Os fantasmas que por aqui andam
Por Alice Vieira
A gente nova é claro que nem imagina de que é que estou a falar, mas também duvido que os adultos saibam a história toda.
Quem estiver de frente para o mar, na Praia do Sul, da Ericeira, se olhar para a sua esquerda, vê uma enorme moradia no alto de umas rochas. Melhor vista não pode haver.
Ora bem : trata-se de uma casa assombrada. Os fantasmas passeiam-se nela durante todo o dia e, à noite, vão apanhar pessoas que andam por ali, matam-nas e enterram-nas num poço, onde elas desaparecem imediatamente sem deixar rasto.
Desde miúda sempre ouvir contar esta história.
E ainda hoje adoro contá-la, sobretudo aos turistas estrangeiros. E levá-los a passear por lá, onde podiam ver um poço e uma casa abandonada. Era o nosso orgulho.
Mas aquilo que é bom não dura muito… Um dia a Capitania resolveu comprar aquilo e lá se foram os fantasmas. Dizem até que agora é Alojamento Local (por acaso até ficava bem meter aqui uma canção com letra de Maria do Rosário Pedreira chamada “Marcha Erasmus”, se puderem oiçam, e vão chorar a rir).
Adiante.
Esta gente não sabe mesmo aproveitar os tesouros que tem… Em Leicester (Inglaterra), há uma grande casa, perfeitamente normal, até há escritórios pelo meio — mas o andar de baixo tem uma grande tabuleta, a toda a largura, que diz: “Aqui qualquer pessoa pode dormir com fantasmas”. É um bocadito caro, lá isso é, mas também os fantasmas devem querer ser bem pagos.
Quando os meus netos eram pequenos e viviam em Leicester, isso foi logo das primeiras coisas que a Adriana me foi mostrar, da primeira vez que lá fui. E muito séria, como se estivesse a mostrar a fachada de um teatro. E vocês nem acreditam na fila de gente à espera para poder entrar! Muitos chegam a marcar de um dia para o outro para não esperarem tanto.
Então a gente por aqui não podia fazer a mesma coisa? Haviam de ver como a gente para o Alojamento Local fazia bicha também…
Não temos mesmo queda para o negócio…
Alice Vieira
Atualmente colabora com a revista “Audácia”, e com o “Jornal de Mafra”.
Publica também poesia, sendo considerada uma das mais importantes escritoras portuguesas de literatura infanto-juvenil.
Pode ler (aqui) as restantes crónicas de Alice Vieira