Em Portugal, a liberdade de expressão do pensamento é respeitada, os seus limites são amplos e o estado, quer pelo seu braço político, quer pelo seu braço judicial, tem feito jus à defesa desta característica fundamental do estado democrático, característica que, no fundo, não a esgotando, está na base da liberdade de imprensa.
Em 2019, o país ocupava um muito honroso 12º lugar no ranking anual publicado pela organização Repórteres Sem Fronteiras.
“Ainda que os jornalistas portugueses sejam mal pagos e a insegurança esteja a aumentar, o ambiente reportado é relativamente calmo”, [Repórteres Sem Fronteiras]
No entanto, a liberdade de imprensa não se esgota na liberdade de expressão através dos órgãos de comunicação social (OCS).
A liberdade de imprensa faz-se da liberdade acesso às fontes.
Faz-se da igualdade de oportunidades de acesso às fontes, por parte de todos os OCS.
Faz-se de um tratamento equitativo de todos os OCS, por parte de entidades e fontes públicas.
Faz-se de acesso a condições de concorrência que sejam equitativas, para todos OCS.
Faz-se da compreensão, por parte dos próprios OCS, de que uma informação independente tem de ser exercida num espaço físico próprio, independente, sem benesses, subsídios ou proteções por parte da entidade que tem mais poder no concelho. A assim não ser, a liberdade poderá ficar invariavelmente prejudicada à partida, como gravemente prejudicada fica, seguramente, a igualdade de tratamento relativamente aos restantes OCS.
Faz-se da compreensão, por parte dos próprios OCS, de que quando um OCS é convidado para ser parceiro de uma estrutura empresarial mantida pela mais importante fonte de informação da área geográfica que cobrimos, com referência expressa a um acesso mais fácil a publicidade, esse convite põe em causa o acesso à informação em condições equitativas para todos os restantes OCS e afeta gravemente as condições de equidade da concorrência no espaço geográfico de influência daquela entidade.
Faz-se da compreensão de que não há almoços grátis.
Faz-se da compreensão de que quando defendemos condições de concorrência que sejam, à partida, equitativas para todos os OCS, estamos também a defender a liberdade de imprensa.
Faz-se da compreensão, por parte das entidades públicas, de que tratar por igual todos os OCS, para além de atender à letra e ao espírito da lei, é também uma forma inteligente de atender à necessidade de diversificação da informação por parte das populações, constituindo-se em mais um importante fator de desenvolvimento e de suporte do estado democrático.
Faz-se da compreensão, por parte das oposições, como das maiorias, do papel que a liberdade de informação e de acesso às fontes, e a liberdade de acesso nas mesmas condições de concorrência por parte de todos os OCS a trabalhar numa determinada área geográfica, desempenha no desenvolvimento local, regional, na consolidação de hábitos democráticos, na promoção da igualdade de acesso de todas as correntes de opinião à sua expressão e difusão na imprensa.
Faz-se, ainda, da compreensão, por parte de oposições e de maiorias, de que defender a Liberdade de Imprensa é defender a ética cidadã e a lei.
A liberdade de imprensa não está em causa em Portugal ou num qualquer espaço do território nacional. O que fica por demasiadas vezes em causa é a equidade de tratamento de todos os OCS no acesso à informação e no exercício da atividade, nas mesmas condições concorrenciais.
E não, não queremos nem aceitamos subsídios, nem queremos tratamento de favor. Queremos sim, que neste dia em que se comemora a Liberdade de Imprensa, não se fique com a ideia de que essa liberdade se fez/faz com condescendências ou com silêncios cúmplices carregados de dependências. A Liberdade de Informação fez-se e faz-se de arrojo, de risco, de investigação, como se faz de verdade e de contínua aprendizagem.
Porque este editorial é, por definição, um artigo de opinião, quero deixar bem claro, que o que aqui fica escrito, não se destina a caraterizar pessoas físicas. Nós, os latinos, sempre pujantes de testosterona, sempre prontos para a bravata ou para a adulação, temos tendência para nos sentirmos como o foco pessoal e direto das opiniões, sejam elas negativas – reagindo muito agressivamente – ou sejam elas positivas – sentindo-nos “os maiores”, assim, quero deixar bem claro, que no texto que aqui fica vertido, e que assino, como em todos os outros que produzo profissionalmente, são as instituições, as entidades, as empresas, os cargos desempenhados ou a forma como eles são desempenhados, que constituem o foco da notícia, ou da opinião, nunca as pessoas, que de resto, acabam quase sempre por ser intervenientes circunstanciais da História, embora muitas delas só venham a tomar consciência disso demasiado tarde.
Paulo Quintela
Diretor do Jornal de Mafra