Crónica de Jorge C Ferreira
As estórias da madrugada
Chegar sem partir. Ignorar o caminho percorrido. Noites e Dias ou apenas o instante. Um corpo único. A virgem ansiada embrulhada num lençol branco. Uma renda a bordejar o branco e um monograma indecifrável bordado. Era tempo de os dias irem crescendo, no entanto, aquela noite tinha sido demorada. A vida a sangrar. Um par único que se encontrara e se demorara um no outro.
Apenas costumavam ser alvoroço matinal. Sempre uma manhã e sempre diferente. Olhavam-se e sorriam. Um sorriso beijado e uma carícia que voava de forma doce. Depois, era a rotina até soarem as campainhas da liberdade. As tardes ansiadas. O verde e a pedra. Verdes também as mesas e as cadeiras de um certo café. Cafés da tarde que principiava. Mãos e outras mãos. Só uma mão. Pensar na loucura inteira. Pensar em fugir e não voltar. Acho que ambos o pensaram. Nunca tiveram coragem de o dizer um ao outro. Assim se fica a meio caminho de alguma coisa.
Teriam sido felizes? Nunca ninguém o saberá! A vida é um livro fechado e enigmático. Podem vir videntes, tarólogos, prestidigitadores, alquimistas, podem vir todos à uma ou um a um, de nada servirá. Muitas vezes a enchente na maré vazia. O pouco que nos faz sonhar, tanto dói como nos enche de felicidade. Tantos sonhos escritos na esquina da rua dos últimos encontros. O desencontro. Como seria a vida vinte e quatro sobre vinte quatro horas juntos. O que diriam as vontades e os desejos. Eles só conheciam o quanto custavam as noites separados.
Partir sem chegar. Apenas o tal lençol, a mesma renda, o mesmo monograma bordado. Os corpos que não existiam no escuro da noite não almejada. Corpos sumidos e consumidos. Corpos deles. Corpos que não se encontram. Muitos pedidos, quase orações, a fé perdida. Restava esperar pelas manhãs e sorrir como se tudo tivesse acontecido. O mesmo sorriso. Os mesmos desejos. Era ela a sua virgem, dizia. Era a ela que se confessava. Assim falava de mãos postas.
Tudo isto me foi contado pelo meu amigo especial, numa madrugada em que os candeeiros já nos coloriam a face. Eram as madrugadas em que a oralidade se fazia passar. Estórias que se contavam para não se esquecerem. Há quem diga, que muitas eram inventadas! A verdade é que havia sempre alguém que se revia numa ou noutra. E nós sentíamo-nos felizes com isso. É preciso passar palavra, experiências e invenções. A oralidade foi o princípio de tudo e nunca foi fim de nada. Porque a uma estória se pega outra estória e assim vamos fazendo história.
Adormecer depois daquelas madrugadas de conversa era fácil, mesmo sem virgens de branco junto a nós. Quando conversávamos, no dia seguinte vinha sempre à baila o que tínhamos falado no dia anterior, basicamente o que o meu amigo especial me tinha contado. Nunca lhe cheguei a dizer que, um dia esperava passar isto para o papel. Porque acho que ele não se importaria, aqui vos vou deixando tudo a nu.
«Tu, o teu amigo especial e estas estórias. Não sei se isto tudo é inventado ou não, por isso não digo mais nada.»
Fala de Isaurinda.
«Pois, tu não conheceste o meu Amigo especial. Daí as tuas dúvidas.»
Respondo.
Pois sim, sempre a mesma resposta. Eu cá fico na minha.»
De novo Isaurinda, e vai, a piscar o olho e um sorriso de escárnio.
Jorge C Ferreira Fevereiro/2025(463)
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A cumplicidade entre ti e o teu Amigo especial encanta-me. Esse teu jeito de lhe dares vida com tanto carinho bem como a poesia envolvente. Bom regresso meu Amigo. É sempre tão bom ler-te. Abraço enorme.
Obrigado, Regina, minha Amiga. Amizades eternos. Que bom estares aqui. A minha imensa gratidão. Abraço enorme
Saudades da sua escrita, querido amigo.
Li esta história maravilhosa, onde só reina o amor.
