Crónica de Alexandre Honrado
Escrever ou não escrever-me eis a questão
Tenho de confessar que é um sintoma revelador dos meus desequilíbrios mais comezinhos o facto de não escrever. E às vezes a ausência é notória e dorida, acreditem.
Quando estou feliz – ou pelo menos motivado – é na escrita que estabeleço os primeiros degraus de uma subida à tona, pois, mesmo sem grande objetivo a cumprir, sei que as ideias escritas fixam e fixam-nos enquanto seres, melhorando graus de entendimento e de sociabilidade, elevando os nossos pontos de vista críticos e reflexivos que o simples ato da oralidade não consolida nem alcança. Não atingimos patamares de igualdade, nem metas de equidade, mas expormo-nos a ponto de ser no outro e criar com o outro mais espaço comum. É saudável e retemperador quando assim é.
Para tanto, percebi que tenho imensos meios ao meu alcance, da escrita breve e sentida do poema mais intimista aos disparates audiovisuais que não duram mais do que uns minutos, passando pela arte dramática onde dependo dessa relação orgânica direta entre os atores, os meus representantes, e os espetadores, os meus juízes. Confesso que tenho andado recentemente, e muito, por esses caminhos da velha arte dramática! Que emoção, que nervoso, que responsabilidade.
Escrever é também uma corrida, um descanso, um exercitar de uma capacidade técnica, uma coisa que não explicamos mas que nos explica, um efeito onírico e factual, uma entidade técnica ao nosso serviço. Um trabalho artesanal que se aprende todos os dias e que, mesmo assim, não parece completo. Só faz sentido quando se destina a alguém – leitor, ouvidor, recetor e perde qualidades quando feita ao espelho, a escrita, umbilical, unívoca, narcisista. Duvido quando se escreve nas redes sociais apenas porque sim. Não há destinatário definido, o veículo é pobre, as intenções quase sempre egoístas e infelizes. A comunicação social, que participa como pode da constituição do nosso mundo, representa um processo primário, através do qual a sociedade é criada e recriada novamente, e o que lhe devoto, em escrita, é cada vez mais escasso e cauteloso. Há ainda o que escrevo nas paredes. Essas tatuagens incomuns que imagino como forro das ruas por onde passo. Um pouco como a escrita desta mesma reflexão, que aqui vos deixo.
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