O centralismo da capital aqui tão perto, a falta de projeção cultural do concelho de Mafra, a falta de um volume suficiente de públicos no concelho, o clima húmido da região saloia, os hábitos que se criaram (incluindo os públicos da música) na atual localização do Museu da Música (em Lisboa), a reação mais ou menos corporativa, mais ou menos de orfandade, de alguns músicos e intelectuais da capital, possivelmente, também algumas razões fundadas em clientelas por lá instaladas, o receio (não completamente infundado) de que a mudança para Mafra implique elevados custos financeiros e leve à perda de públicos já consolidados, têm sido estes alguns dos argumentos que por estes dias se vão esgrimindo entre apoiantes e detratores da instalação definitiva do Museu da Música (MM) no Palácio Nacional de Mafra.
Em 2016, os elementos da Junta de Freguesia de São Domingos de Benfica eleitos pelo CDS-PP calculavam que o processo de transferência do Museu da Música para Mafra nunca custaria menos de 6,5 milhões de euros
Os detratores da instalação do Museu da Música em Mafra utilizam ideias e adjetivos fortes na defesa do seu ponto de vista. “Catástrofe” foi a palavra escolhida por José Sasportes, ministro da Cultura de António Guterres, escritor e historiador, ex-diretor do Serviço ACARTE da Fundação Calouste Gulbenkian e ex-secretário-geral da Comissão para a Reforma do Conservatório Nacional, para se referir à instalação do MM em Mafra. Sasportes afirma mesmo que “é uma decisão do PSD e não estava no programa eleitoral do PS” e que “o programa cultural do PS apresentado nas eleições não foi seguido nem de longe nem de perto, e agora estão a seguir o do PSD”. Por seu lado, o pianista Artur Pizarro prefere referir-se ao clima de Mafra, onde, diz “não há instrumento que resista”. A diretora do Conservatório Nacional, Lilian Kopke, alinha pelo mesmo diapasão, o mesmo acontecendo com os herdeiros de Michel’Angelo Lambertini – “uma traição à sua memória” – que esteve, de algum modo, na base da criação do museu de instrumentos musicais. A “perda de identidade do museu”, o fim da ligação os meios musicais de Lisboa e às escolas de música, bem como o corte com a programação musical que o MM atualmente promove, são outras tantas razões que movem aqueles que não concordam com a transferência.
Em Mafra a área útil de exposição terá mais 1 000 m2 do que aquela que ocupa atualmente, dispondo também de uma área exterior, com cerca de 1 200 m2, que poderá ser utilizada para os mais variados eventos musicais
Do lado de Mafra estão as gentes da região (embora pouco se manifestem, diga-se) os políticos locais da situação e da oposição, a Ministra da Cultura e o próprio governo. O Ministério da Cultura funda a sua opção por Mafra numa ideia com força, a ideia da descentralização, a ideia de que Lisboa já não é (seria) a capital do império – “Mafra reúne todas as condições para a instalação do MNM”, assim se manifesta a vontade política do governo pela voz de Graça Fonseca. Mário Pereira, diretor do Palácio Nacional de Mafra apoiou desde o início os esforços desencadeados por Hélder Silva para por aqui instalar o Museu da Música. Hélder Silva, Presidente da câmara de Mafra viu na necessidade de retirar o museu das suas atuais instalações no Metropolitano de Lisboa, uma oportunidade para potenciar o “lado musical” do concelho, representado pelos carrilhões, finalmente reabilitados, pelos 6 órgãos da Basílica, pela oferta de órgãos que a câmara de Mafra tem feito à igreja católica e pela ainda recente instalação de um conservatório na vila.
Veremos como irão decorrer as obras de adaptação no Palácio Nacional de Mafra, o processo de transferência dos instrumentos, o processo de instalação no novo espaço, a criação de novos públicos, a motivação para que os músicos venham trabalhar a Mafra e, muito importante, que os fundos disponibilizados para esta operação, não venham a ser largamente ultrapassados – em 2016, os elementos da Junta de Freguesia de São Domingos de Benfica eleitos pelo CDS-PP calculavam que o processo de transferência do Museu da Música para Mafra nunca custaria menos de 6,5 milhões de euros.