Crónica de Jorge C Ferreira | Natal

Jorge C Ferreira

 

Natal
por Jorge C Ferreira

 

Estou a escrever este texto e ainda não sei como vai ser o Natal. Não sei sequer se ele vai acontecer. Esta minha triste sina de nunca saber nada sobre o futuro. Por isso não vos vou perguntar como foi o vosso Natal. Seria um contrassenso. Isto de escrever quase uma semana antes de publicar tem destas coisas. Correm-se riscos. Gosto de viver assim.

Tive uma amiga que se dizia vidente encartada. Na rua era uma rapariga normal. Não voava. Nem deitava estrelas pelos olhos quando nos fixava o olhar. Sei que deitava cartas, tinha uma bola de cristal e um cenário apropriado na sala onde recebia os seus clientes. Havia um certo mistério. Uma envolvência que determinava comportamentos e a ajudava a ser credível. Muita gente a consultava. Nunca recorri aos seus préstimos. Nem ela aceitava tal. Dizia sempre que estava a gozar com ela. Pelo sim, pelo não, mantive-a como amiga muito tempo.

Pois, o futuro o mais imediato que está à nossa frente, mas onde nunca sabemos se vamos chegar. Definitivamente futurologia nunca foi o meu forte. Muitas das vezes que me pus a adivinhar errei estrondosamente. É por isso que fico admirado com tantas certezas que vejo sair da boca de muitos papagaios com cadeiras reservadas em vários lugares de relevo.

Digo relevo e não responsabilidade porque são coisas diferentes. Relevo é penacho. Responsabilidade pode ser trabalho. De quem eu falo é dos que “mandam bitaites avulsos” em programas e jornais. Dos que peroram aleivosias. Mas hoje não falo mais disto.

Pois, o Natal. As lojas cheias. O consumo a aumentar e a nova variante a grassar. Depois vão-se juntar todos e não sei o que vai acontecer. Eu, com muita pena minha, vou ficar por aqui. Não irei a Bristol e a Londres aos 21 anos da minha rica sobrinha “bristoliana”. Os meus 73 anos e algum cansaço acumulado levou-nos a esta decisão. Espero que tenhamos ocasião de fazer a festa noutro tempo e noutra situação. Tenho saudades daquela terra. Das noites antecipadas, das janelas enormes, da raposa atrevida que aparece lá na rua durante a noite, do chase, o cão de língua roxa que vive lá em casa.

Tenho saudades dos parques. Do futebol. Até da comida menos boa. Não sei o que me prende ali. Algum feitiço me agarrou e enlaçou num nó difícil de desatar. Tenho saudades das pessoas. Falo com os que conheço nos vários lugares onde me reconheço por vídeo chamada. Mas não é a mesma coisa. Sabe a pouco. Mesmo agora arriscava uns abraços apertados. Um abraço de sentir os corações. Um abraço suado.

Pois o Natal, como vai ser o Natal? Vocês vão-me responder nos vossos comentários. Espero! Quero saber quase tudo. O que puderem contar. Como foi a ceia, qual foi a ementa, se foram à missa do galo, quantos eram lá em casa, quantos pares de peúgas recebeu o mais velhote. Não tenham medo de contar se alguém vos pediu em casamento, se lhes pareceu terem visto um milagre, se não gostaram da aletria.

Sejam sinceros. Contem a verdade. Também podem dar azo a alguma imaginação. O que eu gostava mesmo era que o importante desta crónica fossem os vossos comentários. Desde já o meu mais profundo agradecimento.

«O que tu juntas para aí homem! Estás mesmo é danadinho por não teres ido ao aniversário da menina.»

Fala de Isaurinda.

«Isso tens razão. Tenho muita pena de não ter ido. Tenho saudades de tudo aquilo.»

Respondo.

«Tens de ter paciência. Alguma vez havias de ter juízo. Vais voltar a ver a tua menina.»

De novo Isaurinda e vai, um sorriso meio triste na mão fechada.

