Encerra-se no próximo domingo, mais um ciclo eleitoral autárquico. Desta vez, as razões de incerteza são bem maiores do que é habitual e são transversais a quase todo o leque partidário e a uma boa parte do território nacional.
O surgimento de dois novos partidos na liça autárquica – o Iniciativa Liberal e o Chega – e os efeitos que poderão ter na distribuição de mandatos, a posição periclitante de Rui Rio à frente do PSD nacional e a possível implosão do CDS são as principais dúvidas que deverão ficar sanadas ou alinhavadas no final da noite de domingo.
Por Mafra há coisas que nunca mudam. Como tem acontecido sempre que há eleições – e mesmo noutras ocasiões – o Jornal de Mafra pediu uma entrevista a Hélder Silva, atual presidente da Câmara de Mafra e recandidato ao cargo, presidente da GIATUL (empresa municipal) e presidente de todos os autarcas social democratas portugueses.
Mafra é um território onde a tradição tem ainda algum fulgor e por via disso, ou pelo facto de Hélder Silva se sentir politicamente mais seguro a responder a amigos, a dependentes, ou a inquiridores fofinhos – chamo-lhes inquiridores porque se trata de gente que não está legalmente habilitada a fazer jornalismo, mas que em Mafra faz o que lhe apetece sob um enorme e protetor guarda-chuva – uma vez mais, nem sequer tivemos resposta ao pedido de entrevista que em 25 de julho de 2021, apenas 18 dias depois de Marcelo Rebelo de Sousa ter marcado a data das eleições, dirigimos ao PSD Mafra.
O PSD vai vencer em Mafra, sobre isso ninguém tem dúvidas. Vencerá com maioria absoluta, disso também pouca gente terá dúvidas. A dúvida que subsiste passa por saber quantos votos perderá relativamente às autárquicas se 2017 e se poderá perder 1 ou, numa hipótese mais remota, 2 vereadores.
Àquela dúvida deverão responder três partidos na noite das eleições, o IL, o PS e o Chega.
O Iniciativa Liberal fez uma campanha viva, aguerrida e muito bem delineada, tendo em conta a falta de militantes e o reduzido orçamento com que se debateu, O IL conseguirá um vereador? À primeira vista, isso parece improvável, mas poderá ter um deputado na Assembleia Municipal, caso consiga contrariar a secagem que o PSD Mafra fez à direita no concelho.
O Chega – que pareceu inicialmente interessado em aceitar a entrevista pedida pelo JM, acabou por não marcar uma data – será, porventura, a grande surpresa ou a grande deceção da noite eleitoral mafrense. Se os votos conseguidos aqui por André Ventura nas presidenciais se consolidarem nos candidatos desta força política, o Chega assegurará um vereador, elegerá vários deputados municipais e poderá ter assento em algumas Assembleias de Freguesia. Se isto ocorrer, o grande prejudicado será o PSD. Caso o Chega se mostre um flop autárquico, algo que não parece impossível, sobretudo aqui em Mafra, onde o PSD ocupa facilmente o espetro da direita – com o CDS a perder expressão e o IL a pressionar – e com alguns dos seus militantes, mesmo o espetro da extrema-direita, as perdas do PSD serão menores podendo não ter reflexos práticos na composição dos órgãos autárquicos. O Chega será, de algum modo, a charneira destas eleições
A outra vertente da equação chama-se Partido Socialista, o maior partido da oposição. Esta força política tem uma história marcada por fracos lampejos de oposição no concelho e em alguns casos, mesmo de colaboração com a maioria que governa o concelho há muitas dezenas de anos. Nestas eleições, o maior partido da oposição mafrense, aparentemente, parece ter mudado de paradigma, pelo menos ao nível da linguagem, da organização, do envolvimento dos militantes e dos recursos de marketing que tem disponíveis. Parece também ter mudado o apoio político e financeiro que o PS da área de Lisboa lhe tem proporcionado. Uma vez contados os votos, veremos então se muda o paradigma. Conseguirá o PS Mafra recuperar o vereador que perdeu em 2017? Conseguirá manter a sua única junta de freguesia? Conseguirá penetrar no eleitorado mais jovem e nos novos residentes do concelho? As ambições desta força política dependem muito do número de votos conseguidos pelo IL e pelo Chega e por essa via, da maior ou menor quebra do PSD. A recuperação do 3.º vereador é tudo menos certa.
A CDU tem perdido força autárquica a nível nacional e a sua recuperação não é uma tarefa simples. Em Mafra, esta força política apostou, desta vez, no rejuvenescimento dos seus candidatos. Embora esta estratégia possa dar frutos a médio prazo, nesta fase, a falta de experiência política da sua candidata à câmara, dificilmente será compensada pelo seu voluntarismo. Parece previsível uma nova queda dos votos na CDU.
O PAN está apostado e confiante em aumentar a sua expressão eleitoral e passar a sua representação na Assembleia Municipal, de um, para dois deputados. Veremos se estes propósitos serão alcançados, num momento em que o partido parece ter alcançado um ponto de resistência da sua expressão eleitoral.
A nível nacional, o CDS-PP parece estar em fase de extinção. Em Mafra apresentou uma cara nova, um candidato muito empenhado, com experiência, com ideias revigorantes e com muita abertura de espírito. Também no caso do CDS, a cobertura que o PSD Mafra faz dos vários espetros da direita, deixou-lhe uma margem de manobra muito estreita. Veremos se conseguirá mais votos, no entanto, neste meio tradicionalista, o facto de o candidato não ser residente no concelho, nem “nascido e criado”, não joga muito a seu favor.
O Bloco de Esquerda, que no período autárquico anterior elegeu um deputado municipal, personalidade que só se dignou comparecer a duas ou três sessões municipais durante todo o período autárquico findo, que não fez nenhum trabalho político no concelho entre eleições, não merece agora nenhum crédito político neste território.
De nota, a não recandidatura de Fátima Caracol à frente da Junta de Freguesia de Mafra, mas que já terá um lugar de representação assegurado noutra estrutura pública, a saída pouco consensual de Bruno Ribeiro das listas do PSD à Assembleia Municipal e também a saída da vereadora do PSD, Célia Fernandes, que decidiu mudar de vida e não aparece nas listas do seu partido, veremos que caminho decidiu seguir ou que rota política já lhe destinaram.
Durante a campanha eleitoral estiveram no concelho os líderes nacionais do PAN, do Iniciativa Liberal e do Chega.
Paulo Quintela
Diretor do Jornal de Mafra