Bullying na Escola António Bento Franco, na Ericeira não merece respostas da escola ou da CPCJ de Mafra

 

O bullying é uma forma de violência física ou psicológica, um comportamento antisocial com carácter sistemático e intencional, de difícil detecção, que pode ter consequências negativas para as crianças e jovens directa ou indirectamente envolvidos“. [Bullying em meio escolar: percepção dos professores sobre a detecção, prevenção e combate ao problema, Carrilho, Alice de Jesus Dias Abrantes]

“Sou mãe, e encarregada de educação de uma aluna […], da escola Básica e Secundária António Bento Franco, na Ericeira”, assim começa o relato que remete para uma situação de bullying que tem início no final de 2021.

Desde o final do ano de 2021, as situações de bullying (em várias formas) vêm-se agravando. Desde extorquir o lanche a uma colega, roubar pulseira a outra, bater com livros na cabeça de colegas, colocar o pé para as crianças tropeçarem, atirar a bola de propósito nas costas, pernas e braços de colegas, bater na cara de colegas, prender colega a um poste, com cadeado de bicicleta, fazer uma espera a colegas, na saída das aulas, para os intimidar e humilhar com palavras do tipo: “chamar de gordo“”.

As situações descritas terão sido reportadas ao respetivo ao diretor de turma, professor […], e a um membro da direção da escola, a professora […]. A 11 de fevereiro deste ano ocorreu uma reunião onde “foi prometida uma solução por parte da escola”. Para esta reunião foram convocados os encarregados de educação dos alunos vítimas de bullying e dos alunos implicados, sendo que os adultos responsáveis por estes últimos, como é comum em situações deste tipo, não compareceram à reunião.

Também a GNR (serviço Escola Segura) foi alertada por esta mãe, mas “a escola não os comunica sobre nada que se passa de anormal”, tendo sido só após ter sido alertada por esta mãe, que no mês de março de 2022, a GNR fez uma intervenção junto da turma. Ainda segundo o relato que esta mãe fez ao Jornal de Mafra, após esta intervenção, “os alunos mantiveram-se quietos”.

Na sexta-feira, 6 de maio, um dos alunos acusados de bullying “voltou com o seu mau comportamento. Estava um grupo de meninas da sala jogando vôlei, quando ele arremessou uma bola nas costas [do deiscente de quem a nossa fonte é mãe], de propósito” e depois. “ainda não contente, arremessou de propósito no braço direito dela, deixando um vermelhidão no local. Dando risadas […].

Prossegue esta mãe, “já cansada desse problema, que se arrasta sem solução desde o ano passado, mais uma vez estive na escola para conversar sobre os factos que começaram a acontecer novamente. Fui recebida pelo professor[…], que nos disse que isso são situações normais. Realmente, naquela escola tem sido, os alunos que mandam e desmandam, não tem regras, não são disciplinados por nada de errado que façam”. “O professor/diretor de turma […], o que faz ainda é intimidar a minha filha, dizendo-lhe que não tem que dizer em casa, tudo o que se passa na escola”.

No relato que nos fez, esta mãe conclui afirmando algo que nos tempos que correm é, de alguma forma, surpreendentemente saudável “causa-me revolta, vivo em Portugal há 19 anos, as minhas filhas são nascidas cá, aqui tenho feito a minha vida. Respeito e admiro o país que me tem dado oportunidades, trabalho como assistente operacional de ação educativa na Câmara Municipal de […], lido com crianças todos os dias, elas precisam de regras. Quando os pais não dão limites, sei que o papel da escola fica mais complicado, mas tem que haver responsabilidades por parte da escola, tentar de várias formas consciencializar esses alunos dos seus erros […]”.

Um dos alunos envolvidos neste caso de bullying, tem-se mantido afastado, pois foi alvo de queixa na GNR da Ericeira devido a um episódio ocorrido fora da escola, em consequência dos problemas que ocorrem na escola. Ainda relativamente a este caso, dois alunos da Escola António Bento Franco foram referenciados junto da CPCJ de Mafra.

O que peço a vocês, é que de alguma forma consigam sensibilizar essa escola, e alguns dos leitores sobre essa situação triste, desses abusos que vêm a acontecer.

Isso tem que ter um fim”.

Com esta ideia sintetiza esta mãe as razões que a levaram a tornar pública esta situação.

Contactámos a CPCJ de Mafra (Comissão de Protecção de Crianças e Jovens do Concelho de Mafra), a quem colocámos três questões. Perguntámos se a CPCJ estava a par destes casos, perguntámos como é que a comissão avalia a colaboração da escola, dos docentes envolvidos, e da direção, no tratamento deste caso e finalmente quisemos saber que medidas concretas tomou e/ou vai tomar a comissão no sentido de sensibilizar a escola para a necessidade de por cobro a esta situação de bullying.  Respondeu a CPCJ de Mafra do seguinte modo: “a Comissão de Proteção de Crianças e Jovens de Mafra, tem o dever de proteger a confidencialidade dos casos, conforme o previsto na Lei, pelo que não pode naturalmente falar sobre casos e/ou situações específicas”. Por razões de confidencialidade em relação a pais e alunos, deixa a CPCJ de Mafra por responder questões relacionadas, não com isso, mas com o modus operandi da escola e da própria CPCJ de Mafra nos casos bullying, nem sequer respondendo se estava a par deste caso. 

