Uma ilha e uma trança
por Jorge C Ferreira
Saber navegar pela vida. Muitas vezes ser ilha. Resto isolado de nós. Procurar-te numa ilha. Conhecer os sinais dos faróis. Amar um faroleiro. Esperar a sua luz. Esperar encontrar a mulher sublime que nos completa. Procurar a vida plena.
Esta busca, esta demanda que muita gente empreende. Gente que não sabe que procura o inatingível. O vulcão que entra em erupção. As cinzas e a lava. A terra a crescer, a ilha a aumentar. O mar queimado. Entretanto, uma mulher linda, cuida das flores do seu jardim.
As tuas tranças. A minha loucura. Cavalguei-te cavalgaste-me. Fazia e desfazia-te a trança enquanto a terra tremia. Os nossos corpos em fogo. Outra ilha. Outro lugar. O mar sempre no horizonte. Nos nossos olhos cresciam peixes de cores exóticas. Um arco-íris de ternura. Um amor adulto. Uma caixa com segredo por abrir. A nossa fortuna de vivermos juntos.
As ligações que são furacões. Fortes e passageiros. As marcas que ficam. Memórias confusas. O embelezamento do menos bom. As casas onde se viveu. Deslizar pelas ruas já alteradas. Os nossos passos gastos. Nem um elástico com que prendia a tua trança. Beijei-te e tu beijaste-me. Foram horas e horas a saborear-nos. O mar a ficar agitado.
A ilha que teima em não nascer. A submersa ilusão. Um borbulhar que nos questiona. A água a aquecer. Uma agulha de rasgar o ventre dos barcos. As bóias de sinalização. Um caminho estreito para a nossa aventura. O tempo que teima em escassear. A rampa para o desastre final. Uns olhos que se fecham. Uns lábios que se mordem. Uma tentação que cresce. Ir viver para o fundo do mar. Aceitar o silêncio. Os corpos atados a montanhas por explodir.
Tua trança, minha rédea. Meu sonho feito corrida solta. Minha eterna vontade de correr mundo. Levar-te a ti e a um espelho para que vejas a tua beleza. Encontrar a diferente gente, os diferentes lugares. Comer à mesa com eles. Arriscar ser diferente. Vestir uma saia e sair à rua. Caminhar junto ao mar. Sempre o mar. Sempre tu. Sempre nós. Cantar a alegria sentado num muro virado para o infinito.
Aprender o tempo da vida. Saber calcular o cansaço. Ter a sensibilidade de que o fim está perto. Não, não é arte de adivinhação. É fala do coração, do corpo, dos lábios frios. Saber quando é o tempo certo para sair de cena. Ter sempre um saco pronto para partir. Sentir o sabor do último beijo. Nem um grito, nem um suspiro. A despedida sentida, mas necessária. Nunca deixar estragar o que foi bonito.
Uma ilha a querer nascer do fim de um amor. Um vulcão submarino e a ponta de uma rocha que nos quer chamar à atenção. A ilha que vai aparecer. A ilha filha de um cansaço de viver debaixo de água. O mar a fustigar aquele novo ser. Ser até agora desconhecido. Os partos são, por vezes, difíceis. Esta é a maneira do mar parir. Sempre coisas que nascem quando outras acabam.
Sempre quis viver numa ilha. Melhor, sempre quis ser ilha. Porto onde os marinheiros chegassem e se servissem. Sempre aspirei estar sempre a ser beijado pelo mar.
Ainda um dia vou ser ilha e ter uma trança.
«Olha que hoje pareces doido de todo. Que conversa a tua!
Fala de Isaurinda.
«Hoje apeteceu-me falar livremente e sem guião. Manias.»
Respondo.
«Vê lá é se ganhas tento nessa maneira de falar sobre as coisas. Meu maniento.»
De novo Isaurinda e vai, a mão a bater na testa.
Jorge C Ferreira Agosto/2022(358)
Pode ler (aqui) todas as crónicas de Jorge C Ferreira
Pela sensibilidade, pelo amor às palavras, pelo amor que é AMOR, por tudo que preenche ao ler e reler com espanto e carinho o que a segunda me consegues entregar uma página numerada desse livro que continuas a escrever com tanto amor e lealdade a ti mesmo esse amor de palavras que continuam tuas mas, ao mesmo, preenchem o meu olhar. Obrigada sempre querido amigo, Jorge.