 

Jorge C Ferreira Dezembro/2021(329)


Jorge C. Ferreira
Jorge C. Ferreira (n.1949, Lisboa), aprendeu a ler com o Diário de Notícias antes de ir para a escola. Fez o curso Comercial na velinha Veiga Beirão e ingressou na vida activa com apenas 15 anos. Estudou à noite. Foi bancário durante 36 anos. Tem frequentado oficinas de poesia e cursos de escrita criativa. Publica, desde 2014, uma crónica semanal no Jornal de Mafra. Como autor participou nas seguintes obras: Antologia Poética Luso-Francófona À Sombra do Silêncio/À L’Ombre du Silence, na Antologia Galaico-Portuguesa Poetas do Reencontro e A Norte do Futuro, homenagem poética a Paul Celan.  Em 2020 Editou o seu primeiro livro: A Volta À Vida Á Volta do Mundo; em 2021 Desaguo numa imensa sombra. Dois livros editados pela Poética Edições.

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27 Thoughts to “Crónica de Jorge C Ferreira | Natal”

  1. Isabel Torres

    Uma crónica sobre o que não aconteceu. Sobre um “fenómeno “,sobre a excentricidade, sobre a mesquinhez, o risco,mas também sobre amor. Os familiares que não se vêem e anseamos ver. Abraçar,beijar. E sempre a beleza e acutilância das palavras do cronista .
    Um prazer ler.
    Não gosto da época do Natal. Nos últimos anos tem sido em minha casa. Pelos miúdos e por alguns lá faço a fantochada da árvore (que desfaço logo no seguinte) e das prendas (compradas ou feitas por mim,para evitar os dias loucos de consumismo e multidões). E do bacalhau. A noite de Natal,só importa pela reunião familiar e às vezes de amigos. Por vezes há muita hipocrisia e cinismo e nós a alinharmos,a fazermo-nos de parvos anseando que tudo passe. O espírito desta época deveria ser todos os dias do ano. Este ano fomos poucos. Só a família nuclear,por isso,talvez,foi um jantar de amor e depois a alegria de dois pequenitos com as prendas. Espantoso vê-los. Alheios ao tempo trágico que vivemos. Insólito matreiro numa ameaça a um nível global. Tenho saudades do anterior. E o tempo da trapalhada política.
    Um Natal banal. Sem peripécias. Um Natal também marcado pela ausência de alguns que amamos e forçosamente tivemos de estar separados. Um Natal em função deste vírus que continua a determinar as nossas vidas.

    1. Ferreira Jorge C

      Obrigado Isabel. É sempre um tempo estranho. O que é e o que já não é. O malvado consumismo. Vale a alegria das crianças. Abraço

  2. Ivone Maria Pessoa Teles

    Meu querido, calculo que tenhas lido numa publicação, na minha página, em 26/12/2921. Na noite de 24, muito caseiro, nós aqui de casa e a minha irmã. Fiz um jantarzinho e no dia seguinte trouxe a minha irmã, o almoço.
    Caseiro, como convém nos tempos que correm. A verdade é que, desde que nesta casa ficámos só nós dois, nem me apetece fazer nada. Se pudéssemos ir a casa do David, ainda pensaríamos, mas o Joaquim ainda anda em reabilitação, pelo que não íamos perturbar . Afinal, festejar o quê ? Com o que se passa no Mundo………..!!!!!!!!!
    Também sinto alguma tristeza por tantas desigualdades sociais. São dias tristes para mim.E, como disse um amigo meu, ” Natal não é quando um homem quiser ” Não, não é. Isso é que era bom. Tantos gostariam e …NÃO PODEM. Beijinhos meu querido amigo/irmão. e muito abraçados.

    1. Ferreira Jorge C

      Obrigado Isabel, minha Amiga/Irmã. Sempre um tempo simples. Tempo que temos de fazer nosso. Sempre a nossa preocupação com os mais frágeis. Grande abraço.

