OPINIÃO POLÍTICA | José Martinez – Dia Internacional da Mulher

Nada se comemora em Mafra, nada se comemora que apele ao progresso, à afirmação dos direitos sociais e políticos.

Em Mafra comemora-se o passado, não se evoca o passado numa prespectiva de projectar o futuro. Ensaia-se o deslumbramento!

O exemplo mais recente foi a comemoração do lançamento da primeira pedra do convento, obra de afirmação do poder absoluto e da promiscuidade entre o poder secular e o poder eclesiástico tão querida do PSD de Mafra.

Faço estas considerações porque ao pensar que assunto versar nesta crónica me surgiu a ideia de apoiar as comemorações do dia Internacional da Mulher.

É comum quando se escreve sobre o dia Internacional da Mulher fazer menção à repressão a que foram sujeitas trabalhadoras em luta que nos Estados Unidos da América e na Europa enquanto defendiam os seus direitos como trabalhadoras.

Desde a inclusão no mercado de trabalho das mulheres que se verifica a desigualdade de direitos em relação aos trabalhadores masculinos.

A evocação desta realidade com referência ao passado pode parecer que é apenas uma efeméride.

Para os que “pensam” que o 25 de Abril não foi uma revolução basta atentarmos na revolução que foi, têm sido, os avanços na emancipação da mulher, no final transcrevo algumas notas.

Fomos nós, homens e mulheres que ao longo de décadas, antes e de forma muito acelerada, depois do 25 de Abril, revolucionámos as leis e as mentalidades.

A determinação das mulheres e as suas associações foi fundamental para os avanços conseguidos, se aqui os registo são para o encorajamento à persecução da luta necessária para a promoção do direito a trabalho igual salário igual, à saúde para todos, segurança social, justiça, habitação e transportes, mas também o acesso a uma rede pública de apoio à infância, aos idosos e à pessoa com deficiência.

É por tudo isto que no dia 10 lá estarei e apelo a todas e todos que não faltem à manifestação promovida pelo Movimento Democrático de Mulheres, que assinala este ano 50 anos de atividade, em Lisboa, jornada de celebração e afirmação de uma força social empenhada na promoção de valores como o respeito mútuo, a igualdade e a solidariedade.

Algumas Notas

No trabalho

– Em 1974, apenas 25% dos trabalhadores eram mulheres; apenas 19% trabalhavam fora de casa (86% eram solteiras; 50% tinham menos de 24 anos).

– Ganhavam menos cerca de 40% que os homens.

– A lei do contrato individual do trabalho permitia que o marido pudesse proibir a mulher de trabalhar fora de casa.

– Se a mulher exercesse actividades lucrativas sem o consentimento do marido, este podia rescindir o contrato.

– A mulher não podia exercer o comércio sem autorização do marido.

– As mulheres não tinham acesso às seguintes carreiras: magistratura, diplomática, militar e polícia.

– Certas profissões (por ex., enfermeira, hospedeira do ar) implicavam a limitação de direitos, como o direito de casar.

Na família

– O único modelo de família aceite era o resultante do contrato de casamento.

– A idade do casamento era 16 anos para o homem e 14 anos para a mulher;

– A mulher, face ao Código Civil, podia ser repudiada pelo marido no caso de não ser virgem na altura do casamento.

– O casamento católico era indissolúvel (os casais não se podiam divorciar).

– A família é dominada pela figura do chefe, que detém o poder marital e paternal. Salvo casos excepcionais, o chefe de família é o administrador dos bens comuns do casal, dos bens próprios da mulher e bens dos filhos menores.

– O Código Civil determinava que “pertence à mulher durante a vida em comum, o governo doméstico”.

– Distinção entre filhos legítimos e ilegítimos (nascidos dentro e fora do casamento): os direitos de uns e outros eram diferentes.

– Mães solteiras não tinham qualquer protecção legal.

– A mulher tinha legalmente o domicílio do marido e era obrigada a residir com ele.

– O marido tinha o direito de abrir a correspondência da mulher.

– O Código Penal permitia ao marido matar a mulher em flagrante adultério (e a filha em flagrante corrupção), sofrendo apenas um desterro de seis meses;

– Até 1969, a mulher não podia viajar para o estrangeiro sem autorização do marido.

Saúde Sexual e Reprodutiva

– Os médicos da Previdência não estavam autorizados a receitar contraceptivos orais, a não ser a título terapêutico.

– A publicidade dos contraceptivos era proibida.

– O aborto era punido em qualquer circunstância, com pena de prisão de 2 a 8 anos. Estimavam-se os abortos clandestinos em 100 mil/ano, sendo a terceira causa de morte materna.

– Cerca de 43% dos partos ocorriam em casa, 17% dos quais sem assistência médica; muitos distritos não tinham maternidade.

– A mulher não tinha o direito de tomar contraceptivos contra a vontade do marido, pois este podia invocar o facto para fundamentar o pedido de divórcio ou separação judicial.

Segurança Social

– O regime de previdência e de assistência social caracterizava-se por insuficiente expansão, fraca cobertura de riscos e prestações sociais com baixo nível de protecção social.

– O número de trabalhadores(as) abrangidos com o direito a pensão de velhice era muito reduzido. Pouco antes do 25 de Abril, o número de portugueses a receber pensão era cerca de 525 mil.

– Não existia pensão social, nem subsídio de desemprego.

– A pensão paga aos trabalhadores rurais era muito baixa e com diferenciação para mulheres e homens.

– Não existia pensão mínima no Regime Geral e a pensão média, o abono de família e de aleitação atingiam valores irrisórios.

– As mulheres, particularmente as idosas, tinham uma situação bastante desfavorável. A proporção de mulheres com 65 anos e mais que recebia pensões era muito baixa, assim como os respectivos valores.

Infraestruturas e equipamentos sociais

– Em 1973 havia 16 creches oficiais e a totalidade, incluindo as particulares, que cobravam elevadas mensalidades, abrangia apenas 0,8% das crianças até aos 3 anos de idade.

– Não existiam escolas pré-primárias públicas e as privadas cobriam apenas 35% das crianças dos 3 aos 6 anos de idade.

– Quase 50% das casas não tinha água canalizada e mais de metade não dispunha de electricidade.

Direitos cívicos e políticos

– Até final da década de 60, as mulheres só podiam votar quando fossem chefes de família e possuíssem curso médio ou superior.

– Em 1968 a lei estabeleceu a igualdade de voto para a Assembleia Nacional de todos os cidadãos que soubessem ler e escrever. O facto de existir uma elevada percentagem de analfabetismo em Portugal, que atingia sobretudo as mulheres, determinava que, em 1973, apenas houvesse 24% dos eleitores recenseados.

– As mulheres apenas podiam votar para as Juntas de Freguesia no caso de serem chefes de família (se fossem viúvas, por exemplo), tendo de apresentar atestado de idoneidade moral.”

Já foi assim em Portugal!

 

 

Partilhe o Artigo

Leia também