Deixem-nos ser irónicos, na verdade, nunca vimos surgir nas televisões, membros de outras CPCJ’s a dar explicações na comunicação social…Não terá chegado o momento de as instituições do concelho entenderem que não é à comunicação social que as explicações interessam, mas sim à comunidade?

Contactámos também a Escola António Bento Franco. Os emails enviados para o endereço que a escola disponibiliza, vieram devolvidos com a indicação ‘451 Temporary local problem – please try later’. Contactada a escola telefonicamente, fomos remetidos para os endereços “problemáticos”. Encontrámos um endereço (gmail) da secretaria da escola, para o qual acabámos por enviar as questões que gostaríamos de ver respondidas. Não recebemos ainda qualquer resposta da Escola António Bento Franco da Ericeira.

Convirá ter em conta alguns dados que nos permitam pôr em perspetiva o problema do bullying em meio escolar no nosso país e compreender a sua prevalência em Portugal.

As consequências do bullying para as vítimas podem resumir-se do seguinte modo:

  • Repercussões para a saúde, em termos biopsicossociais, tornando-se mais frequentes os sentimentos de mal-estar, maior tristeza, baixa autoestima, frequentes variações de humor, súbitas alterações de comportamento (enurese noturna, tiques, problemas de sono, pesadelos, perda de apetite, roer as unhas, choro fácil, gaguez…),alguma tendência ao isolamento e uma maior propensão para comportamentos depressivos e/ou mesmo autolesivos ou até, em situações mais graves, ideação suicida ou mesmo suicídio;
  • Possíveis alterações ao nível do aproveitamento escolar, com uma diminuição da atenção/concentração, dificuldade na integração do grupo de pares e um número reduzido de amigos/as;
  • Perceção do ambiente escolar como hostil e pouco securizante.
[Fonte: Escola sem bullying. Escola sem violência”]

De acordo com um relatório da UNICEF, metade dos alunos em todo o mundo com idades entre os 13 e os 15 anos – cerca de 150 milhões de jovens – relatam ter passado por violência entre pares na escola ou nas imediações desta.

Em 2017, Portugal era o 15.º país com mais relatos de bullying na Europa e na América do Norte, ficando à frente dos Estados Unidos

  • 38% dos adolescentes com idades entre os 13 e os 15 anos reportaram ter sofrido bullying na escola nos meses anteriores;
  • 31% dos adolescentes entre os 11 e 15 anos relataram praticar bullying contra pares na escola pelo menos uma vez nos últimos dois meses;
  • Quase metade (46%) dos adolescentes dos 13 aos 15 anos indicaram ter sofrido bullying pelo menos uma vez nos dois últimos meses e/ou terem estado envolvidos em confrontos físicos pelo menos uma vez no último ano.

Em 2018, quase uma em cada quatro crianças (23%) afirmou ter sido vítima de bullying no último ano, quando em 2014 a percentagem era de apenas 10%. Os que admitem fazer bullying são agora 17%, valor que também duplicou face a 2010. Esta percentagem “cresce com a idade e é mais elevada entre rapazes do que entre raparigas”, refere o estudo “[EU Kids Online” (Fevereiro/2019)].

Segundo a PSP, das 1.898 ocorrências criminais em meio escolar registadas no ano lectivo 2017/2018, 613 foram de injúrias e ameaças e 1.285 de ofensas corporais. Os dados indicam também que a PSP registou 1.903 ocorrências no ano letivo 2016/2017, enquanto em 2015/2016 se verificaram 2.015 [PSP – Fevereiro/2019].

A escola deve:

• Implementar uma política anti-bullying nas escolas, envolvendo toda a comunidade educativa, para criar um ambiente escolar seguro.
• Criar políticas anti-bullying que façam parte do currículo, plano anual de atividades e do regulamento interno.
• Criar mecanismos de formação e sensibilização para professores e profissionais sobre a problemática do bullying, para melhor lidarem com estes incidentes e melhor apoiarem as vítimas, as testemunhas e os agressores/as.
• Deve diagnosticar os efeitos do bullying (onde, como e com quem), através de questionários aplicados aos/às alunos/as e outros membros da comunidade.
• informar, sensibilizar e mobilizar sempre que possível.
Observatório Nacional do Bullying regista mais de 400 denúncias em 2020.

[Fonte: Observatório Nacional do Bullying]

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