  3. Ivone Maria Pessoa Teles

    Meu querido, calculo que tenhas lido numa publicação, na minha página, em 26/12/2921. Na noite de 24, muito caseiro, nós aqui de casa e a minha irmã. Fiz um jantarzinho e no dia seguinte trouxe a minha irmã, o almoço.
    Caseiro, como convém nos tempos que correm. A verdade é que, desde que nesta casa ficámos só nós dois, nem me apetece fazer nada. Se pudéssemos ir a casa do David, ainda pensaríamos, mas o Joaquim ainda anda em reabilitação, pelo que não íamos perturbar . Afinal, festejar o quê ? Com o que se passa no Mundo………..!!!!!!!!!
    Também sinto alguma tristeza por tantas desigualdades sociais. São dias tristes para mim.E, como disse um amigo meu, ” Natal não é quando um homem quiser ” Não, não é. Isso é que era bom. Tantos gostariam e …NÃO PODEM. Beijinhos meu querido amigo/irmão. e muito abraçados.

    Breve irás estar com a tua sobrinha e passar

    1. Ferreira Jorge C

      Obrigado Ivone, minha querida Amiga/Irmã. Já respondi. Outro Abraço.

  4. Isabel Campos

    Hohohoho … hohohoho …

    Recebi um pedido de última hora … Coscuvilhar por aí .
    Falo-te na mais séria interiorização da minha condição de Pai Natal.

    Sabes, tu que dizes não acreditar em bruxas por não as veres voar, não fiques tão certo de que não existem nem da sua falta de poder.
    Elas e os duendes andam sempre de segredinhos.

    Apanhei-as a querer descobrir se és tu que dás ao cão um daqueles chupas que pintam a língua. Imagina, logo tu. Sei que foi encomenda de alguém, vá-se lá saber porquê. Mas diz-me a mim, eu que guardo todos os segredos, és mesmo tu que o fazes? Será que usas daqueles pozinhos de perlimpimpim? Conta, conta, estará para passar o efeito e daí a ansiedade de voltar. Será o teu segredo de mimar e o desejo de voltar?

    Meu querido Jorge, tenho em mãos a tarefa de te adivinhar mas isto está complicado. Acho que vai ficar tarefa para o próximo ano até lá pode ser que te distraias e te apanhe.

    Para agravar mais a situação, aquela chata do Porto, deu-me um trabalhão. Imagina que o presente que me pediu foi de uma bolha opaca para que nada se visse ou pressentisse da sua noite de Natal. Foi obra mas lá consegui.

    Isto cá para nós, acho que para ela é Natal todos os dias, a bolha foi para inglês ver. Lá dentro, o mesmo de sempre, os afetos, o amor, a paz, a alegria de viver, a aceitação de algumas lágrimas e sempre na condição de aprender, de crescer.

    Vá, não te tomo mais tempo. Andarei por perto. Alguma coisa, diz. Isto do COVID fez alargar o tempo de entrega dos presentes. Para já até aos Reis … Vamos ver. Para mim até ficava assim. Eu gosto da noite de Reis e dos presentes.

    Ahah … Espera, espera, mandaste-me um abraço. Toma, toma, sente-te abraço.

    Vai dando novas, prometo não contar a ninguém.

    1. Ferreira Jorge C

      Obrigado Isabel. Isso de bruxas e duendes respondo-te melhor quando estiver a morar numa floresta. Adivinhar-me? A que tarefa meteste ombros. Viraste monárquica? És princesa. Um grande abraço

