Crónica de Alexandre Honrado
Coisas que visito, leio (e não comento)
Itamar Ben-Gvir é advogado, é também político e foi nomeado muito recentemente (em dezembro de 2022) como novo ministro da Segurança Nacional do governo liderado por Netanyahu, uma coligação que tem dado muito que falar e que escrever, mais ainda que pensar.
Ben-Gavir é de extremíssima direita e tem coisas como esta: defende a anexação, por Israel, da Cisjordânia, onde vivem 2,9 milhões de palestinianos. Também defende a expulsão de parte da população árabe de Israel. E toma atitudes em conformidade, como visitar (durante 15 minutos, mas com consequências demoradas) o complexo da mesquita Al-Aqsa, em Jerusalém, desencadeando uma crise política que pode, uma vez mais, redundar em conflitos sangrentos e irreversíveis: Palestinianos e a Jordânia interpretaram o gesto como uma provocação. A visita ocorreu ao quinto dia da tomada de posse de Itamar como ministro.
Este é um vestígio inequívoco de dois antigos templos de fé: a Mesquita de Al-Aqsa e a Cúpula da Rocha (edifício, situado no monte do Templo, na Cidade Velha de Jerusalém, construído no século VII, sendo um dos sítios mais sagrados do Islão e uma das grandes obras da arquitetura islâmica).
O complexo da mesquita Al-Aqsa inclui a Esplanada das Mesquitas, o terceiro local mais sagrado do mundo para o Islão (logo depois de Medina e Meca, na Arábia Saudita), também reverenciado por judeus, como o mais sagrado local do judaísmo.
As visitas de Itamar Ben-Gvir à Esplanada são vistas como puramente ideológicas e sem qualquer conotação religiosa.
Desde a conquista de Jerusalém Oriental por Israel em 1967, a esplanada está sob administração jordana. Ali ergue-se ainda o Muro das Lamentações, último vestígio do segundo templo judaico, edificado após a destruição do anterior, construído por Salomão. No ano 20 a.C. foi reformado por Herodes o Grande, na tentativa de conquistar a simpatia de César. Em 70 d.C. foi demolido pelas ordens do imperador Tito, como demonstração de força do Império Romano diante da Grande Revolta Judaica. Hoje é o mais forte centro de culto judaico (venerado, portanto, pelos judeus por ser o único vestígio dos Templos dos reis Salomão e Herodes).
Fica a 487 metros do Santo Sepulcro. Ali ergue-se púlpito que Saladino doou há cerca de 800 anos à mesquita sagrada de Al-Aqsa (tem seis metros de altura, quatro de comprimento, um metro de profundidade e dezoito degraus.). Saladino liderou os muçulmanos contra os cristãos durante as últimas cruzadas, construiu o púlpito com madeira de cedro, e o doou em 1178 à mesquita de Al-Aqsa. Em 1969, foi incendiado por um turista, australiano Michael Denis Rohan, membro de uma seita protestante conhecida como “Igreja de Deus”. Causou o incêndio em Al-Aqsa, para “acelerar a chegada do messias”.
O púlpito foi restaurado pelo Reino da Jordânia, ao qual Israel reconhece ter direitos históricos na colina de Omar as-Sharif, chamada pelos judeus o Monte do Templo. O novo púlpito pesa toneladas, fez a travessia de Amã até Jerusalém em 25 caixas, que foram transportadas por seis camiões. Demorou sete anos para ser reconstruído, e as obras foram financiadas pela Jordânia. Na construção, foi utilizada madeira da Turquia e marfim da África.
A colina de Omar as-Sharif – em cujo sopé fica o Muro das Lamentações, o Santo Sepulcro e as mesquitas de Al-Aqsa e Omar estão localizadas num raio de menos de um quilómetro.
Pensemos nisto. Algumas conclusões nos chegarão.
Alexandre Honrado
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