A aldeia de Carvalhal, na UF de Igreja Nova e Cheleiros foi ontem sede da Assembleia Municipal de Mafra (AMM), naquela que foi a 4ª sessão ordinária do ano e a última deste mandato. O público ficou sentado em, muito incómodas, cadeirinhas de escola. Terá sido uma mensagem subliminar, como quem diz que os fregueses e os munícipes têm muito que aprender?
O valor de uma assembleia política mede-se pela qualidade do trabalho realizado, pela qualidade e diversidade das opiniões que ali se expressam, pela efectiva fiscalização aos actos do poder executivo, e pela igualdade de tratamento dado aos diferentes partidos que, em função dos votos recolhidos, ali devem expressar legítima e livremente a sua opinião. A importância da Assembleia Municipal de Mafra tem sido pouca ou nenhuma. Tem reunido só quando a lei determina, o debate tem sido desincentivado, as intervenções são habitualmente desinteressantes e as sessões parecem-se mais com um rito religioso do que com uma assembleia política. A excepção terá sido a sessão de ontem, muito à conta da proximidade das eleições autárquicas.
Pedro Tomás (PS) não faz parte das listas do seu partido para as eleições de Outubro, nem tem assento na sua direcção local. Assim, enquanto autarca, terá feito ontem na AMM, a sua última intervenção politica dos próximos anos enquanto eleito local. Fechou através de um muito digno discurso de despedida, centrado na sua acção politica no concelho ao longo dos anos. Defendeu o chamado bloco central, advogando os benefícios de uma convergência local entre PS e PSD. Esta foi a única intervenção com aplausos, aplausos vindos sobretudo de sectores afectos ao PSD, aplausos que tiveram o beneplácito do presidente José Bizarro, que em circunstâncias idênticas costuma intervir para evitar que ocorram palmas. Pedro Tomás dedicou-se entretanto à actividade privada, no âmbito da qual terá assinado um contrato de prestação de serviços com a GIATUL, uma empresa municipal, contrato orientado para a gestão das redes sociais daquela empresa.
Também de partida, a deputada Beatriz Severino (PS) focou a sua intervenção num tema a que tem dedicado uma boa parte das suas intervenções na AM, o IMI, a taxa elevada deste imposto no concelho e o esforço que as famílias se vêem obrigadas a fazer para, pagar o imposto.
Fátima Caracol (PSD), que também deverá, tudo o indica, deixar a AM, no seu habitual tom, fez um do discurso laudatório do executivo municipal, discurso focado nos eventos patrocinados pela Câmara Municipal – encontro dos 2 CV, comemorações dos 300 anos do lançamento da 1ª pedra do Palácio Nacional de Mafra, Festival Municipal de Folclore e das Bandas Filarmónicas.
David Sardinha (PSD) focou a sua intervenção nas virtualidades do plano de combate ao insucesso escolar apresentado pela CMM na última reunião do Conselho Municipal de Educação.
Artur Claudino (PSD) dedicou a sua intervenção à limpeza dos rios levada recentemente a cabo pela câmara de Mafra.
António Silva (PS) feza sua intervenção em torno da festa da Charneca e do Festival de Folclore patrocinado, nessa ocasião, pela câmara Municipal. Referiu que a existência do festival constitui uma “overdose” de folclore, prejudicando a a apresentação de vários estilos daquele tipo de danças populares.
Coube a José Martinez (CDU) um dos discursos da noite. Num tom irónico e muito eficaz, deixou agastados muitos elementos da maioria, levando mesmo o presidente Hélder Silva a ignorar completamente os temas que focou na sua intervenção. No tom irónico que deu à sua intervenção, perguntou ao presidente da AM se o presidente da câmara já tinha respondido às questões que aquela força politica tinha colocado em assembleias anteriores, questões referentes, nomeadamente, à situação da Mafraeduca, cujo deficit rondará já os 19 milhões de euros. Numa alusão à posição do PS relativamente à taxa do IMI, referiu que “o PS manifestou-se contra, votando a favor”.