  5. Maria Luiza Caetano Caetano

    O meu Natal, dos filhos e dos netos.
    Tento sempre que continue a ser, como os meus pais e avós me ensinaram, com o seu exemplo.
    Vivido em espírito de família. Ao longo da minha vida, muitos lugares ficaram disponíveis. São muitas as cadeiras que sobram.
    Este ano estiveram comigo, minha irmã, duas filhas e dois netos. O filho, a nora e três netos, só no coração. Vivem na Noruega. Não arriscaram vir, por causa da pandemia. Vimo-nos através do Skype. Mas não nos abraçámos. A diferença é muita. Mas o importante é ver que estão felizes.
    As prendinhas, sempre coisas simples, para marcar o momento. Livros para os netos e para as filhas.
    Mimos para a avó, são todos muito generosos.
    Quanto à ementa e para não fugir à tradição, tivemos o belo do bacalhau cozido, com legumes e batatinhas. Dizem que é a forma mais simples de ser cozinhado. Eu ponho em causa … deve ser da idade. E assim foi o meu Natal, muito feliz por ter os meus queridos junto de mim. Mas com muitas saudades, dos que partiram..
    Foi um Natal tranquilo e doce. Infelizmente para muitos não teve sabor. Só dor.
    Que imaginação tão profunda. Um convite cheio de criatividade, para a partilha dos comentários.
    Tão sensível e gentil, querido escritor. Em tudo põe poesia. Obrigada, Festas Felizes. Abraço enorme.

    1. Ferreira Jorge C

      Obrigado Maria Luiza. Que bom ter estado com quem Ama. Tenho medo de não estar na janela dos seus netos a assistir. Mais festas felizes minha Amiga. Abraço enorme

  6. Coutinho Eulália Pereira

    Desejo, meu amigo, que no próximo ano, possa estar a festejar o Aniversário da sua querida sobrinha.
    O Natal é para mim, a festa da família.
    Primeiro, com irmãos, pais e avós,tempos mais modestos, à volta da lareira da aldeia, entre o cheiro da canela. Depois, vêm os filhos, alegria sem fim, casa cheia de crianças, memórias que ainda hoje recordamos.
    Vão partindo os mais velhos, ficando para sempre no nosso coração.
    Eis que, de repente, me encontro na linha da frente, no meio da pandemia que nos roubou os afetos.
    Mesmo assim, o Natal aconteceu
    Com a mobilidade cada vez mais afectada, com planos alterados, tive os abraços da família. Todos juntos. Companheiro de uma vida, filhas, genros e netos. Coração cheio. Sou uma pessoa feliz.
    Mais uma vez se realizou o sonho de Natal.
    Feliz Ano Novo.
    Obrigada pela companhia diária através dos seus textos.
    Um grande abraço.

    1. Ferreira Jorge C

      Obrigado Eulália. Ainda tenho o cheiro dos meus Natais mais antigos. Dos meus mais antigos que perdi. Não ligo muito. Grato pela sua partilha. Feliz Ano. Abraço grande

  7. Filomena Maria de Assis Esperança Costa Geraldes

    – Se me trouxesses um cálice de Porto?
    – Cá em casa não há bebidas alcoólicas! – respondera de mau grado.
    Uns minutos antes, por volta das vinte e três, tinham soado pancadas secas na janela do sotão.
    Surgira um rosto amigável, sorrindo. Encharcado até aos ossos.
    – Não sei quem és nem de onde vens. Não abro!
    -Deixa-te de lérias. Não se vê logo que sou o Pai Natal?
    – O Pai Natal?
    – Sim, esse, ora essa! Está aqui um frio de rachar. Chove a cântaros. Vá lá, deixa-me entrar. Por favor!
    Abri a janela para que entrasse.
    – Então… e as renas?
    Um fato de treino?
    – As renas ficaram a pastar. Deves julgar que ficava para sempre com um ar de octogenário bonacheirão.
    Nem pensar!
    Ginásio, caminhadas e uma dieta, à maneira.
    -Que decepção. Em criança, esperava por si. Até à meia-noite.
    – Bem parvinha eras, isso, sim.
    Já fui tomar a terceira dose da vacina do Covid. Isto está mau!
    Para o ano, talvez já possa distribuir pela miudagem, uns chocolates, peúgas coloridas e uns autocolantes da Clínica “Sorriso amarelo”.
    Entretanto, tirou da calça, o telemóvel. Foi vendo as publicações e, a dado momento, exclamou eufórico:
    – Cá está ele! O Jorge C. Ferreira. É teu amigo, não é?
    Eu até sou mais dado à bricolage mas gosto de ler as crónicas dele. Interessantes vivências.
    Muito apelativas!
    Aprecio o sujeito. Sentido de humor, realista, franco e directo.
    Também consegue ser cáustico e tem uma faceta fantasiosa. Emotivo q. b.
    Um cronista e pêras!
    E os poemas? Têm que se lhe digam….
    Gostei, particularmente, desta última crónica. Puxava ao sentimento. No fundo, sou um incurável romântico…
    Olha, tenho cá uma ideia.
    Escreve sobre o nosso rendez-vous. Acho que ele vai achar graça.
    Ena pá, tão tarde. Vou!!!
    E rematou:
    – Vê lá mas é se deixas de acreditar…no Pai Natal!!!
    Soltou, ao sair, uma ruidosa gargalhada que ecoou na noite sem estrelas. Fiquei a dizer-lhe adeus. Ainda confusa com tudo o que se tinha passado. Desapareceu. Como que por magia. Sem deixar rasto…

