Entrevista | Alice Vieira – Mulher de afetos, cidadã ativa e escritora com alma

 

Jornal de Mafra (JM) – Nasceu em Lisboa em 1943, teve uma infância difícil, que nunca escondeu. Em que medida é que isso se reflete na mulher que é hoje?
Alice Vieira – 
A infância foi má, mas deu-me algumas coisas boas. Desde logo, a ideia que se eu quiser qualquer coisa, terei de ser eu a fazer por mim, não posso estar à espera que ninguém me ajude, depois deu-me, não sei como, um otimismo inquebrantável, tive um amigo que me chamava a militante do otimismo.

A infância má poderia ter outros efeitos, por exemplo, deu cabo dos meus dois irmãos, um deles já morreu. Os feitios deles resultaram da infância que tivemos. Eu não vivi com as mesmas pessoas que eles, vivi com outros tios, e o que eu pensava, ainda miúda, era, “um dia eu nunca hei de fazer isto aos meus filhos”, que era, pô-los fora de casa, dá-los.

Quando a minha filha nasceu, eu acabei por ter de ficar no hospital e o meu marido levou a Catarina para casa, e ele dizia que não percebia porque é que eu lhe dizia “não deixes que levem a menina de casa”. Já estava a ver a minha vida a repetir-se. Havia alguém que a levava, e depois iria viver com outras pessoas e isso eu nunca quis.

Quando era miúda, o que eu queria mais na vida era sair de casa, mas sabia que para isso acontecer, eu tinha de ter um trabalho, não podia viver sob a alçada de outras pessoas e isso também foi importante para mim, comecei a trabalhar muito cedo, para poder sair de casa. E resultou, fui jornalista, a profissão que eu queria desde miúda, porque eu sabia que os jornalistas ora estavam num sítio, ora estavam noutro, nunca estavam em casa. Aprendi a dar a volta às coisas más.

Jornal de Mafra (JM) – Na adolescência e na vida adulta sentiu alguns reflexos dessa infância, nomeadamente, no plano afetivo?
Alice Vieira Houve, ainda hoje há. Eu sei bem aquilo que uma mãe sente por um filho e apesar de saber que os meus filhos me adoram, nunca estou muito certa daquilo que um filho sente por uma mãe, porque eu nunca senti nada pela minha. Durante muito tempo, isso fez-me muito mal, julgava que a culpa era minha.

Gosto de ter pessoas perto de mim, gosto muito de ligar às minhas amigas e de as convidar para jantar, sou muito de gente

Lembro-me quando a minha mãe foi operada e eu nem sabia, estava no liceu e tive um ponto de química, eu era muito má a química, e tive má nota. A professora, que conhecia os meus pais, dizia “coitadinha, como havia de ter boa nota, estava preocupada era com a mãe”, ora, eu nem sabia que ela tinha sido operada… fiquei tão aflita, pensei que, se calhar, eu devia sentir alguma coisa por ela, mas não sinto.

Jornal de Mafra (JM) – E a sua escrita reflete de algum modo essa vivência?
Alice Vieira Creio que há. O meu filho dizia-me, “há tão poucas mulheres nos teus livros”, o que é verdade, e quase não há mães. Nos meus livros aparecem tias, aparecem tias em 2º grau, aparecem bisavós e primas, mães aparecem muito poucas. Num dos meus livros aparece uma mãe, que era boa, mas eu mato a senhora no meio do livro. Havia uma amiga que me dizia, “caramba! tu não tens nenhumas mães nos teus livros, criaste esta, que era boa, e vais logo matar a senhora”, nem foi por mal, aconteceu.

JM – Mário Castrim e Mário Pinto, são os homens da sua vida eram parecidos?
Alice Vieira –
Não tinham nada a ver um com o outro, embora ambos adorassem a Ericeira.

O Mário Castrim sabia que eu tinha namorado primeiro o outro Mário e muitas vezes dizia-me “ainda um dia lhe hás de cair nas mãos” e eu respondia que já não via o homem há muitos anos, e era verdade, não o via há mais de 40 anos.

O facto de eles serem diferentes foi bom. Recordo um por umas razões e recordo o outro por outras razões, mas há coisas essenciais em que eles eram parecidos, por exemplo, eram os dois de esquerda, gostavam muito da Ericeira e ambos tinham estado em Paris.

