Como é difícil (e perigoso?) ser escriba em Mafra
Enquanto director do Jornal de Mafra ainda não tinha experimentado uma circunstância que se vê por vezes relatada em outros órgãos de comunicação social, e de que muitos colegas se queixam, de um modo mais subtil ou de um modo mais desabrido, refiro-me a pressões intoleráveis, refiro-me a agressivas tentativas de condicionamento.
Não me refiro àquilo que, no fundo, representa a vontade legítima de todos os que actuam no espaço público, a vontade de “sair bem na fotografia”, a vontade de ver a sua imagem e as suas actividades noticiadas com cores vivas e atraentes, a vontade de ver as suas ideias ir mais longe, a vontade de “passar a perna” ao adversário. Não, não me refiro a isto. Isto pode tornar a nossa atividade mais cansativa, obriga-nos a um esforço redobrado de procura da verdade, mas, no fundo, representa um aspecto normal desta atividade, um aspecto a que devemos estar atentos, e nada mais.
Não temos, felizmente, quem “angarie publicidade por nós”, encontramos resistências, encontramos dificuldades em aceder a fontes, por vezes só chegarmos à notícia depois de ela ter passado, vermos a concorrência “instalada” e sentirmos que lutamos com armas diferentes. Estes escolhos também não nos preocupam demasiado, representam o preço que temos de pagar pela nossa independência, o preço que temos de pagar por não corrermos sempre na sombra das figuras públicas, de não nos insinuarmos em circunstância nenhuma. Confesso que pagamos este preço com algum prazer.
Aquilo que já não é admissível, é recebermos telefonemas em que somos ameaçados, recebermos telefonemas em que nos gritam aos ouvidos, recebermos telefonemas em que, contra nós, se utiliza linguagem de estrebaria. Não temos formação em psiquiatria, e por isso, não nos sentimos obrigados a dar assistência a pessoas que tendo dificuldade em lidar com a sua imagem, com agressividade, tentam condicionar aquilo que escrevemos.
Não aceitamos ser condicionados e não seremos condicionados. Manteremos a nossa independência e nossa liberdade editorial. Manteremos a nossa independência e nossa liberdade editorial porque podemos, porque não dependemos de ninguém, a não ser de nós mesmos e do nosso trabalho.
O Jornal de Mafra tem pouca publicidade. As razões disso passam pela crise económica que o país tem atravessado, pela pouca importância que as empresas locais ainda dão à publicidade, pelo facto de, em alguns meios, haver resistência a entregar publicidade a um órgão de comunicação social do concelho que não mete notícias na gaveta e que investiga.
Há ainda duas outras razões para haver pouca publicidade no JM. Somos poucos para o muito trabalho implicado na manutenção de um jornal diário com uma importante vertente de investigação, e esse muito trabalho tem-nos impedido de desenvolver verdadeiras campanhas publicitárias. Finalmente, quem aqui trabalha, tem outra ocupação, outros saberes, que constituem a sua real fonte de rendimento. Se estivéssemos limitados às receitas do jornal, já há muito teríamos encerrado, fazendo a vontade a alguns, ou já teríamos, na pior das hipóteses, morrido de fome. Vejamos, o directora do outro jornal da vila, é também, não constitui segredo, professora do ensino secundário, o director de um dos jornais da Ericeira, dedica-se igualmente às artes gráficas. O director do Jornal de Mafra é tradutor, não trabalha para empresas do concelho, felizmente, e não recebe subsídios locais ou nacionais, nem faz fretes, e sobretudo não vive à custa dos impostos dos portugueses, antes, é um pagador liquido de impostos, e ainda bem.
Quanto ao resto, os telefonemas intimidadores de deputados municipais em funções, dirigidos a directores de órgãos de informação, não constituem certamente uma novidade, e, no que nos diz respeito, não nos tirarão sequer o sono, embora, tanta agressividade, nos faça ponderar se devemos, ou não, preventivamente, alertar as autoridades policiais.
Paulo Quintela
Director do Jornal de Mafra
Carteira Profissional TE-1029
Lamentável o comportamento desse autarca.
São situações caricatas que só definem quem assim procede.
Viver não custa, diz a letra de um fado; custa é saber viver.
Escrever, para muitos é uma necessidade inerente à própria existência, assim como ler é um acto de cultura que enobrece o espírito e enaltece o ego.
Siga em frente e ultrapasse os obstáculos.
Cumprimentos.