    1. Jorge C Ferreira

      Obrigado Mena. Tu e a tua enorme criatividade. É imenso o prazer que sinto quando vejo chegar os teus comentários. É uma mais-valia incrível para este espaço. Cá em casa também não há bebidas alcoólicas. Abraço imenso

  8. Lénea Bispo

    O Natal sendo quando um homem quiser , é uma expressão poética que gostamos de dizer mas não a a sentimos na verdadeira acepção. Gostamos de marcar a data e quando isso não acontece pelas mais variadas razões, ficamos tristes , claro.
    Gostamos de o comemorar na data certa, na hora certa e embora com medos à mistura , ainda se cumprem as tradições . As luzes que piscam andam a afastar os medos e pela noite dentro, vamo- nos esquecendo .
    Eu juntei cá em casa onze pessoas , com muito trabalho, é evidente, mas o gosto e a alegria de os ter , suplantaram os cansaços .

    1. Ferreira Jorge C

      Obrigado Lénea. Que bom ter-te por aqui. Vamos ser sempre Natal. Vamos amar e cuidar dos outros. Vamos ser solidários. Que bonita deve ter sido a tua festa. Abraço imenso

  9. Maria Isabel Barros Luis

    O Natal da minha infância permanece “vivo” na mente e no coração. Vejo-me menina, de vestido creme de voile de lã, com uns certinhos azuis cheios de flores, bordados na saia rodada, encimados por pequenos laços de veludo rosa e favos de mel no peito, malinha azul clara à tiracolo e duas tranças em jeito de tótós, sapatos também azuis claros e um casaco comprido de fazenda num cinza quase branco com gola de pele branca que me defendia do frio que naquela quadra grassava na aldeia de A-dos-Molhados, onde vivia. A minha saudosa màe sempre lutou para me vestir condignamente, apesar de não ser tarefa fácil nos tempos de então.
    Vejo-me, ainda, ansiosa, ir a caminho da Igreja do Milharado, para assistir à missa do dia de Natal, encantamento máximo para mim, já que à minha espera tinha um enorme presêpio de Natal dentro da própria igreja o que me lançava num mundo de sonho e crença infantil desmedido.
    Hoje, o Natal é uma época agridoce, já que, apesar de gostar de tudo o que é característico da efeméride, as luzes, os enfeites, o brilho, os doces, uma maior proximidade das pessoas, ainda que algo aparente, etc. pesa-nos a todos na consciência, o estado actual do mundo, os múltiplos conflitos, as catástrofes naturais, as resultantes de doenças, a pobreza extrema, a enorme desigualdade entre seres com a mesma origem, a ganância dos poderosos, o desemprego, a fome e tantas outras anomalias que uma sociedade equitativa, fraterna e solidária não devia ter.
    A enorme discrepância entre o Natal de sonho e o real pesa-me muito e a verdadeira satisfação que encontro no Natal que me cabe é ainda a reunião familiar que temos conseguido realizar, com todas as precauções e cuidados, atenta “a peste” que nos assolou, com os queridos ausentes em memória, a presença do meu companheiro de uma vida, dos quatro filhos que adoro, das suas companheiras e da sua descendência de seis seres que amo como se do meu ventre também tivessem saído. Os sonhos de então revejo-os agora no olhar da minha pequenina neta de quatro anos, que parece querer abarcar o mundo com os seus enormes olhos.

