelos mares deste mundo. Ser náufrago de uma nau desconhecida. Pirata de um mar por descobrir. Voltar a navegar é um desejo que quase nos mata de dor. Chegamos a sonhar. Já foi tanto o tempo que passámos nessas líquidas estradas. Nós, os peixes e algumas aves que, vindas não sabemos de onde, nos vinham visitar.
Falamos de tudo isto em muitas ocasiões. Já vamos prevendo o que está aí. As pandemias sociais, económicas e até políticas. O desemprego, os salários em atraso, as falências, as sequelas da doença, a saúde mental, as mudanças no modo de vida. Há várias questões sobre as quais conversamos: deixaremos de usar máscara? Deixaremos de andar com desinfectante? O teletrabalho é para ficar? Vamos continuar a usar a distância social? Vamos continuar sem nos abraçarmos e beijarmos? Vamos continuar a ser famílias partidas? Vamos continuar a dar a volta ao quarteirão? Quantas lojas irão reabrir na minha terra? A Zoom, e outras plataformas, irão ganhar força e substituir o olhar olhos nos olhos? Tantas dúvidas nos assaltam! Tantas saudades nos cansam o viver.
De novo uma ilha me enche o sentir. Já sabem que eu acho que as ilhas se movem. Movem-se como tudo se move. Movem-se sub-repticiamente. Como eu gosto de pensar que isso acontece! Elas sabem as fúrias do mar melhor que ninguém. É um namoro constante. Por vezes há um vulcão que se zanga e elas ocupam mais espaço. Quem tiver uma parede de vidro e conseguir, de uma ilha, ver o mar, estará no sítio perfeito. É um camarote único. A vista preciosa. O mar a lamber a vida. Os sonhos a ganharem asas.
Porque a terra treme. Porque há montanhas no mar. Porque há fundos inexpugnáveis, animais desconhecidos. Modos de vida por entender. Há sempre que vestir por perto. O resto são corpos soltos que só o mar vê.
Vamos continuar a resistir e a amar a liberdade.
«Sabes, fico com a última frase. Embora hoje tenhas escrito bonito sobre esta realidade que nos vai marcando.»
Fala de Isaurinda.
«Obrigado, minha querida. Gosto tanto quando me dizes essas coisas.»
Respondo.
«Sabes que sou sincera. Mas tem calma, não te babes.»
De novo Isaurinda e vai, um sorriso na palma da mão.
Jorge C Ferreira Março/2021(293)
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Mais uma excelente crónica, Jorge. Tanto que eu gostei dela, inquietante, perturbadora, bela e com grande intensidade poética.
Neste tempo de máscaras e distanciamento social em que vivemos, muitas dúvidas nos assaltam. Há poucas ou nenhumas certezas e as que nos dizem ser, sao todas feitas de vento… Tem dias que sucumbo ao desânimo quanto ao futuro, noutros, gosto de pensar que vamos deixar para trás este tempo mau e que a vida, ainda, nos vai proporcionar momentos lindos, entre convívios, risos, gargalhadas, e muitos abraços e beijos de ternura. Que este sonho meu se cumpra, para todo o mundo.
Jorge, e esse amor imenso que temos em comum, pelas ilhas?! Dizes, sempre, as coisas mais inspiradoras sobre elas. O wue eu gosto disso, meu amigo! Somos todos ilhéus, mas mais ilhéu mesmo, é quem vive numa rocha com mar por todos os lados, que, por vezes, sente solidão, limitação, isolamento, mas também muita imaginação, fantasia e amor. Tal como dizes, as ilhas navegam e sonham muito.
Neste preciso momento, sinto no ar um perfume e sabor a maresia.
Um beijo meu num mar de carinhos.
Obrigado Manuela, minha ilha mais alta. Tudo o que escreves cheira a Mar e a Montanha. Que bonito o que escreveste. Espero visitar-te. Beijinhos
Vou resistir.
Vou ser ilha. Movimentar-me ao sabor das marés. Envolver-me com a areia e dar cambalhotas no fundo desse imenso e terno oceano. Vou resgatar as brisas. Convidar as gaivotas ao repasto da ternura. Semear nos planos altos o rosmaninho, a salva e o alecrim. Entreter-me com os extintos vulcões e deslizar no escorrega que é o seu negro areal.