JM – Parece haver uma luta contínua da Alice contra solidão, isso é verdade?
Alice Vieira –
Estar só foi sempre uma coisa muito complicada. Preciso de gente ao pé de mim, por isso, durante a pandemia, as coisas foram um bocadinho complicadas. Gosto de pessoas, gosto de ter pessoas perto de mim, gosto muito de ligar às minhas amigas e de as convidar para jantar, sou muito de gente, se calhar porque fui jornalista e nos jornais conhecemos muita gente. Não sou muito de estar sozinha, embora com a pandemia tenha aprendido a estar sozinha, mas sempre com muita coisa para fazer e tinha sempre a cabeça muito ocupada.

Aqui na Ericeira gosto muito de estar com pessoas, com as minhas amigas e nos bares, o que é a minha desgraça, mas sou pessoa de muito convívio.

JM – E deus? Morreu mesmo como profetizou Nietzsche?
Alice Vieira –
O meu marido era católico.

JM – Refere-se a Mário Castrim, católico e comunista.
Alice Vieira –
Católico e comunista. As pessoas não percebiam muito bem como é que um católico podia ser comunista. De resto, quando as Testemunhas de Jeová batiam à nossa porta, eu arranjava sempre maneira de me escusar, mas ela mandava-as entrar, mas passado um bocadinho já elas saiam porta fora, porque ele conhecia a bíblia como ninguém e então apanhava-as sempre.

A primeira prenda que ele deu, tinha eu 18 anos, ele tinha muito mais, tinha mais vinte e tal anos que eu, foi uma bíblia. Ele dizia-me sempre, “qualquer coisa que te atormente ou preocupe, abre a bíblia onde calhar e encontras aquilo que precisas”, e é verdade.

A minha principal vocação católica veio com o Tolentino, o cardeal José Tolentino de Mendonça, que eu já conheço há muitos anos, e que me acompanhou muito e foi muito importante para mim, até quando o meu marido morreu. Não lhe perdoo ter-se ido embora, mas qualquer dia há de ser Papa.

Temos de lhes falar sobre assuntos de agora e temos de lhes contar aquilo que se passou antes, para eles ficarem prevenidos e para saberem como é que a vida foi [sobre as crianças os jovens e a educação]

De resto, uma das coisas que me fez afastar do Partido Comunista foi o modo como eles o trataram o Mário nos últimos tempos da sua vida. Ele sempre foi do PC e esceveu muito para o “Avante”, mas esteve três meses internado no hospital e nunca ninguém do PCP foi lá vê-lo, nunca, e só houve um telefonema do Carlos Carvalhas. Quando foi o funeral, houve uma missa muito bonita, oficiada pelos Missionários Combonianos, mas os tipos do PC estavam à porta da igreja, a dizer “não entrem porque se está a rezar uma missa”.

Independentemente disto, não aceito tudo o que a igreja faz, mas isso, acho que nenhum católico esperto faz. Não sou fanática, só vou à missa quando me apetece.

Trago sempre uma bíblia comigo, mesmo os não católicos deviam lê-la, é um livro onde há tudo, há do pior e há do melhor.

Eu e D. Manuel Martis estivemos os dois durante 10 dias, na Ilha do Corvo, uma ilha onde não há nada, e dizia-me ele, porque é que os habitantes hão de ir à igreja ver um deus formatado, se eles têm deus por toda a parte?

JM – É comendadora da ordem do mérito e grande-oficial da ordem da instrução pública. Que significado atribui a estas medalhas?
Alice Vieira – O primeiro significado é terem-me sido dadas por dois presidentes de quem eu gosto muito, Jorge Sampaio, que até foi meu colega de faculdade, e o Marcelo, que é uma pessoa que eu conheço há mais de 30 anos, muito meu amigo desde sempre e com quem converso muito.

Aquilo que as medalhas representam para mim, creio que será aquilo que representam para todos os que as recebem, é o reconhecimento do trabalho feito. Se trabalho tanto, porque eu trabalho muito, é bom que esse trabalho seja reconhecido, sendo por isso que eu gosto das condecorações que recebi e dos prémios que vou recebendo, porque isso significa que trabalho muito. Se trabalhando muito, também trabalho bem, então ainda melhor.