    Apesar da felicidade relatada do meu Natal ao deitar-me assomaram â memória, os refugiados em autênticos campos de concentração, os migrantes que ficaram nos mares, os viventes em clima de guerra e todos os iguais a mim que sofrem desmedidamente sem qualquer horizonte à vista, e o sobressalto da injustiça adormeceu comigo.

    1. Ferreira Jorge C

      Obrigado Isabel. Gosto tanto de te ver aqui. Como devias ficar bonita com as roupas com que a tua querida Mãe te mimava. Esses nossos tempos do muito pouco e do menino Jesus. Sim, minha Amiga nunca devemos esquecer os mais desprotegidos. Sempre solidários. Até ao fim. Abraço imenso.

  10. Cristina Ferreira

    Querido Jorge, não tarda, estás em Londres a abraçar a tua menina.
    Cá por casa, como habitual, o dia 24 foi passado com a família do lado do Filipe e o dia 25 e 26 com a do meu lado. Somos uma família numerosa e muito unida. Não tem sido fácil o reduzido contacto principalmente com os mais velhos. Afinal, são eles, os que ainda estão entre nós, juntamente com os que já não estão que são a nossa referência, e a nossa memória de crianças. Agora, compreendemos mais do que nunca, a magia que eles faziam por nós . E é no pensamento neles e por eles inspirados, que tentamos dar continuidade à magia do natal aos mais novos.
    Ontem, já ao final do dia, recebi a surpresa da visita da madrinha do Manuel. Passamos largas temporadas sem nos vermos, mas quando acontece, o tempo é de magia e somos por momentos as mesmas meninas de há 30 anos atrás.
    Na minha família e amigos, os abraços acontecem da forma mais natural que possa acontecer. E porque sabemos que somos assim, combinámos todos fazer auto- teste, uma forma de nos sentirmos mais seguros.
    E resumidamente foi assim, este Natal, mais um Natal, onde os meus mortos estiveram mais vivos que nunca.
    Abraço, meu querido amigo
    Cristina

    1. Ferreira Jorge C

      Obrigado Cristina. Assim espero. São muitas as saudades. Sou um nómada por natureza. Fui obrigado a viver muito tempo só num lugar. Falas dos antigos e desses outros Natais. Fazes bem. Guarda sempre um lugar na mesa para todos. Eu não sou deste tempo. Mas lembro-me de outros Natais. Abraço grande

  11. Regina Conde

    A data cumpriu-se, foi Natal em algumas casas, ruas, em qualquer parte do mundo. Alguns nem sabiam que dia era. Uma melancolia enorme. O Natal dá-me um trabalho tremendo. Afastar o que me faz mal e voltar às memórias mágicas. Não tenho por hábito partilhar as refeições de Natal ou outras. Com esse teu jeito mereces que te conte apenas uma parte e a importante. A Inês e um livro muito especial, as receitas das avós, tomou conta cozinha e fez o peru recheado. De facto divinal. Entradas, saídas, muita criatividade comestível. Sabes, que daqui uns meses vais estar com a tua linda menina. Não tens a idade que dizes. Confesso que tenho dúvidas e medos que nunca tive. A seguir o Ano Novo, a esperança cresce em nós. Assim vivemos. Até lá deixo um abraço para todos os leitores que juntas todos os dias. Jorge, poeta, escritor, Amigo de muitos anos um imenso abraço.