Que coisas tão belas lhe contou o seu amigo especial. Que feliz ele ficava, se um dia lesse este divino texto.
Que bem aproveitadas foram as vossas conversas. Coisas que só os poetas sabem. Adorei!.
Obrigada, meu amigo por me oferecer este tão belo momento . Abraço grande.
Obrigado, querida Amiga. Que bom ler os seus belos comentários. Este meu Amigo Especial que ninguém conhece, nem sabe se, existiu. Conversas e histórias que acontecem. Abraço grande.
Que bom regresso! Crônica fascinante.
Longas conversas com o amigo especial. Amores vividos, amores sonhados, amores sentidos. Memórias que vão preenchendo a vida. Estórias que iluminam as noites longas e sombrias.
Bela crônica com sabor a poesia.
Obrigada Amigo. Abraço.
Obrigado, Eulália, minha Amiga. Que bom ter aqui o seu comentário. Sem estes momentos não valeria a pena escrever. É tão reconfortante esta interacção. Abraço forte
estórias que passaram de boca em boca.
sem princípio nem fim.
rocambolescas?
inverosímeis?
idealizadas?
era uma vez…
dois corpos.um local. possivelmente um café. ou não…um jardim? quem sabe?
um homem e uma mulher.
sem idade definida.
sem nome.
sem identidade.
apenas. uma troca de olhares.
flamejante.
o apelo.
o desejo
a centelha.
a sintonia.
a cumplicidade.
o êxtase
a euforia.
o sonho.
o elã.
nunca ninguém chegou a saber.
nem o amigo especial que contava estórias
na madrugada.
deixou quantos o escutavam.
surpresos.
espantados.
inquiridores.
afinal,.o que lhes aconteceu?
chegaram a viver uma paixão? real?
ou foi apenas mera atracção?
ela partiu?
ele não a terá esquecido?
a estória não tem um fim.
será que são essenciais epílogos?
determinantes?
não me parece.
pois não, cronista?
vamos deixar a imaginação de cada um dar o fim que bem entender?
achas bem?
confio no teu discernimento.
na capacidade criativa.
na fluência literária.
no que fez despoletar este conto único e singular
que terminaria
com
…
Obrigado, Mena, grande Amiga. Os poemas com que comentas os meus textos são a minha alegria. Assim ganho força para continuar. Ler-te é uma bênção. A minha gratidão. Abraço enorme.
Que saudades das tuas crónicas Poeta Jorge C Ferreira! Amei! Tão bom termos um Amigo especial .
Obrigada. Abraço.
Obrigado Claudina, minha Amiga especial. Gosto tanto que estejas aqui. Grato. Abraço grande
Amigo Jorge,
Manifesto o Enorme prazer tê-lo de volta, acompanhado do seu Amigo especial.
O mesmo significa que é sempre um enorme prazer ler as suas estórias.
Estava com saudades da sua bela prosa poética que flui tão naturalmente.
Obrigada. Bem-vindo.
Abraço🌹🌹
Obrigado, Fernanda, minha Amiga. Eu é que agradeço por me ler e comentar. Sempre reconfortante para quem escreve saber a opinião de quem faz o falar de nos ler. A minha enorme gratidão. Abraço grande
Momentos de histórias, entre contos de verdade, ou possíveis enredos manuseadores de momentos falantes.
Sem dúvida, um traço bem exemplar e apelativo de uma crónica excelente.
Perdoa-me o aviso -NÃO PARES!
Grande abraço !
Tão a propósito, Jose Luís Outono!
Uma longa ausência que podia antever uma paragem.
Não pares, amigo Jorge ! Digo eu, em uníssono
Agora nós , meu amigo!
Receei sim, mas tu ouviste sons distantes que te chamavam . Éramos nós , à tua espera.
E brindaste- nos com uma linda história , daquelas que se confidenciam aos amigos em momentos intimistas.
Não pares!
Obrigado Lénea, minha Amiga. Por vezes temos de parar. A vontade de regressar é inerente. São estes vossos comentários que me fazem estar de volta. Obrigado pela força. A minha gratidão. Abraço enorme
Obrigado, José Luís, meu Amigo, meu Poeta. É tão bom ler aqui os teus comentários. Saber que no lêem é o que nos dá força para continuar. Grato. Abraço forte