JM – A candidatura à Assembleia Municipal aqui em Mafra, em 2013 foi a sua primeira experiência político-eleitoral? Que memórias lhe deixou essa participação?
Alice Vieira –
Foi a sua primeira experiência político-eleitoral e as memórias são as melhores. Nessa altura fizemos uma grande campanha. Nós fomos a toda a parte, a todos os lugares, foi uma grande campanha. Conheci gente que ficou minha amiga até hoje, como se fossemos amigos de infância. Conheci muito bem o concelho, foi uma grande experiência, na qual gostei muito de participar, embora depois, não tenha podido ficar.

Confesso que tenho um certo receio das próximas eleições, mas confio no bom-senso dos portugueses

JM – Candidatou-se contra Hélder Silva, o que os aproximou entretanto?
Alice Vieira –
O Hélder é meu amigo. O Hélder, a partir dessa altura passou a ser meu amigo. Há uma coisa que gosto nele, ele sabe que nunca iria votar nele, naquela altura, se fosse agora, não sei, mas não o apoiei e ele sabia disso, mas continuou meu amigo, e qualquer coisa que fizesse em Lisboa, ele aparecia, participava em tudo, mesmo sabendo que eu não era do mundo dele, e isso aproximou-nos um bocado e hoje somos amigos e isso é o que realmente importa. Quero lá saber, se faz isto, se faz aquilo, se é presidente daqui ou dacolá, não me interessa, é meu amigo, é meu amigo.

JM – E o PCP chegou a expulsa-la?
Alice Vieira –
Expulsou. Vamos lá ver, não expulsou… eu já não pagava quotas há muitos anos, nunca participava em iniciativas do partido… pensava que já estava fora do partido, nem pensai que era preciso avisar.

Não me fizeram a vida negra, mas chatearam-me um bocadinho. Se pretendiam expulsar-me, então que me expulsassem.

Não pertenço ao PCP a partir daí, de resto, eu já não pertencia, de resto nunca pertenci a organismos do PCP.

Quando há eleições eu decido em que partido votar, se o PCP fizer coisas extraordinárias que me levem a votar neles nas próximas autárquicas, sei lá, para a junta de freguesia, então com certeza.

JM – Que olhar lança sobre o Portugal político dos nossos dias?
Alice Vieira –
Isto está mau. Apesar de tudo, o Presidente tem feito o melhor que pode, o primeiro-ministro também, de resto, penso que todas as manhãs quando acorda, o primeiro-ministro pensa, “em que é me irão atacar hoje?”, às vezes até tenho pena.

Eu sou muito velha, não sou amiga destes, sou amiga dos pais. Eu era amiga era do pai do António Costa, do Medina, sou amiga da mãe, mas gosto muito do trabalho que o António Costa está fazer e do trabalho do Marcelo, até porque este não é um tempo fácil obrigando a tomar medidas que também não são fáceis, são tempos complicados para ambos.

O país não está bem, o interior não está bem, nós corremos muitos riscos. Não podemos pensar que a democracia está bem, quando não está, ou melhor, quando pode não vir a estar.

Temos de estar atentos às ameaças, temos de olhar para os partidos que vão concorrer, ver quem são e o que são realmente, para além daquilo que dizem, e temos de pensar nuito bem em quem vamos votar, mas confesso que tenho um certo receio das próximas eleições, mas confio no bom-senso dos portugueses.

JM – Porque é que Portugal parece estar sempre a recomeçar, mas leva tanto tempo a mover-se? É karma ou somos nós que ainda não nos libertámos da perda do império?
Alice Vieira –
Se calhar somos nós. S. Gregório dizia que a nossa vida é feita de recomeços e nós, realmente, estamos sempre um bocadinho a recomeçar. Agora com este, agora com aquele, agora vamos ver como que isto fica, eu acho que isso é coisa nossa, somos portugueses, é assim mesmo, logo se vê. Isso está nos nossos genes.

Estamos numa democracia, é certo, mas ela não está tão assegurada quanto poderiamos pensar

JM – Planeamos pouco?
Alice Vieira – 
Pouco.

JM – Tem percorrido o país a falar sobretudo com crianças. Ainda há esperança para nós?
Alice Vieira –
Acho que sim. Eu ando em escolas quase todos os dias e creio que tudo depende da forma como tratamos os miúdos, daquilo que lhes transmitimos.

