Mafra, um reino de faz-de-conta (com cortinas de fumo)
Demitiu-se António Galambas, tesoureiro da Junta de Freguesia de Mafra.
Em Mafra, logo caiu um pesado e opaco manto negro sobre este acontecimento político. Nada que surpreenda, não a demissão, que essa, apesar de tudo, é uma agulha em imenso palheiro, mas o silêncio que caiu nesta sopa, como se fosse algo a que Mafra assista com frequência, não sendo, por isso, merecedor de mais do que de um profundo silêncio.
Embora com silêncios, assistimos mesmo ao baixar de braços de um eleito pelo PSD, partido que governa este pedaço da área metropolitana de Lisboa há quase tantos anos, quantos aqueles em que o chamado Estado Novo governou os destinos deste país à beira-mar plantado.
Que o partido no poder, na circunstância, o PSD – mas poderia ser qualquer outro – verdadeiro epicentro desta demissão, passe pelo incidente como “cão por vinha vindimada” e fazendo-se de morto, pouco admira. Na realidade, todo o poder tem o sortilégio de unir as hostes, cultivando a sabedoria de minorar danos e gerindo os silêncios com mestria. De resto, nada de novo, em Mafra, o PSD tem o pouco saudável hábito político de hibernar entre eleições.
Já o silêncio e o distanciamento das oposições, teria – se este concelho fosse outro – o condão de deixar de boca aberta qualquer observador externo minimamente informado.
Provavelmente, o Bloco de Esquerda nem se terá apercebido ainda da demissão do tesoureiro da Junta de Freguesia de Mafra. O CDS-PP e a CDU, por razões que a política desconhece, mantêm-se num pesado silêncio. O PAN, que desde que este mandato se iniciou, se tem mostrado o partido da oposição mais activo no concelho, permanece politicamente ausente deste debate. O PS, que é o maior partido da oposição, emitiu um comunicado, que não enviou às redacções, dando a entender que só terá tomado conhecimento da demissão – um mês depois dela ter ocorrido, o que é surpreendente, tão surpreendente, que parece in-crível – a partir da notícia do Jornal de Mafra.
Procuremos um adjectivo suficientemente rigoroso para caracterizar a oposição política do concelho de Mafra. Apática, desinteressada, demissionista, desalentada, abúlica, ausente, incompetente, virtual, preguiçosa, medrosa? A escolha do adjectivo certo cabe, naturalmente, ao (e)leitor.
Igualmente incrível – agora sem necessidade de separação do prefixo – é a atenção profissional (ou a falta dela) dos restantes órgãos de comunicação social (OCS) a operar no concelho.
Nem uma notícia, nem um apontamento, nem um indício subtil do que se poderia vir a passar, do que se estava a passar ou do que se passou. Para além do Jornal de Mafra, mais nenhum OCS pegou na notícia, fosse sob o ponto de vista informativo, fosse sob o ponto de vista editorial.
Este silêncio mediático será por puro medo ou será por incompetência? Estarão os restantes órgãos de comunicação sujeitos a pressões inultrapassáveis? Será puro desinteresse? Será por serem alvo de pressões financeiras? Será por alinhamento partidário? Certo é, que até este momento, só um director da RCM (Rádio do Concelho de Mafra) se deu ao trabalho de comentar esta demissão, tendo-o feito numa rede social, e para dizer que prefere fazer-de-conta que não sabe.
Não nos restam mais palavras para caracterizar o clima que envolve a coisa política e a coisa jornalística no concelho de Mafra. Certo é, que nada leva a crer que a situação possa vir a alterar-se nos tempos mais próximos, tendo mesmo, pelos indícios que vão aflorando, tendência para se ir agravando.
Paulo Quintela
Diretor do Jornal de Mafra