Recordo muitas vezes a frase de Gilles Deleuze: “não é caso para temer ou esperar, mas sim procurar novas armas”. Recordo-a aceitando que essas armas, aludidas em contexto certo, não são as do foguetório dos Trump e dos Bolsonaro, aceitando todavia que os povos não devem andar armados – embora devam pegar em armas em nome da insurreição pela justiça que merecem-, nem são também as armas do Irão e dos enriquecimentos (do urânio e da conta bancária), nem dos fundamentalistas que prolongam na fraqueza e no derramamento de sangue a fraqueza da sua pobre existência.
A falar de armas, sejam as culturais, as que são alicerces firmes, as que transformam o ser humano de irracional em raciocínio.
Ao olhar para aqueles que refletem sobre o mundo da atualidade e deixando de fora os políticos, que são pequenos escravos dos seus objetivos e ambições, faço uma lista com dois grupos bem definidos: de um lado coloco os que constroem alternativas e dinâmicas de teor ecologista. A definição demonstra que a Ecologia é a especialidade da biologia que estuda o meio ambiente e os seres vivos que vivem nele, ou seja, é o estudo científico da distribuição e abundância dos seres vivos e das interações que determinam a sua distribuição. Do outro lado, alinho os profetas da desgraça, talvez um tudo nada realistas mas, no entanto e mesmo assim, profetas e catastróficos, desses que apregoam o fim do mundo, das espécies, de si mesmos.
Não há terceira coluna. Podia enchê-la de indiferentes e de ignorantes, abundam, mas por essa mesma dupla condição, de não se envolverem e de ignorarem, não merece qualquer categoria. São a classe dos que não têm classe. Assim, fico com duas colunas. Uma é criativa, construtora, inovadora, salvadora, capaz de se abeirar de pântanos sem fundo e dar-lhes notabilidade, uso, enquadramento, reciclando-os ou promovendo-os. Do outro lado, os profetas da desgraça, os traficantes de promessas, os promotores de notícias falsas e de becos sem saída. É uma luta dura, entre ambos.
Jacques Rancière disse há tempos que toda a história é uma história de desintegração.
Somos desintegrados, todos nós, vivemos em zonas esteticamente alienadas e sinistradas, esquecemos a sensibilidade do outro e fartamo-nos dos ecos que nos vão chegando, precipitando-nos em ações que por vezes são opostas às nossas convicções e nos colocam a um nível raso de cumplicidade com o lado que não merecia o nosso apoio. Somos todos vítimas culturais, diria. Do que somos individual e coletivamente.
Queremos o mundo que queremos. Mostram-nos o mundo que perdemos. Saltitamos do lado dos que apontam soluções para o lado dos que dizem não haver solução.
Não tememos nem esperamos. Só estamos desarmados. Por enquanto.
Alexandre Honrado
Historiador
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