Temos de ter em conta que são os miúdos deste tempo e não daquele de há muitos anos, temos de lhes falar sobre assuntos de agora e temos de lhes contar aquilo que se passou antes, para eles ficarem prevenidos e para saberem como é que a vida foi.

Quando vou às escolas esforço-me muito para falar com os miúdos, obviamente, sobre aquilo que leram, sobre aquilo que fazem e vêem, mas também sobre aquilo que se passou antes, como era este país antes do 25 de abril, coisas que eles não sabem, e eu esforço-me sempre muito por lhes contar, para que eles vejam o que têm pela frente. Estamos numa democracia, é certo, mas ela não está tão assegurada quanto poderiamos pensar.

Respondendo à sua pergunta, com um sim, ainda temos esperança nesta geração mais nova.

JM – Sabemos que gosta de touradas, foi um gosto que lhe ficou de Torres Novas? Então e o touro?
Alice Vieira – 
Se não houvesse touradas, o touro já estava extinto. Depois, a tourada é uma luta entre o homem e a fera e é disso que eu gosto e em Portugal, no final das touradas, o touro recolhe e não é morto na arena. Gosto muito de touradas, não sei se será a minha costela ribatejana, até porque há muitos ribatejanos que não gostam, de resto já não vou a uma tourada há uns 7 amos, mas a tourada é um espetáculo extraordinário e para quem não gosta, eu só digo, que não vejam. As pessoas ficam muito ofendoidas quando me vêem numa tourada, embora muitas delas não se ofendam por outras coisas… mas, quem não gosta, não veja.

Ser escritor dá muito trabalho, não se é escritor sem experiência de vida

JM – Como se processa a passagem de escrevinhadora, a escritora?
Alice Vieira –
Desde logo, temos de gostar muito de ler. Não concebo um escritor que não goste de ler. Mas há outra coisa que é muito importante, algo que eu estou sempre a dizer quando faço cursos de escrita criativa, é tão importante aquilo que escrevemos, como aquilo que nós rasgamos. Temos de ser muito exigentes, temos de saber que não sai logo tudo à primeira, temos de deitar fora, voltar a escrever, até que, finalmente, aparece uma frase que nós seguimos e estamos a escrever um livro.

Os primeiros textos que escrevi, lá pelos meus 15 anos, mandei-os para o Diário de Lisboa, para o Suplemento Juvenil, e a resposta que tive foi “isto é muito mau”, e era, “mas, continua a escrever, não desistas”. Houve um momento em que comecei a escrever um bocadito melhor, e foi então que vi um texto meu ser posto em destaque no Suplemento Juvenil, numa resportagem que se chamava “Lisboa às 6 da tarde”. Chamaram-me ao jornal e acabei por ficar lá a trabalhar.

À medida que vou escrevendo, eu vou sempre emendando muito, mas há livros, que depois de escritos, eu releio e penso que sou capaz de escrever melhor, e deito tudo fora e recomeço do príncipio.

Ser escritor dá muito trabalho, não se é escritor sem experiência de vida. Comecei no Diário de Lisboa com 18 anos e escrevi o meu primeiro livro com 35.

JM – E a literatura portuguesa deste tempo, está boa e recomenda-se?
Alice Vieira –
Não ando muito bem da minha cabeça, e uma das coisa que ainda me custa é ler livros, chego ao fim da primeira página e já não sei o que li. A minha médica deu-me então uma receita extraordinária, “lê só aquilo que já leste há muito tempo e de que gostaste muito, ou então lê mais biografias”, romances é que ainda me está a custar um bocadinho. Tenho lido muito pouco daquilo que se tem publicado, mas gostei muito do livro do Afonso Reis Cabral, trineto de Eça de Queiroz, “O meu irmão”, um grande livro.

JM – Quantas línguas faltam para ter livros traduzidos em todas línguas oficiais do mundo?
Alice Vieira –
Tenho um amigo aqui na Ericeira, o rapaz que tem aquela tabacaria, ali no Jogo da Bola, que é do Bangladesh. Um dia fui lá com um livro meu, a história de El-Rei Tadinho, e perguntei-lhe, “olha lá, isto é na tua língua?”, disse-me que estava escrito em bengali. Tenho livros traduzidos em muitas, muitas línguas, alemão, francês, holandês, só em inglês é que não. É muito difícil ter livros traduzidos em inglês, até o Samago foi difícil, quanto mais eu. Nunca percebi como é que o meu livro “A espada do rei Afonso”, sobre D. Afonso Henriques é tão popular na Russia.