Vou visitar os lugares sagrados. Orar aos deuses que nunca dormem. Como ilha posso ser e fazer o que quiser!
Vou resistir.
Embrenhar-me nas florestas e perder-me nas grutas onde vivem os morcegos.
Vou correr pelos campos e sentir que a liberdade é mesmo ali!
Mestre. Hoje não tenho espaço para tristezas. Perdoa-me a ousadia.
Hoje quero saltar de sorriso em sorriso.
Mestre. Quero ser feliz! 💙
Obrigado Mena. Tu és a escrita especial. O deslizar doce sobre marés de vida. Aconselhar que te leiam é o que me resta. Beijo grande
Há toda uma turbulência, uma saudade navegável que nos presenteias em modo de crónica, in modo de vida ressalvas vivências por mares e ilhas navegáveis, tal qual um navio pirata assaltas sonhos que tal como tesouro guardas como o bem mais precioso na tua memorável. História de vida, como marinheiro, ou comandante te dás como diário de bordo. É, e será, nente ansiosa esperada a segunda feira página do teu diário que percorres para entregar a tempo, nós, eu, espero a chegada da hora para repousar num recanto para a poder ler, mesmo que deixe página marcada volto no dia seguinte para tranquilamente deixar-me levar pelas ondas… Obrigada pelo que ofereces dos teus sonhos, pelas palavras contadas. Obrigada! Abraço
Obrigado Cecília. Precioso é o teu texto. Uma jóia encastrada de uma maneira especial. É também no pontão de um porto antigo wue espero o teu comentário. Uma alegria imensa quando chega. Depois enebrio-me e fico feliz. Abraço grande.
Em nome da decência que defendemos pelos valores que praticamos honrando quem muito nos ensinou, somos resilientes quando acreditamos na esperança de que hão de vir dias melhores!
Custa cumprir, pelo medo do contágio e pelo receio de uma recaída.
Não custará muito ser herói, se se souber como agir, arriscando nos cálculos!
A vida é para ser vivida com prudência e muito amor próprio!
Um abraço, Jorge!
Obrigado António. Sim temos de ter sempre em mente o futuro. Temos de Resistir e ter coragem para enfrentar o medo. Um grande abraço.
Muito trilho ainda por percorrer.
Consequências desastrosas daqui advirão.
Mas talvez se formos pensando no que gostaremos de fazer depois, os dias ganhem uma certa leveza.
Não acredito que as máscaras sejam para sempre, assim como não acredito que não retomemos os convívios e a efusividade nos reencontros.
Um abraço.
Obrigado Sofia. Sim, minha amiga, mas este tempo já o iremos recuperar. Depois temos de estar preocupados com as novas pandemias. Espero que tenhas toda a razão. Abraço imenso
Excelente. Sobreviver a uma situação desconhecida para todos.
Olhar em redor e procurar um lugar seguro. Não há lugares seguros.
As soluções complicam-se. Os dias não têm retorno.
A crise económica e social aproxima-se a passos largos.
Olhar em frente e esperar por dias melhores. Resistir.
Liberdade tão desejada.
Nada será igual.
Obrigada meu amigo por estar desse lado.
Um abraço.
Obrigado Eugénia. Tão bom o que escreveu. Nunca pensei passar por isto. Nunca pensei perder este tempo. Grato pela sua presença continuada neste nosso espaço.
Uma bela crónica sobre oquotidiano vivido em estranheza. Há tanto tempo. Aguentamos a custo. Ate quando? A imprevisibilidade do futuro. Como será? A vida adiada. Até quando?
Obrigado Isabel. Esta estranheza que incomoda. Este desviver. Até qyando? Acho que ninguém sabe. Digo eu. Abraço
Hoje Isaurinda, gostou diz que escreveu bonito. Eu também adorei. Que bonita crónica, é um prazer lê-lo.
Este é um momento duro que estamos a viver, que bom estar connosco, tão bem conta a história que nunca julguei viver. Acredito que vamos passar, para outra fase da vida. Mas o amor e a ternura, continuará a mão amiga vai sempre andar por aí. Eu acredito! Tudo irá serenar. O Mundo continua à sua espera, meu amigo e o Mar que tanto gosta, tem saudades vossas. Mais uma vez agradeço a beleza da sua escrita e a verdade da mesma. Obrigada, meu amigo . Sempre grata. Abraço imenso.