José Graça (PS) fez, um dos melhores discursos da noite. Defendeu o direito à diferença e as vantagens do debate político, referindo que a AM não tem feito mais do que ser “uma caixa de ressonância do executivo camarário”. Criticou a posição de José Bizarro relativamente ao seu voto de qualidade, o qual determinou a não aprovação do voto de pesar pela morte de Mário Soares. Focado na política educativa do concelho, analisou os dados referentes ao abandono escolar e apontou caminhos e soluções, numa intervenção focada num tema que é fulcral para o concelho e para a consolidação da cidadania enquanto pólo de desenvolvimento. Respondeu ainda a José Martinez (CDU), a propósito das votações relativas ao IMI, referindo que “na Assembleia de República houve acordo com a CDU, mas que esta coligação votou de forma diferente na câmara de Mafra.
“No meio de tanta parra não vi a uva” afirmou, a dado passo, referindo-se a uma intervenção da oposição, José Bizarro, abandonando a sua posição de Presidente da Assembleia Municipal de todos os mafrenses, numa atitude de menos imparcialidade, que não prestigiará o órgão a que preside em nome de todos os cidadãos do concelho.
J. Lourenço, deputado municipal e presidente da JF da Venda do Pinheiro e Sto Estêvão das Galés usou da palavra para questionar por que razão, estando concluídas as obras do novo Centro de Saúde da Venda do Pinheiro, este ainda não foi inaugurado. Esta intervenção e o comentário que então proferiu Hélder Silva, deram origem a um aparte de Sérgio Santos, vereador do PS e a uma posição pública posterior deste vereador. Este episódio será tema de um artigo do JM.
Jorge Santos (PSD) fazendo apelo a uma expressão muito querida dos naturais do concelho de Mafra, os chamados “nascidos e criados”, enalteceu as virtualidades do concelho enquanto território com uma excelente qualidade de vida. A21 como boa estrutura viária, reflexo dos bons acessos do concelho, boas escolas, bons centros de saúde, muita gente a valorizar o concelho vindo viver para cá, tudo isto como reflexo das politicas que a maioria do PSD tem imprimido no concelho.
Hélder Silva, um pouco mais nervoso do que é costume, começou por referir “não ter registado perguntas dignas de resposta” e que “as intervenções não foram úteis”, no entanto, no seguimento das suas intervenções, não resistiu a fazer algumas alusões às questões que a oposição foi colocando. Referiu o orgulho em ser mafrense, agradeceu o apoio de que tem sido alvo e realçou o facto de Mafra continuar a atrair muita gente que para cá vem viver, desfrutando da sua qualidade de vida. Fez uma defesa cerrada do Matadouro Municipal enquanto estrutura económica rentável, disse que ao contrário do que ocorria nos tempos de Ministro dos Santos, agora o município faz pagamentos a 15 dias e que a dívida caiu 20 milhões.
Esta sessão foi marcada também pela falta, já costumeira do deputado do Bloco de Esquerda e pelo facto de não termos assistido a nenhuma intervenção por parte da deputada do CDS, nesta que terá sido também a sua última participação numa Assembleia Municipal.
Se a todas as mudanças resultantes das inclusões e exclusões das novas listas aos órgãos autárquicos, adicionarmos a passagem de Rogério Costa, ex CDU, para candidato à presidência da Câmara Municipal de Mafra pelo PS, como independente, as novas personalidades que encabeçam as listas pelo CDS, a entrada do PAN e do BE na contenda eleitoral por Mafra, então, teremos à nossa frente, certamente, uma legislatura com caras, personalidades e ideias diferentes. Também ao nível do executivo, se fala na possibilidade de Célia Fernandes, embora devendo assumir o cargo enquanto vereadora, não vir a completar o mandato.
Quanto às propostas em votação, todas elas foram aprovadas por unanimidade.
Seis munícipes usaram da palavra no final da sessão. A limpeza do Lizandro, os transportes na Venda do Pinheiro (ou a falta deles), os serviços de saúde (esta intervenção deu origem a mais uma posição menos conseguida do presidente da AM, quando classificou aquela intervenção como “desagradável”) , interveio também um munícipe que veio à assembleia pela segunda vez para tentar obter resposta, sem sucesso, a uma petição anteriormente apresentada. Ao contrário do que é habitual, o presidente Hélder Silva dedicou algum do seu tempo a responder a cada um destes munícipes.
Esta foi uma sessão dominada pelo clima eleitoral, é certo, mas também uma sessão feita de gente viva, algo que raramente se vê nestas andanças habitualmente tristonhas e desinteressantes da Assembleia Municipal de Mafra.
Como os portugueses costumam dizer, independentemente do concelho onde residam, “quem dera que houvesse eleições todos os anos”.