Obrigado Cecília, querida Amiga. Tudo o que escrevo só faz sentido se os outros nos lerem. Gratidão imensa pelas tuas generosas palavras. Beijinhos
Viver numa ilha é um feitiço, uma sedução, um encantamento, mas também traz alguma solidão e nostalgia. Quando o cinzento, por vezes, se abate sobre nós, logo vem o azul do céu e do mar, que ajudam a dispersar com imagens de um colorido poético. Por isso, as ilhas são fontes de inspiração de escritores, de poetas, musicos e pintores.
Adorei este teu texto, meu Poeta e Amigo. És de uma dimensão de Amor imensa e indiscritivel.
” Musica, levai-me:
Onde estão as barcas?
Onde são as ilhas?
Eugenio de Andrade
Um beijo com gratidão e ternura, querido Jorge.
Obrigado Manuela. Que bom estares aqui Mulher e Ilha inteira. Tu sabes do mistério de viver nesses espaços. Lindo o que aqui deixas. Abraço
Como viver a vida sem os poetas? Por favor nunca partas sem me dizeres, sem me perguntares se quero ir contigo nessa viagem até ao fundo do mar! Sabes que a mim a terra já não me basta!
Sim, eu também quero ir tocar lá bem no fundo as estrelas do céu,
.Eu penso que estão todas lá bem, bem onde o mar acaba começa de novo o céu, as estrelas e outros planetas por onde poderemos fazer novas viagens, conhecer novas gentes, viver em Paz, comer frutos de sabores jamais provados, dançar até não haver cansaço, um mundo novo onde o amor será o sentimento único entre os seres que nele habitam….
Vamos partir, quero um bilhete para essa viagem!
Obrigado Fernanda. Tão intenso o que dizes. Tão bom. Os vários céus e as viagens sem fim. Quem sabe um dia somos de outra estrela. Abraço
A ternura que navega dentro de ti, os sonhos de homem livre. Em cada frase um sentimento, vontades de sentir a intensidade da vida. Despertas vontades a quem te lê. Ver o mar parir. Adoro ler o que escreves Poeta. Obrigada Jorge. Abraço-te Ilha.
Obrigado Regina. Grato pela tua presença. Seremos a Ilha que contruimos. Seremos amados pelo mar. Tocados por estranhas nuvens. Abraço
A crónica.
Tu que és ilha. Trança.
Tu que cavalgas nas margens do tempo.
Concebes enredos e histórias que exalam perfumes de corpos acomodados. Em concha.
Sabias que junto ao mar os beijos alagam os areais, o vento conquista os braços de abraçar e os faróis provocam as ardências do desejo?
Contaram-te que o teu amor não cabe num poema? As crateras gritam e sussurram e a lava escorre na vizinhança dos corpos?
Disseram-te que as aves chicoteiam as ondas e se abrem fendas nas falésias?
Pediram-te que pousasses os dedos devagar? Com eles desenhasses os contornos das baías onde os
amantes se resguardam das melodias do silêncio?
Tu que és ilha. Trança.
E conheces todos os segredos dos litorais.
Também te pediram que não chamasses pelas sereias pois elas enovelam os homens incautos?
Não, não ouças o apelo dos búzios, não sonhes com viagens na dobra salgada das ondas e não te deixes enredar nos cordões das redes.
Continua a tecer-nos as tuas histórias e enredos. Veste-nos do calor do verão, evoca o brilho das constelações, os suspiros que se deixam tocar pelas nesgas de sol
e sopra-nos ao ouvido os bafos que ficaram escritos na areia. Poemas que o mar jamais apagará!
São rendas. Danças quase que perfeitas. Asas de gaivota.
Bolhas de ar e espuma.
Um todo azul. Fiadas de algas
como flores.
Os teus poemas.
Obrigado Mena. É tão belo o que dizes que acrescentar algo seria estragar. Gostei muito. Só me resta deixar aqui expressa a minha gratidão. Abraço.
