Crónica de Alice Vieira | Sair ou não sair – Eis a questão

Sair ou não sair – Eis a questão Por Alice Vieira   Há um conto de um autor húngaro, de que não sei o nome, (mas que pertence a uma antologia de contos húngaros, traduzida pelo meu amigo Ernesto Rodrigues),  de que me tenho lembrado muito nestes últimos tempos. É um conto brevíssimo. A história de uma mulher presa há muitos anos e que, de repente, foi posta em liberdade. Ela vivia na prisão com uma filha pequenina, que nunca conhecera outra vida. Então, uns dias antes de ser posta…

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Crónica de Alice Vieira | O sacristão de S. Paulo

O sacristão de S. Paulo Por Alice Vieira   Hoje vou contar uma história, que é para animar o pessoal que já anda a bater um bocado com a cabeça nas paredes neste confinamento –necessário, é certo—mas prolongado. E uma história verdadeira. Pelo menos o amigo inglês que ma contou jurou a pés juntos que se tinha passado mesmo assim. A história de um homem que era sacristão na igreja de São Paulo, em Londres. Um dia, por motivos burocráticos, foi-lhe pedido que assinasse um documento e, para espanto de…

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Crónica de Alice Vieira | Só porque hoje me lembrei dele

Só porque hoje me lembrei dele Por Alice Vieira   Há datas que festejo sempre. Mesmo quando as pessoas já cá não estão, mesmo se as festejo só para mim. O Ruy Belo é uma dessas pessoas. Faria 88 anos no final deste mês. E penso quase todos os dias nele, sobretudo agora, que tem morrido tanta gente… Não só por ter sido o meu primeiro namorado, mas pelo muito que aprendi com ele até ao fim da sua curtíssima vida (morreu com 45 anos) Conheci-o em 1961, quando ambos…

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Crónica de Alice Vieira | Quando eles nos deixam

Quando eles nos deixam Por Alice Vieira   Entro na sala, e é como se tudo faltasse só porque ele falta. Ainda por cima em confinamento tudo custa mais. Desde anteontem que ando para aqui sem saber o que fazer, abro janelas, olho lá para fora, fecho janelas, sento-me no sofá, olho em redor, como se isso chegasse para o fazer voltar. Foi a primeira vez que passou a noite fora. E sem aviso. Ligo às amigas, na tentativa de um consolo, para isso é que se inventaram as amigas.…

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Crónica de Alice Vieira | Uma família feliz

Uma família feliz Por Alice Vieira   O Sr. João Tavares é taxista. Apanhei-o aqui perto de casa e, antes que eu pudesse dizer fosse o que fosse, pergunta-me “Conhece o Costa?” Estava eu a pensar em quantos Costas conhecia e já ele continuava: “Preciso de lhe falar” Foi então que percebi que ele se referia ao Primeiro Ministro. Já tenho dito muitas vezes que o que me custa mais no confinamento é não poder beijar e abraçar os meus filhos e os meus netos. Mas logo, logo a seguir…

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Crónica de Alice Vieira | O salvador da pátria

O salvador da pátria Por Alice Vieira   O Sr. João Tavares é taxista. Apanhei-o aqui perto de casa e, antes que eu pudesse dizer fosse o que fosse, pergunta-me “Conhece o Costa?” Estava eu a pensar em quantos Costas conhecia e já ele continuava: “Preciso de lhe falar” Foi então que percebi que ele se referia ao Primeiro Ministro. Vai contando a sua vidinha, diz já ter feito de tudo , desde pertencer à Marinha Mercante que, segundo afirma, lhe está a dever milhares de euros, até andar pelas…

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Crónica de Alice Vieira | A santa da família

A santa da família Por Alice Vieira   Toda a família sabia que a tia Mafalda era santa. De resto, tinha tudo para ser santa: era muito feia, muito boazinha, e muito infeliz, porque o tio César lhe dava tareias de meia-noite. A tia Mafalda vivia numa rua muito feia de um bairro muito velho, num prédio de escadas de madeira a cheirar a gatos e peixe frito, numa casa com um grande corredor, muitos quartos sem janelas, e com um estranho perfume a incenso. Íamos muito pouco a casa…

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Crónica de Alice Vieira | Falando de hinos

Falando de hinos Por Alice Vieira   Sou perita em hinos. Isto porque o tio que me criou , assim  que chegava um dia especial—com direito a hino–passava a tarde para lá e para cá no grande corredor da casa , a cantar. Para ele havia sempre três hinos que nunca falhavam: o hino da Restauração (1 Dezembro), a Portuguesa (dia 5 de Outubro), e o Hino da Maria da Fonte  (27 de Março) E era vê-lo, ateu empedernido, aos berros no corredor no dia 1 de Dezembro “O Deus…

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Crónica de Alice Vieira | Onde estão os russos?

Onde estão os russos? Por Alice Vieira   Com estas decisões de confinamentos, e recolher obrigatório, os noctívagos, coitados, devem sofrer muito. Os que viviam de noite, entre os jantares até às tantas, os bares, as discotecas, os cafés, os encontros de amigos– devem mesmo sentir-se muito mal. E mesmo se ainda podem ir a um restaurante para jantar, têm de olhar constantemente para o relógio, para saírem antes das onze, a dar tempo de chegarem a casa. Tenho a sorte de nunca ter sido noctívaga. Se calhar porque tinha…

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Crónica de Alice Vieira | Chalés na serra

Chalés na serra Por Alice Vieira   Estas últimas medidas do governo não são fáceis de seguir, eu sei ,mas a culpa não é do governo, a culpa é nossa. A culpa é de quem não cumpre o que é obrigatório Ao lado de minha casa há uma clínica de animais. Pois quando eu saio de casa, cá fora está um magote de gente, ombro com ombro, muitos sem máscara, ou com a máscara no queixo, o que há-de servir de muito. Eu tenho de atravessar a rua para o…

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