A Ericeira é mesmo uma cidade em ponto pequeno, onde tenho tudo à porta de casa. É perfeita para mim, é lindissima e tem os cafés e os bares, isso é fundamental

O primeiro país que me traduziu foi a antiga Checoslováquia, o livro era “Rosa minha irmã Rosa” e ficou com umas ilustrações lindissimas. A história é muito engraçada, cá Rosa é nome de rapariga e de flor, mas lá não, por isso a tradução do título em checoslovaco é “Margarida, minha irmã Margarida”.

JM – Como é que uma escritora urbana se apaixonou pela Ericeira?
Alice Vieira –
Porque a Ericeira é uma cidade em miniatura. Sou incapaz de viver no campo. A Ericeira tem tudo, saio de casa e tenho os cafés, tenho os restaurantes, tenho as lojas, tenho a”Amélia”, tenho tudo.

A Ericeira é mesmo uma cidade em ponto pequeno, onde tenho tudo à porta de casa. É perfeita para mim, é lindissima e tem os cafés e os bares, isso é fundamental.

JM – Como olha para a inevitabilidade da morte?
Alice Vieira –
Não tenho medo da morte, até porque já andei lá perto bastantes vezes, aquilo de que tenho medo é, por exemplo, do Alzheimer, de ficar dependente de alguém.

Não dependo de ninguem e ninguem depende de mim, se algum dia tiver de depender de alguém, isso é que me aflige.

A morte? Gostava que fosse rápida, que não me fizesse sofrer muito, que não chateasse os meus amigos, nem mais ninguém, mas não tenho muito medo dela. Já estive tão perto dela, quando a minha filha nasceu, noutras vezes também e eu safei-me.

A morte é inevitável e se pudesse vir daqui a mais uns anitos, eu gostava, mas a verdade é que eu vivi muito bem, mesmo as coisas más que me aconteceram fizeram-me bem, tenho levado uma bela vida, fiz aquilo que fiz, fiz tudo o que eu quis e portanto vou de papinho cheio.

Nunca recordo os meus maridos com tristeza, recordo o bom que foi eu tê-los tido na minha vida e era isso que eu gostava que sentissem quando eu partir.

JM – Agora, para fecharmos com chave de ouro, quando teremos o próximo livro de Alice Vieira?
Alice Vieira –
Aqui na Ericeira todos me mandam trabalhar, querem sempre saber que livro estou a escrecer.

O meu próximo livro, até tenho vergonha de o dizer, já é o meu próximo livro, há uns dez anos [risos], é que entretanto meteram-se outros e como esse livro não foi encomendado por nenhuma editora, eu deixo-o para trás e vou fazendo os outros.

Os livros que sairam agora foram uma peça de teatro que se chama “Um anjo de barbas”, uma peça minha que até já foi representada pelo “Palco 3” uma companhia de Cascais, mas que não tinha sido ainda editada e depois este “Diário de uma Avó e de um Neto em Casa Confinados”, lançado agora na Casa de Cultura da Ericeira. Esse livro resulta de publicações que fomos fazendo no facebook e que alcançaram um grande sucesso.

Agora… desde há muitos anos que tenho vindo a preparar uma biografia da Condessa de Ségur, uma autora que todas as crianças do meu tempo liam, livros extraordinários. Eu tinha acabado de escrever e publicar uma biografia da Enid Blyton – das piores pessoas de que ouvi falar, a filha dela dizia-me esta coisa extraordinária, “eu só aos dez anos é que percebi que tinha mãe”, alguém que odiava crianças, e depois escrevia aqueles livros de aventuras para crianças e adolescentes – e quando acabei o livro decidi que se fizesse outra biografia teria de ser de alguem que tivesse sido muito boa pessoa, e foi, evidentemente, a Condessa de Ségur.

Já li quase tudo o que havia acerca da condessa, pedi textos a várias pessoas e no texto que pedi à minha filha, ela dizia que tinha sido com a Condessa de Ségur que tinha percebido o que era a luta de classes.

Assim que tiver calma irei voltar à bigrafia da Condessa de Ségur. Já li tudo o que tinha a ler, mas escrever, tenho umas três páginas escritas…

 

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