Esta mania de escrever
por Jorge C Ferreira
A escrita feita desejo. O desejo feito livro. Um escrever que as semanas e os dias vão ditando. As mãos que tremem. As teclas que se queixam. Crónicas, pensamentos, invenções. O caso que acontece à nossa frente. O acaso. Alguém que passa. Uma frase que se ouve. Tudo serve para escrever um texto. Tudo serve para que o sonho aconteça.
Muitas vezes aponto uma ideia que me surge, num bloco, no telemóvel, ou tento memorizar. A memória a ficar cheia. Um borbotar de ideias. A escrita a ficar inexequível. A vontade a crescer a partir de uma palavra. Ao redor dela escrever tudo o que temos para dizer. As letras que se misturam. Por fim algo começa a ter sentido.
Assim nos vamos contando também. Sempre um pouco de nós dentro do que vamos escrevendo. Querer chegar mais além, querer ser a estrada, todos os caminhos. A imensidade. O sem fim. A mente a latejar. O medo de não ser capaz. Ter sempre a dúvida da novidade e da qualidade do que vamos produzindo. Agora é o corpo todo que treme. As dúvidas que perturbam o raciocínio. É necessário parar um pouco, acalmar.
É então que nos damos conta que precisamos daquele nervoso que nos liberta o pensamento, que nos faz descobrir as palavras, que sofre connosco. Esquecemos as horas, os dias. Somos o calendário ausente. A casa sem relógios. A claridade e a escuridão no mesmo espaço. É então que, muitas vezes, decidimos parar e correr para a rua. Ver e ouvir pessoas, sermos parte do ruído. Beber um café. Ouvir, ou ver, mais duas ideias e regressar à mesa que nos espera. Esperar que as palavras não acabem.
De repente pedem-nos um conto e temos de interromper tudo. Sugerem-nos um livro onde juntemos o escrito ao longo do tempo e tudo recomeça. Tudo tem de ser seleccionado, visto e revisto de novo. Este processo que me põe os nervos em franja. Depois, pensar o que as pessoas vão achar do livro. Um trabalho em que somos ajudados por pessoas muito especiais. Assim nos sentimos amparados. Acalmamos um pouco.
Não estou a dizer isto para terem pena de mim. Pena é, aliás, uma palavra que não gosto nem costumo usar. Só se mete nestas coisas quem quer. Por gosto, ou por uma pulsão difícil de explicar. Torna-se algo que passa a viver connosco. Que faz parte da nossa vida e nos faz viver. Por vezes uma quase agonia. A vontade de acabar com tudo. Esta bipolaridade com que temos de conviver.
Esperar que os leitores gostem do que escrevemos é o que nos resta. Assim nos entregamos. Um baraço ao pescoço. Prontos para todos os sacrifícios. Para ouvir o que queremos e o que não queremos. Porque nos sujeitamos a isto? O que nos leva a expormo-nos deste modo? O que nos leva a aceitar estes desafios? Já me perguntei muitas vezes sobre tudo isto e fico sempre sem resposta. Para o que me havia de dar!
«Olha, eu gosto do que escreves, mas não gosto de te ver nervoso. Cuida de ti.»
Fala de Isaurinda.
«És tão sábia! Sei que te preocupas comigo e eu conto sempre contigo.»
Respondo.
«Eu compreendo o que fazes. Faz parte da tua vida e também sofro contigo.»
De novo Isaurinda e vai, um ar pouco tranquilo.
Jorge C Ferreira Dezembro/2022(375)
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Como me sinto grata pela tua escrita! Adorei! Parabéns e muito sucesso Poeta Amigo.
Obrigado Claudina. Que bom é estares neste espaço. Grato pelo teu comentário. Abraço
Acredito na inquietação da escrita. As palavras que se soltam, inventadas ou vividas. És tu que lhes dás vida em forma de livro. O nervoso de o dares a conhecer. Vamos tratá-lo com todo o cuidado. Não resistas ao segundo volume. Abraço meu Amigo.
Obrigado Regina. Sempre uma alegria a tua presença. Vou continuar a ser sempre o mesmo. A minha gratidão. Abraço
Que abençoada mania, a sua. É mágica esta crónica, lida por si no momento do lançamento, do seu livro de Crónicas.
Como tão bem explica, como nasce um livro. A mente sempre activa e as palavras a nascerem. Vou ler e vou deliciar-me.
“ Esta mania de escrever.”
Que ela permaneça, querido escritor. Adoro lê-lo.
Abraço grande.
Obrigado Maria Luiza. Minha querida Amiga tão generosa. Que feliz fiquei com a sua presença. Vou tentar nunca a desiludir. A minha imensa gratidão. Abraço grande
O cronista sobre o processo de escrita. O seu. Para nós, leitores, ainda bem que ” lhe deu para isto”: escrever. A alegria e a dor de escrever. A ” obrigatoriedade ” de o fazer. Um impulso incontrolável. Uma quase doença. O medo também. Naturalmente satisfação e orgulho. Ao talento acrescenta-se o trabalho, o esforço, a tenacidade.
Magia. Há sempre magia e amor nos escritos deste autor.
Inevitavelmente, esta tinha de ser uma crónica sobre a génese e evolução da sua escrita. O que acontece antes, durante e após a construção dos vários textos.
Obrigado Isabel. Sempre brilhantes e generosos os seus comentários. Consegue chegar ao subentendido. A minha profunda gratidão. Abraço enorme.
Maria Matos 5 de Dezembro 2022 00.29
Acredito por tudo o que passa, todas às perguntas e hipóteses que põe quando escreve. Deve ser mesmo assim….
Mas acho que a Isaurinda deu-lhe a resposta mais sensata e sincera… Nervoso, quando escreve tão bonito… quando é um prazer lê-lo!
Tenha uma noite tranquila Jorge…
Obrigado Maria Matos. Que bom ter a sua presença neste espaço. Escrever é uma aventura. Eu tento conseguir ultrapassar os medos. A minha enorme gratidão. Abraço grande
O verbo escrever , como um dia desabafei – A escrita é o acto de perpetuar o nosso sentir.
E nestes momentos da tua vontade, o papel agradece a partilha que desabafas com ele.
Depois do momento mágico da apresentação do teu recente livro, desafio-te :
– Venha o segundo volume … já!
Grande abraço
Obrigado José Luís. Meu Amigo, poeta. Sempre presente. Uma presença especial que me deixa feliz. A minha imensa gratidão. Abraço grande.