[i]A Europa, leia-se Bruxelas, estabeleceu as grandes prioridades onde os novos fundos europeus poderão ser aplicados por cada um dos países da União. Neste contexto Portugal foi o primeiro a apresentar um plano que se encaixasse dentro das linhas programáticas indicadas. E fê-lo com tanta pressa que Bruxelas o conheceu primeiro que o nosso Parlamento e, concomitantemente os portugueses.
E agora que os valores atribuídos a cada um dos pilares são conhecidos constata-se que o Estado se apropria da maior fatia dos dinheiros a serem enviados para Portugal. E são tão mal divulgados que, embora estejam em consulta pública, não fornecem os elementos necessários para que se possam fazer contas e aferir resultados, algo em que o Governo atual tem sido pródigo favorecendo assim a ideia de que tudo está bem neste reino da fantasia em que Portugal, entretanto se transformou. Alinham-se uns números, enormes, cheios de milhões, certamente para impressionar os portugueses: 14.000 milhões de Euros a fundo perdido, mais 2.500 milhões de Euros por empréstimo. Esconde-se que estes números são para serem aplicados uns até 2025 e outros até 2030. Quer isto dizer que se dividirmos tudo isto por 5 ou por 10 o aspeto será bem diferente.
De todo este valor o Estado vai-se apropriar de cerca de 80% canalizando-o de imediato para a administração pública. O que fica espera-se que chegue quase inteiro às empresas. Isto não faz sentido. Segundo foi por demais propalado, estes dinheiros agora postos à disposição de Portugal seriam destinados à ‘reconstrução’ do que foi destruído pela pandemia que, contas feitas, terá retirado do PIB nacional 20.000 milhões de Euros. E o que foi destruído? Tecido produtivo privado. O Estado não foi gravemente afetado.
Porque o Estado não se vai distanciar desse dinheiro e porque a UE vive numa economia de mercado embora social, mas, contudo virada para a criação de riqueza, não se entende como é que se pretende constituir como agente económico para recuperar a economia. O que irá acontecer isso sim, é que a maior parte das verbas serão utilizadas para tapar os buracos de investimento público que ao longo destes últimos anos têm sido anunciados, mas que nunca saíram do papel. Convém aqui lembrar que terminado o programa Portugal 2020, este se saldou apenas por 37% de concretização. Não é bonito!
Para quem quiser aferir o que aqui escrevo poderá ler o artigo do Ministro do Planeamento Nelson de Souza. Deixo aqui o link:
https://www.portugal.gov.pt/pt/gc22/comunicacao/noticia?i=plano-de-recuperacao-e-resiliencia-recuperar-portugal-construindo-o-futuro
O artigo é bem mais pequeno que o texto completo do PRR e diz exatamente o mesmo. Parece um programa de governo, mas não tem uma linha para a recuperação do turismo, da cultura, da restauração, do comércio local. No entanto repete o que nos vêm a prometer ano após ano e para o que nunca existiu disponibilidade de investimento público.
Chega a ser caricato quando se promete que, e transcrevo, se propõe a ‘adquirir 260 mil computadores de uso individual, para alunos e professores’. Outra vez? Então os computadores já não estão todos comprados aguardando-se apenas a sua entrega?
De promessa em promessa vão-nos dizendo:
- Criar 35 novas unidades móveis para cuidados de saúde primários
- Alargar a Rede Nacional de Cuidados Continuados com 5.500 novas camas de internamento
- Alargar a rede Nacional de Cuidados Paliativos, com 400 camas de internamento
- Requalificar ou adaptar 326 edifícios para aumentar a eficiência energética, cumprir planos de contingência e/ou assegurar a acessibilidade, a segurança e o conforto de utentes e profissionais
- Alargar a rede de equipamentos e respostas sociais ao nível da infância, pessoas idosas e pessoas com deficiência ou incapacidades (28.000 lugares em respostas sociais intervencionadas);
- Apoiar 26 mil agregados familiares com habitação digna
- Criar 15.000 novos postos de trabalho qualificados, e aumento da despesa (pública e privada) em I&D para pelo menos 2% do PIB até 2025.
Então, mas isto foi tudo destruído pela pandemia? Claro que não. Tudo isto deveria estar já em execução ou executado como investimento público. Tudo isto será bom, tudo isto é necessário, mas nada disto vai recuperar o tecido económico destruído pela pandemia. O Estado vai engordar, o IEFP e as Empresa Públicas e Municipais vão engordar e quem chegou moribundo ao fim da pandemia irá acabar por soçobrar com o Estado a nadar na maior injeção de capital externo de que há memória.
Mafra, 24 de Fevereiro de 2021
Mário de Sousa
[i] https://www.portugal.gov.pt/pt/gc22/comunicacao/noticia?i=plano-de-recuperacao-e-resiliencia-recuperar-portugal-construindo-o-futuro
Pode ler (aqui) outros artigos de opinião de Mário de Sousa
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