EDITORIAL || A insustentável leveza da oposição em Mafra

A insustentável leveza da oposição em Mafra

 

Por compreensíveis razões – quem está no poder é que faz obra, é que define metas, é que se ilumina ou se ofusca – a comunicação social e a opinião pública tendem a dirigir o seu olhar, mais para quem exerce o poder, do que para quem exerce  oposição. Acresce, no caso da comunicação social, daquela que não abdica de exercer a sua função plena, a obrigação de estar especialmente atenta ao exercício dos poderes, aos seus limites e aos meios utilizados para exercer esse poder democraticamente conferido.

Vamos, pois, dirigir o olhar para a oposição/as oposições no concelho de Mafra.

Se olharmos de longe, não veremos oposição. O partido do poder exerce-o sozinho há tanto tempo que, para quem olha de longe, a paisagem política parece completamente tingida de laranja. As associações, que no fundo, não passam de “novas” formas de acesso a poder local e a fundos autárquicos, as colectividades desportivas, as organizações da economia social, as misericórdias, a igreja católica, uma boa parte dos órgãos de comunicação social locais, algumas empresas e mesmo algumas instituições de carácter cultural ou artístico, vivem à sombra do poder estabelecido.

Com o passar dos anos, dos decénios, o mafrense laranjal transformou-se num frondoso eucaliptal, tendo secado quase tudo à sua volta. A oposição, paulatinamente, foi-se habituando ao seu papel de subalternidade e as naturais inércias do sistema foram fazendo o resto.

Recentemente, com a entrada de duas novas forças políticas na liça eleitoral do concelho, o costumeiro panorama poderia/poderá sofrer algumas alterações. O tempo o dirá.

Os dois partidos tradicionais da esquerda, o PS e o PCP (CDU) parecem enquistados, acantonados nas suas contradições estratégicas, paralisados pelas suas opções tácticas, manifestando uma inquietante incapacidade de crescimento, uma incapacidade de conquistar terreno ao nível dos grupos que se movimentam na sociedade civil, que se movimentam no concelho. Devido à sua rigidez organizacional, ao seu enquistamento teórico, à incapacidade de atrair sangue novo, ou então, devido ao prosseguir de estratégias de poder pessoal (caciquismo de esquerda), falta de enraizamento no eleitorado, historial de realinhamento com o poder, incapacidade organizacional ou lutas pelo poder no sei das organizações, tudo isto têm afastado os partidos tradicionais da esquerda, da luta pelo poder. Não parece haver condições para que esta situação se altere no médio prazo.

O Bloco de Esquerda, com votações interessantes no concelho quando se tratou de eleições nacionais, e embora dispondo de um deputado na última legislatura autárquica, não conseguiu implantar-se estruturalmente no concelho. Tem feito muito pouco trabalho político, deixou-se infiltrar (por falta de militantes?) por elementos que nada terão a ver com as posições próprias do partido e debate-se actualmente com a necessidade de focar a sua acção política e de acertar a sua actuação com o todo que o BE constitui a nível nacional. Assim, também este partido da esquerda se encontra actualmente, no concelho, em condições semelhantes às dos partidos da esquerda clássica.

Pela direita, o CDS-PP vive também tempos difíceis no concelho. A colagem do PSD Mafra à igreja católica retira ao CDS uma das suas mais importantes armas políticas e sociológicas. Por outro lado, o apoio do PSD Mafra à ala mais á direita do PSD nacional, acaba por retirar também ao CDS alguma da sua margem de manobra. Em termos estratégicos, a direcção do CDS-PP tem, por aqui, uma tarefa quase impossível, pois, ou se cola demasiado ao PSD e não cresce, ou se distancia demasiado e deixa de poder aspirar a ser governo local em parceria com os social-democratas.

Resta, pois, a força política que entrou mais recentemente nas lides políticas do concelho. O PAN. Baseado em termos afectivos num conceito que hoje atrai muita gente, a luta pelos direitos dos animais, aliando a isso um certo pendor ecologista, misturado com uma nova forma, embora ainda muito tímida, de olhar para as causas da cidadania, o PAN pode, a prazo, vir a revelar-se a grande surpresa política do concelho de Mafra. Bem coordenado a nível regional, com um bom desempenho a nível político no quadro local, utilizando muito bem os meios de comunicação social, com um discurso assertivo, com intervenções bem preparadas, conhecendo bem os dossiers que constituem o seu núcleo teórico, o PAN corre o risco de, em breve, vir a enfrentar uma crise de crescimento para a qual não sabemos se estará preparado, em termos de quadros políticos e de consolidação ideológica.

Em conclusão, o PSD Mafra – no caso que nos toca – estará em condições – caso não apareçam por aí grandes escândalos políticos – de continuar a governar o concelho por mais vinte anos, pelo menos. Perdem com esta situação, os munícipes do concelho de Mafra, como perdem todos os munícipes, todos os cidadãos, todos os contribuintes que residem em áreas geográficas, sejam países, municípios ou freguesias, dominadas pela mesma força política, seja ela qual for, durante decénios e decénios. Será preciso dar exemplos?

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