Obrigado Maria Luiza. Tempo difícil. Que bom que é sentir através dos comentários que a tenho a si e mais gente bonita aqui comigo. É isso que me faz escrever. Uma maravilha que não me canso de agradecer. Abraço enorme
Estamos cansados pelas constantes incertezas e um mundo desconhecido. as questões que referes serão certezas no futuro. Os negócios acontecem, as despesas das empresas são menores. Tantos sonhos suspensos. Não tenho grande esperança quanto ao comportamento das pessoas, reconstruir um mundo melhor, a alienação contribui para o desentendimento. Sei que o alívio imediato não existe, no entanto o desejo de manifestar emoções olhos nos olhos é forte, ajuda-nos a resistir. Meu amigo, mesmo assim acredito que a liberdade vem aí. um abraço imenso.
Obrigado Regina. Não podemos perder a ezperança e a coragem de lutar contra o medo. Vamos tentar lutar com as forças que ainda temos para mudar o mundo para melhor. Sabes que não mudo. Abraço forte
Ora aqui está uma bela crónica para memória futura, para memória dos que estão para vir.
A vida não tem momentos iguais, nada se repete e muito menos existem soluções para o que há-de vir.
É imensa a vida num tempo às vezes curto.
Abraço amigo e que os teus desejos se vão cumprindo.
À Isaurinda, mulher coragem, um beijo.
Obrigado Isabel. Que alegria ver-te aqui. Temos de Resistir, lutar, tentar sjudar a construir algo diferente. Abraço imenso
Jorge, meu amigo, meu irmão, meu cronista. Fez-me bem ler-te. Penso em muito do que é o teu pensamento. Tens razão e sentirás mais do que eu, tu ” homem de mar “, dos ventos e marés, de areias que se movem, de Ilhas com Sereias. E, neste planeta ” Terra ” que habitamos, andamos atarantados. Voltaram prisões sem grades, mas com máscaras. Olá bom dia, boa tarde, Retribuímos, mas…quem era? Com as feições tapadas não sabemos. É necessário comer, ir comprar o necessário. Vou a um mini-.mercado do Bairro. Uma pessoa de cada vez, esperamos cá fora. Só nos faltava esta Será que vai melhorar a relação futura entres as ” gentes”? Duvido, meu amigo. O egoísmo continua o mesmo. Verdade que, ali, aqui, aparecem sinais de entre-ajuda. Faço o que posso, mas sinto que há, em mim, vários sinais de instabilidade mental. Não tenho medo das palavras. Depressões, neuroses, psicoses foram, durante anos ,matérias com que trabalhei. Resta-me esperar que a minha Bea e companheiro, o David e companheira, estejam bem. São a minha força. E os amigos, os verdadeiros, também. Dá um beijinho à Isaurinda. Para ti e Isabel, desejo muita saúde, amor e paz.E beijinhos abraçados virtuais, que ainda não foram proibidos.
Obrigado Ivone, minha querida Amigs/Irmã. Ter aqui a tua sábia opinião é um privilégio. Nunca nos esqueceremos do que já vivemos. Sei que continuaremos a lutar oara mudar o mundo. Como te estou grato por tudo. Beijinhos
Tal como tu, também me questiono muitas vezes sobre o que virá a seguir.
Ainda vamos ter muitas etapas pela frente. Mas, mesmo que consigamos ultrapassar tudo isto, penso que nada será igual.
Gostava muito que, perante tudo o que estamos a passar, a humanidade ficasse melhor, mais solidária. Que houvesse uma maior consciencialização de que, embora nem todos estejam a sofrer do mesmo modo, ninguém está a salvo e precisamos uns dos outros. Que se façam todos os esforços de modo a garantir vacinas para todos e não só para alguns.
Seria bom que tudo o que estamos a passar servisse para abrir mentes e despertar consciências para que todos, sem excepção, possam viver com dignidade.
Se esta pandemia servir para isso, então terá valido a pena…
Sei que tudo isto pode ser uma utopia mas eu ainda não deixei de ter esperança num mundo melhor para quem vier a seguir, embora tenha tido muitos momentos de completa descrença…
Obrigado Maria. Que tempo este! Sabemos que virão camadas de pandemias para vencer. Quanto ao futuro, resta-nos resistir e kutar sabes que nada nos é dado de mão beijada conto contigo para a luta. Beijinhos