Publicação continuada – preservação e valorização
“A memória tradicional …foi ponto de partida para a recolha assídua de testemunhos, documentos, imagens, tudo o que significasse sinal visível daquilo que já foi. É aí que surgem os lugares onde a memória se cristaliza das mais diversas formas, … No concelho de Mafra, para além dos religiosos não existem lugares de memória; o único Museu Municipal encontra-se encerrado há já muitos anos.”
Começo estas linhas lembrando um parágrafo do meu último artigo de opinião publicado neste jornal, por entender ser necessário explicar melhor o que se passa no nosso Concelho no que concerne a esta matéria. Quem consulte na página web do Município de Mafra o separador ‘Cultura’, fica com a sensação de que está frente ao ‘Concelho Ideal’ em termos de ‘Lugares de Memória’. Estará? Diz o Município:
“Conhecer, preservar e divulgar a singular herança reunida no concelho de Mafra são tarefas que impõem diferenciadas abordagens aos públicos do património: a publicação continuada de resultados de investigação, a definição e animação de rotas e circuitos de visita, a realização de exposições temporárias”
Vejamos então como o Município divulga os resultados de investigação. No separador ‘Publicações Municipais’ extraímos os números relativosi à “publicação continuada de resultados de investigação”:
A ‘continuidade’ quebrou-se em 2009, soluçou em 2011 e quedou-se por aí.
Quanto à realização de exposições, gostaria de lembrar, que o Município possui encaixotado o espólio do escultor Domingos Soares Branco, que não vê a luz do dia há muitos anos. No entanto diz sobre isso: “…a preservação e valorização do espólio do escultor Domingos Soares Branco, nome marcante da escultura contemporânea portuguesa da segunda metade do século XX. Composto por cerca de 13.000 peças…”
As demais secções afinam pelo mesmo diapasão. Tudo isto se resume à inexistência de uma política editorial para o Município, que o penaliza, penaliza os munícipes e, talvez o pior de tudo, deixa na sombra todo um enorme trabalho de uma qualidade sem par das equipas que sem cessar, mantêm produtivos os seus departamentos. Chama-se a isto ‘trabalho de gaveta’.
Cansa, desmotiva, consome dinheiro e não leva a lado nenhum.
O mal vem de longe. Em 8 de Novembro de 1846, D. Maria II fez publicar no Diário do Governo nº. 267ii a Portaria Circular pela qual as câmaras municipais ficaram incumbidas de criar os seus ‘Anais do Município’, onde “annualmente se consignem os acontecimentos e os factos mais importantes que occorrerem, e cuja memoria seja digna de conservar-se”.
Desde essa altura, por uma razão ou por outra, o poder local, revelando falta de rasgo e escudando-se na inexistência de meios e de dinheiro, deixou cair no esquecimento esta obrigação, enquanto os governos centrais, sempre na mira da ‘poupança’ (ai o défice…) só lhes tem faltado bater palmas.
Atente-se nas visitas amanteigadas do Ministro da Cultura a Mafra, fazendo um autêntico jogo de gato e rato, naquele discurso melodramático do ‘V. Exa. Sr. Presidente / V. Exa. Sr. Ministro’. Corta-se a fita de um Caminho de Poesia, assinam-se protocolos, e sem protocolos saem pela porta de trás. E para trás ficam também os Carrilhões, o Museu da Música, a Tapada de Mafra e a Área de Património Histórico e Arquitetónico sobre a qual nos diz a página do Município ‘A principal atribuição da área …é a constituição da Carta Municipal de Património, … que serve de base às orientações estratégicas autárquicas para esta área cultural’. Era bom que nós munícipes fossemos informados destas estratégias. Será que existem?
Mafra, 15 de Maio de 2018
Mário de Sousa
i http://www.cm-mafra.pt/pt/municipio/cultura/publicacoes-municipais. Última consulta a 2018-05-15.
ii Collecção Official de Legislação Portuguesa redigida pelo Desembargador Antonio Delgado da Silva, Anno de 1846, Lisboa, Imprensa Nacional, 1847, pág. 498. Disponível na Internet em <URL: http://net.fd.ul.pt/legis/1847.htm>. Última consulta a 2018-05-15.