    1. Jorge C Ferreira

      Obrigado Regina. Que bom o que partilhas. A minha sobrinha cozinheira a aprimorar-se. Fico feliz. O resto é uma noite e uma ceia e esse livro. Um grande abraço

  12. José Luís Outono

    Névoas destes tempos sem sóis almejados onde o refúgio a bem da saúde é uma pena difícil de cumprir.
    Como te entendo caro amigo, e releio as crónicas de saudades imensas de afectos e sorrisos vitaminadores de sonhos que perdemos, e nem a mais poderosa álgebra consegue definir ou dar como certo o fim … não do mundo, mas de olhares distantes e livres.
    Até parece que este golpe virulento deitou por terra a democracia e a ferro e fogo controla quarentenas, testes, vacinas e momentos de lazer de abraços, beijos e encontros de vozes libertas de condicionalismos.
    Preocupante sem dúvida, com os exércitos negacionistas a “furarem esquemas” e dizerem não a uma cura urgente. Curioso, como remate final , muitos já se arrependem quando o bicho morde com violência.
    Escelente trabalho de reflexão, uma vez mais, grande amigo que estimo e admiro!

    1. Ferreira Jorge C

      Obrigado José Luís. Meu amigo, poeta. A tua presença aqui é muito importante. A forma como abordas as coisas importante. Grato por estares aqui. Abraço forte

  13. Branca Maria Ruas

    A época natalícia sempre me entristeceu. Nem em criança tenho memória de gostar desta época em que as diferenças sociais tanto se acentuam. Choca-me o contraste entre o esbanjamento e a fome. Revoltam-me as injustiças. Penso nas crianças orfãs ou sem amor. Claro que, infelizmente, isso existe todo o ano mas penso que no Natal se nota mais…
    Mas pronto, não vou continuar a enumerar os motivos da minha tristeza numa época de consumismo desenfreado em que me apetece hibernar.
    Pediste para te contar do meu Natal e é isso que vou fazer. Estávamos para ser 4 mas fomos só 3. Um deles ficou retido em Porto Santo, em isolamento, e não pôde regressar na data prevista. E foi com muita pena que a vi a minha filha desapontada com a ausência inesperada do namorado. Desde que vivem juntos que tenho passado o Natal em casa deles. Mas como escreveu o poeta Ary dos Santos, Natal é quando um homem quiser…
    Foi um Natal estranho. Não só pelo motivo que já referi mas também pela minha 1ª experiência em fazer um auto-teste. E, embora vacinada e com 3ª dose de reforço, confesso que aqueles 15 min de espera até ver o resultado, me causaram alguma ansiedade. Felizmente que nenhum dos três teve teste positivo!
    Perguntas-me das pendas. Há muito tempo que deixei de fazer lista de prendas. Dou apenas uns “miminhos” às pessoas mais próximas. Preparo-os com alguma antecedência com muito amor e embrulho-os com muito carinho. Nada de coisas caras. Apenas úteis e/ou consumíveis e sempre, pelo menos, um livro.
    E eu, o que recebi? Amor, ternura, partilha de afectos e 3 prendinhas simples mas úteis de que gostei muito.
    As prendas mais valiosa são sempre as que não se compram!
    Espero que 2022 seja um ano generoso.
    Muita saúde, paz no mundo, vida digna para todos, respeito pelos direitos humanos em toda a parte do mundo, muitas alegrias e o tão desejado regresso à normalidade das nossas vidas!

    1. Ferreira Jorge C

      Obrigado Maria, minha fada boa. Tu és o pilar de uma família que te esforças por unir. O Natal é mais um acto nessa tua labuta. Sempre simples e lindo o que fazes. Porque o simples é o mais difícil de fazer. Obrigado por seres quem és. Tu e o teu belo livro. Abraço imenso

      1. Branca Maria Ruas

        Obrigada pelas tuas palavras meu querido Amigo!
        O abraço foi imenso e chegou aqui…
        Acolhi-o com muita ternura e amizade.

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