Um Livro e um Abraço
O título deste artigo é o nome de um site “A book and a hug”[i] A sua introdução, “Leia ao redor do mundo” é o manifesto da força que um livro pode ter ao desaguar num abraço: “A nossa esperança é que ao lerem histórias de tantos países, todas as crianças entendam as muitas semelhanças que existem entre nós. Esse será o caminho que nos trará a aceitação e a amizade entre todos.”[ii]
Portugal aparece no mapa mas quando se clica sobre ele… NADA! Está vazio.
Por isso é de saudar a iniciativa da Câmara Municipal de Mafra ao instituir o “Prémio Literário do Município de Mafra” que visa “incentivar, promover e divulgar a criação literária.” No “Dia Mundial da Poesia, 21 de março de 2021, …/… procederá, em cerimónia pública, à apresentação da edição da obra premiada e à atribuição do valor pecuniário de dois mil euros ao vencedor deste certame.”[iii]
E agora Mafra? Temos o prémio, temos o vencedor, temos o livro mas não temos os leitores. E se um livro é escrito pelo escritor, neste caso por um poeta, quem faz o livro não é só o editor; os verdadeiros artífices são os leitores.
A 4 de Dezembro de 2019 escrevi neste jornal “…a carestia de eventos literários numa Vila que possui um Palácio Nacional com uma das mais famosas bibliotecas do Mundo mantém-se arredada dos livros e das leituras. …/… É uma pena Mafra ser só música. Que bem que lhe ficava acrescentar ao título a palavra ‘Leitura ’”[iv]
Com a pandemia tudo piorou e se o caminho a percorrer já era difícil, agora o desafio de formar leitores neste cenário pandémico não se afigura fácil; mas não é de todo impossível.
Estou certo que as Bibliotecas Municipais o poderiam fazer retomando com os cuidados necessários, as sessões de leitura nas figuras de Clubes, Tertúlias ou Oficinas de Escrita e Leitura. Volto a lembrar que tudo isso existiu em Mafra e foi impiedosamente desfeito por um economicismo inexplicável. A leitura deixou de ser estimulada alimentando o já existente desinteresse e a indiferença pelo universo da escrita. O gosto pela leitura começa em casa e não na escola quando o aluno é obrigado a ler ‘livros clássicos’ da literatura portuguesa os quais aparentemente, não têm qualquer conexão com o seu quotidiano.
O resultado é o ficarem a odiar a leitura porque o que encontraram como obrigatório foram ‘coisas chatas e difíceis de perceber’. A leitura começa em casa mas numa grande parte dos casos os livros, a existirem, servem para decorar estantes, hoje muito exibidas como pano de fundo em conversas nas plataformas online.
Quem não lê não escreve e basta navegar um pouco pelas redes sociais para se perceber a dificuldade que existe em se conseguir exprimir ideias ou tirar simples ilações de uma qualquer notícia ou post.
Por isso, criar prémios literários, editar livros e não formar leitores é pouco mais ou menos como fabricar instrumentos musicais e não ensinar ninguém a tocá-los.
Mais uma vez recordo que por estas alturas andará o executivo a trabalhar o Orçamento Municipal para 2021. Contemplar as Bibliotecas Municipais com as verbas necessárias para que possam enfrentar dignamente este trabalho hercúleo de criar e resgatar leitores à escuridão literária do concelho, seria uma atitude óbvia, urgente e digna.
Foi com atitudes inovadoras e destemidas que Óbidos conseguiu construir o seu Festival Literário Internacional ‘Fólio’. Porque não seguir-lhe o exemplo?
Mafra, 27 de Outubro de 2020
Mário de Sousa
[i] https://abookandahug.com/read-around-the-world/
[ii] Tradução livre.
[iii] https://www.cm-mafra.pt/cmmafra/uploads/document/file/3906/edital_n_o_144_2019___aprovacao_do_premio_literario_do_municipio_de_mafra.pdf
[iv] https://jornaldemafra.pt/2019/12/05/opiniao-politica-mario-de-sousa-cds-pp-a-leitura-prejudica-gravemente-a-ignorancia/
Pode ler (aqui) outros artigos de opinião de Mário de Sousa
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