Lembrando Carlos Pinhão
Por Alice Vieira
Na passada 2ª feira faz trinta anos que morreu Carlos Pinhão. Nem quero pensar que já passou tanto tempo!
Todos os dias me lembro dele, por variadas razões — mas todas me fazem rir. Acho que nunca o vi mal disposto.
Para quem não sabe ou não o conheceu, Carlos Pinhão foi um grande jornalista desportivo (escreveu para a “Bola” e para o “Record”, mas também para outros jornais e revistas sobre outros assuntos — “Vértice”, “Diário de Lisboa”),
“Diário Popular”, “Público”, ”Jornal do Fundão”. E ainda comentador do programa de televisão “Donos da Bola”.
Foi também um grande escritor para crianças, um grande cronista e um grande poeta.
E muito mais coisas de que agora não me lembro.
Mas foi sobretudo um grande amigo, que me ensinou muito como trabalhar em jornais desportivos e escrever sobre os jogos que ia ver ao campo, quase sempre com ele—como se estivesse apenas a conversar e a rir sobre o que víamos. Ainda hoje digo muitas frases dele, como por exemplo “vou entregar a obra ao freguês” — quando ia entregar os textos aos jornais. (Em criança tinha vivido com um familiar que era alfaiate…).
Lembro-me de um dia estar com ele a assistir a um jogo de futebol e à nossa frente estava um homem que se levantava e se sentava e tornava-se a levantar e berrava contra o árbitro, e gritava, e o Carlos, simpático como sempre, tocou-lhe no ombro e disse “ó amigo, desculpe, mas nós estamos a trabalhar!” E ele, “e eu? Acha que me estou a divertir?!” O que a gente se riu… Agora essas coisas não aconteciam porque agora os jornalistas têm um excelente camarote ao cimo do estádio, com comidas e bebidas e tudo.
Um dia ligou-me para me contar não sei o quê e depois disse-me que tinha ido ao médico. Mas que não era nada, consulta de rotina, o médico tinha falado em plaquetas e aquela palavra de certeza que não queria dizer nada de mal, claro.
Rimos, combinámos a nossa próxima ida ao futebol– e duas semanas depois morria.
Alice Vieira
Atualmente colabora com a revista “Audácia”, e com o “Jornal de Mafra”.
Publica também poesia, sendo considerada uma das mais importantes escritoras portuguesas de literatura infanto-juvenil.
Pode ler (aqui) as restantes crónicas de Alice Vieira