Excelente reflexão sobre a vida. A vida que pode ser tantas ilhas. A ilha com o farol que indica o caminho. Porto seguro. Paz.. bonança. Outra ilha que treme fustigada pela tempestade. Trança feita e desfeita.
Mão que dá força. Sempre o mar no horizonte. A ilha que se vai afastando.
Tão belo o que escreve Poeta . Gratidão sem fim
Grande abraço.
Obrigado Eulália. Sim é tudo isso. Que bem me leu. É tão bom ter aqui a sa opinião. É uma gratidão o que sinto pelas suas opiniões. Abraço
Amanhã de manhã, quando me levantar e me preparar para me pentear, farei as minhas tranças – entrançando nelas as tuas palavras, os teus sonhos e visões, que serão verdes esperança, cor do mar. Passearmos pela areia molhada e falaremos do nosso amor numa duna escondida, onde só o sol nos verá e nos aquecerá na devida medida; aquela, que ambos auguramos. Não nos despediremos . Diremos sempre até já. A ilha é pequena e nos veremos a olho nu por entre cada ramificação de Hortenses, de Açafates-de-Prata e de Coremas. Ficaremos perfumados e não haverá despedida. A Isaurinda ficará surpreendida e não baterá com a mão na testa e eu, pensando ….QUE BELEZA DE TEXTO ACABEI DE LER, que tanto me levou a ” sonhar ” !! Parabéns Poeta !!
Obrigado Arménia. E assim se faz poesia. Belo e intenso o que escreveu. Grato pela sua presença. Abraço
Adorável a sua escrita!
Uma folha de papel em branco, sem valor. Que a sua imaginação preencheu de palavras belas e a tornaram valiosa. Escrita única.
Como o poeta sabe usar o seu talento. O talento por si só não chega, precisa de ser trabalhado e nisso o poeta é Mestre. Sabe como trabalhar a sua imaginação, é sensível às palavras belas, onde tão bem sabe navegar.
O mar está no seu coração e tudo o que faz tem alma. Que poema tão belo. “Uma ilha e uma trança.”
Adorei este sem fim de palavras, que não sei descrever.
Abraço de gratidão, meu poeta.
Obrigado Maria Luiza. Adorável o seu comentário. É tão bom ler essas suas palavras. A sua presença neste espaço uma alegria. Amiga generosa obrigado
Lida e relida. Ilhas e tranças. Umas são terra rodeada de água ; outras são fios entrelaçados. Podem ser cabelos, ou outros “fios “. Desejos? Afinal sempre entrelaçados, por isso ” tranças “. O prazer de ler-te, Poeta. Meu amigo/ irmão, creio ter tido uma revelação. É teu modo de ser o fazer tranças com palavras, ideias, amores, pessoas. Com essas tranças nos envolves, nos rodeias e ficamos Ilhas tuas. Em nada perdemos. Contigo tens a tua ILHA e estás completo. Por isso és Poeta e, contigo, uma musa que guarda os fios dos seus cabelos para teceres as tranças da VIDA.
Diz à Isaurinda que és MAR, ILHA, VIDA e com elas entranças o gosto de VIVER. Beijinho da tua Amiga/ Irmã.
Obrigado Ivone, minha Amiga/Irmã. És uma inspiração que ilhas e tranças invejam. Tuas palavras ternura difíceis de agradecer. A minha gratidão inteira. Abraço.
A tua escrita tão tua, tão livre. Sabes poeta querido, Tu és a nossa ilha. É em ti , na tua escrita que tantas vezes vimos aportar depois de marés revoltas ou de voos complicados.
As tuas palavras iluminam os nossos sentidos. Sim, a tua escrita de excelência é ilha e farol . Nunca te esqueças disso.
Ahh , quanto às manias , a Isaurinda também sabe que não serias tu, o nosso poeta querido sem elas. E tal como ela, adoramos-te.
PS: Hoje à noite , quando fizer a minha trança, sei que as tuas palavras vão estar comigo.
Abraço ❤️
Obrigado Cristina. Tanta generosidade nas tuas palavras. É muito bom ter-te neste espaço. Muito grato.