Garraiadas e a violência das palavras
No próximo dia 10 de Maio vai ser realizada uma Garraiada Solidária, como evento de angariação de fundos para construção do novo quartel dos Bombeiros Voluntários da Malveira. As garraiadas e vacadas ocorrem no Concelho de Mafra também nas festividades de algumas localidades.
Os animais envolvidos nestes espetáculos e quaisquer eventos tauromáquicos (tais como corridas de touros, largadas, etc.) são seres sencientes, capazes de sentir emoções. São seres dotados de interesses e necessidades inerentes à sua condição. O atual estatuto jurídico do animal, legalmente lhes atribui o estatuto de ser senciente, capaz de sentir emoções, não sendo mais considerados como coisas.
Numa garraiada é utilizado um bezerro (garraio). O bezerro é transportado da ganadaria em condições que lhe causam stress, conduzido com aguilhões para o cercado. No cercado o bezerro é perseguido, atormentado e violentado por pessoas que recriam uma “pega” ou “tourada”, não existindo o lado sanguinário da tourada. Nas garraiadas é frequente os bezerros sofrerem lesões. É uma prática altamente stressante para o animal, para o efeito único de diversão e entretenimento humano. Neste caso também para angariação de fundos. Os Bombeiros Voluntários da Malveira, soldados da PAZ precisam de melhores condições, de novas instalações, de um novo quartel. Essa nova realidade é muito merecida pelo exemplar trabalho que fazem em prol das pessoas e também dos animais, e melhoraria em muito as condições de trabalho destes homens e mulheres.
O facto de nos opormos a este evento, nada tem a ver com os bombeiros, mas sim, com a necessidade de proteger um ser vivo que será exposto a uma situação que é oposta ao seu bem-estar. Esta forma de angariação de fundos, que tem por detrás uma causa tão nobre, não é no nosso entender ética, é pouco empática e sem compaixão. Há outras formas de angariação de dinheiro, que não passem por esta forma de exploração e maus tratos a animais.
Segunda a Declaração universal dos Direitos dos Animais, da UNESCO, no seu artigo 10º –
1) Nenhum animal deve ser explorado para divertimento do homem;
2) As exibições de animais e espetáculos que utilizem animais são incompatíveis com a dignidade do animal.
O PAN não pode aceitar esta forma de violência para com os animais.
Sabemos que esta nossa posição ofende a sensibilidade de muitas pessoas (cada vez menos pessoas, felizmente), não sendo essa a nossa intenção. Vivemos numa democracia, que nos dá a liberdade de expressão. Contudo, essa liberdade trás responsabilidades e limites. Não podemos dizer tudo o que nos apetece para defender um argumento. Testemunhámos esta semana, nas redes socias, como as pessoas se violentam e desrespeitam para defender a sua posição em relação a esta matéria. De ambos os lados. É triste ler-se frases ofensivas e pessoas a magoarem-se mutuamente. Não é salutar, não é digno. É possível não concordar com a tauromaquia, continuando a respeitar quem a defende. E vice-versa. A não-violência e respeito pelo próximo, são valores que preconizamos. Contudo, não vacilaremos na defesa de quem não pode se defender, de quem está desprotegido, neste caso: os animais. Sim, os animais são um “quem” e não uma coisa. São alguém. E iremos defende-los e tentar até ao máximo das nossas forças dar-lhes a dignidade que lhes é diariamente retirada, em tantos locais por esse país fora e em todo o mundo. A dignidade que será negada aos bezerros no próximo dia 10 Maio, num cercado em frente ao Intermarché da Malveira.
Para nós, tal como os humanos, os animais são também o nosso “próximo”.
A tradição não pode ser uma desculpa para o abuso de seres sensíveis e o concelho de Mafra, que se pauta pela vontade de ser amigo dos animais não pode, na nossa opinião, ser compatível com esta forma de expressão pouco ética e compassiva.
Podemos fazer mais e melhor. Com amor e compaixão.