Festas em Família
Alice Vieira
A única vez que me lembro de me ter zangado mesmo a sério com amigos foi já há muitos anos quando, depois de me convidarem para passar o fim do ano com eles, ligaram a televisão e estiveram o tempo todo de olhos cravados no écran para ver se, num determinado concurso muito popular, que terminava nesse último dia de Dezembro, o vencedor iria ser quem eles queriam que fosse.
Mal sabia eu que, muitos anos depois, com iphones e ipads e smartphones e o mais que por aí cada dia se inventa, o panorama ainda iria estar muito pior.
As reuniões de amigos são reuniões para se tirarem selfies, para mandar para o instagram, ainda estamos a acabar uma frase e já ela está escarrapachada no Facebook com não sei quantos likes—e a televisão continuamente ligada.
E depois os adultos queixam-se de que as crianças estão violentas e agressivas, de que as crianças não lêem, que só estão agarrados aos tablets e aos jogos—sem perceberem que tudo passa por eles ,que fazem exactamente o mesmo.
Gostava que nestas últimas festas as coisas tivessem sido diferentes…mas não acredito muito.
Por isso, neste princípio de ano, atrevo-me a deixar aqui algumas sugestões.
Os pais podiam, por exemplo, instituir a “Semana Da Brincadeira” (no Brasil celebram a “Semana do Brincar” em Maio, mas para brincar todos os meses são bons..) Uma semana em que as aparelhagens descansassem e fossem substituídas por , sei lá, idas ao Jardim Zoológico, ou a um museu, ou a um castelo, ou a outro qualquer monumento histórico. Quantas vezes vivemos a nossa vida toda em lugares que não conhecemos, ou conhecemos mal, ou donde conhecemos apenas a nossa rua e a rua da escola. Lembro-me de, há anos, ter ido a uma escola na Batalha , com miúdos a dizerem-me que nunca tinham entrado no Mosteiro.
Mas há outras ideias capazes de substituírem por uns dia as televisões e os samartphones permanentemente ligados. Um livro, por exemplo. Leiam um livro. Ou leiam histórias aos mais novos da vossa casa. Ou inventem peças de teatro.
Lembro-me do que me divertia quando os meus netos eram pequenos e representavam sempre uma peça, escrita por eles, na véspera de natal. (E até cobravam entradas…coisa pouca, está claro, mas sempre era a recompensa do esforço e, como a mais velha desde muito pequena repetia, “todo o trabalho tem de ser pago”. Pode não ser muito natalício, mas não deixa de ser muito verdadeiro…)
Eu sei que, nestas coisas, às vezes o difícil é convencer os pais…Convencê-los a desligar o smartphone, a desligar o computador, a desligar a televisão.
Convencê-los a pegar num livro. Há quanto tempo é que os pais não lêem um livro? O trabalho, claro, sempre o trabalho, e as horas que se gastam nos transportes, e o trânsito, e a chuva, e a crise… Não, ninguém tem uma vida fácil.
Mas, pelo menos neste princípio de ano em que toda a gente apregoa que temos de pensar nos outros, que temos de ser solidários, que é preciso banir o consumismo desenfreado—que tal se começássemos a praticar tudo isso em nossa casa?
Vá, pais e avós de família: fechem lá a televisão, deixem o smartphone longe da vista – e peguem num livro.
Não custa nada. E garanto que no fim se sentem todos muito melhor.
Bom Ano!
Excelente recomendação.
Bem-haja.