Todos sabemos onde é a Basílica do Palácio Nacional de Mafra, sabemos que foi erigida a partir da vontade de um monarca, João V de Portugal, e que foi o ouro do Brasil baseado no trabalho escravo que a pagou. Por outro lado, supomos que poucos mafrenses saibam que há um templo que comemorou ontem os 70 anos de serviço à comunidade de crentes que com o seu dinheiro o erigiu.
Não, não se trata, como já devem ter adivinhado, de um templo católico, trata-se, sim, de um templo de uma denominação evangélica pentecostal, Assembleia de Deus, localizado na Rua Paulo Freire nº 6 – Templo Ebenézer.
Contactados por Paulo Veiga (Pastor) responsável pela da Assembleia de Deus em Mafra, o Jornal de Mafra correspondeu com uma reportagem destinada a sublinhar esta comemoração. Num país onde a Igreja Católica Apostólica Romana (ICAR) é rainha e num concelho onde as tradições religiosas há muito que condicionam a cultura e a política local, dar voz à diferença é contribuir para o desenvolvimento do concelho e para a liberdade de expressão.
Tratando-se embora de uma denominação religiosa que só congrega cerca de 130 crentes na vila de Mafra, tivemos ontem a oportunidade de saber que, embora com naturais limitações, as pessoas congregadas em torno deste templo evangélico, para além das actividades estritamente religiosas, dedicam-se também a trabalho social e a trabalho com jovens.
Em 1947 iniciam o trabalho em Mafra, a partir de um casal de suecos que por aqui começou o trabalho religioso que desembocou na comemoração de ontem, e uma vez adquirido o terreno é erigido o actual templo a partir de dádivas e de contributos dos crentes.
Quisemos saber o porquê de tão poucos crentes congregados nesta igreja, é Paulo Veiga que nos responde “o nosso entendimento é que devemos levar uma vida influente, uma vida de compromisso, e isso torna-se difícil”, já no que toca à relação com a igreja católica, ficámos a saber que embora não havendo uma relação institucional, no que respeita ao serviço social, há iniciativas em que ambas as igrejas trabalham de uma forma muito próxima, nomeadamente a nível hospitalar.
Incontornável, neste contexto, seria tocar na questão dos evangelistas norte-americanos e na sua forma suis generis de pregar “isso é muito próprio da cultura norte-americana […] não é a nossa maneira mas […] todas as maneiras de pregarmos o evangelho […] é importante […] mas o que é certo é que Jesus utilizou tudo o que era preciso utilizar, desde milagres a parábolas […]”.
Esta igreja dedica-se também ao apoio social, nomeadamente através da distribuição de cabazes por pessoas necessitadas.
Assistimos depois ao culto. Um culto dominado pela música, música a acompanhar um texto religioso quase panfletário, marcado por ideias muito repetidas e por algum furor religioso (embora algo contido).
“Temos que orar por eles”, sem ironia, foi a resposta que ouvimos do pastor Paulo Veiga, quando perguntámos acerca das relações deste culto com as autoridades civis, referindo depois a vontade de vir a exercer uma maior influência social.
Num microcosmos dominado pela ICAR, num sistema sócio-politico local onde os detentores de cargos políticos incensam a igreja católica romana, sujeitando-se frequentemente aos seus desígnios culturais e económicos, dar voz a outras formas de ver a coisa divina, é também um acto de cidadania e uma forma de celebrar a diferença.
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