Tempo de Festas
Por Alice Vieira
Nestes tempos de festas, há quem aproveite para viajar, (sempre têm uns dias de férias), há quem fique em casa com a família, como dizia a minha avó Gertrudes, cada um é como cada qual.
Antes da pandemia eu não parava em casa. Agora, o mais longe que fui foi a Torres Novas, onde vive o meu filho. Ericeira-Mafra-Lisboa e já me chega.
Lembro-me que, em miúda, também viajava muito: o tio que me criava adorava visitar países diferentes — e sempre de carro, porque tinha um medo pavoroso de aviões. Era um enorme Chrysler, que levava lá dentro seis pessoas (sem contar com o chofer) e, quando passávamos por terras italianas, eu só ouvia as pessoas embasbacadas: “guarda che machina!”
É claro que às vezes as viagens eram um pouco rápidas demais. Lembro-me de termos chegado a Turim, de ele perguntar — como sempre fazia — onde era o centro da cidade, chegar lá, sair do carro, olhar em volta e dizer “está visto”. E seguíamos logo para outra cidade, que não se podia perder tempo.
Mas uma das viagens que eu gostava mais de fazer era a Mondariz, na Galiza. O meu tio tinha um grande amigo, galego, que lá vivia e, de vez em quando, lá íamos. Ficávamos num hotel minúsculo onde a D.Clara, a dona, tocava piano ao jantar. Aquilo era uma desafinação completa, mas todos batíamos muitas palmas. E ela também gostava muito de nós porque lhe levávamos sempre quilos de café — porque o café que lá havia era uma mistela pavorosa
Foi desde essa altura que fiquei com vontade de fazer o Caminho de Santiago. (Agora já me passou, claro!) Havia caminheiras que chegavam ao nosso hotel, apoiadas a um bordão, e eu ouvia-as fascinada. Contavam tudo o que tinham visto. E o que ainda haviam de ver. Lembro-me de pensar “hei de ir com elas!”
Mas depois ia brincar com o meu amigo Lalo, ligeiramente mais velho que eu e que, para minha grande inveja, vivia sempre em Mondariz. O Lalo também era criado por um tio — o tal senhor galego muito amigo do meu.
Os anos passaram, as nossas vidas tomaram outros rumos, Mondariz tornou-se apenas um lugar esquecido no mapa.
Só o Lalo continuou meu amigo.
Começou a trabalhar na televisão. Resumindo e concluindo: é o Eládio Clímaco. Mas, para mim, é e há de ser sempre o Lalo.
Alice Vieira
Atualmente colabora com a revista “Audácia”, e com o “Jornal de Mafra”.
Publica também poesia e é considerada uma das mais importantes escritoras portuguesas de literatura infanto-juvenil.
Pode ler (aqui) as restantes crónicas de Alice Vieira