O caso das alegadas agressões a crianças na creche da Câmara Municipal de Mafra foi agora arquivado pelo Ministério Público devido a “incongruências e contradições” e pelo facto de ter havido só uma família a apresentar queixa.
O processo teve origem em notícias difundidas pela RTP em Agosto de 2015, através da divulgação de uma carta assinada por 12 das 15 funcionárias que trabalhavam na creche da Câmara Municipal de Mafra.
Desta carta, à qual o JM teve também acesso, as funcionarias da creche relatavam varias situações de alegadas agressões verbais e físicas, ocorridas no Berçário, sala onde se encontravam crianças entre os 4 e os 16 meses de idade.
Da referida carta destacamos os seguintes passos, “[…] o caso de uma criança que foi deliberadamente violentada. Sendo amarrada à cama-berço com os lençóis para que a mesma dormisse, ficando deste modo impedida de se movimentar […] frequentemente exerce força física, através de palmadas, “apertões” nos braços das crianças, empurrões, assim como manipulação intrusiva e brusca dos bebés em situações e rotinas diárias nas quais se exigia do adulto apenas cuidado e carinho, como por exemplo as mudas das fraldas, os momentos de higiene, a hora da refeição e a hora do sono […] da educadora não querer que as funcionarias dêem colo e afecto às crianças, incitando inclusivamente a que os bebés estejam permanentemente em carrinhos e espreguiçadeiras, para que, segundo a mesma, “não se habituem ao mimo”… […] em situações de doença/febre, a coordenadora não autoriza as funcionarias a contactarem os pais das crianças, houve inclusive um caso de crise alérgica grave […] e só por iniciativa da Educadora da sua sala é que os Bombeiros foram contactados […]”.
Na carta as funcionárias relatam ainda o ambiente de trabalho que em sua opinião se vivia na creche “consideramos que o mesmo não é estável nem para as crianças nem para a equipa de trabalho […] a coordenadora da creche terá utilizado por diversas vezes a sua superioridade hierárquica para ameaçar as funcionarias […] utilizando com frequência e em tom ameaçador a expressão “Quem me pisa o rabo, eu esmago a cabeça”[…]””.
Esta carta/abaixo assinado que foi enviada ao presidente da Câmara de Mafra está datada de 26 de Junho de 2015.
Em Setembro, a denúncia chegou à CMM tendo sido aberto um processo disciplinar à funcionaria em questão. A 11 de Setembro de 2015 a Procuradoria Geral da República confirmou ao Jornal de Mafra a existência de um inquérito instaurado pelo Ministério Público.
Ainda em Setembro do mesmo ano, 3 pais de crianças estiveram na sessão publica da câmara e foram muito críticos com o modo como a Câmara de Mafra estava a gerir este caso.
Em Dezembro de 2015, a responsável da creche foi constituída arguida por maus tratos a bebés.
Por essa altura é também conhecido o relatório final do processo disciplinar instaurado pela CMM. Em função dos factos apurados por este inquérito, à referida funcionária é aplicada uma sanção única de 3×140,72 € (422,25 €) tendo a funcionária sido transderida para outras funções.
Em Março deste ano o Jornal de Mafra questionou novamente a Procuradoria Geral da Republica acerca do andamento do processo, tendo obtido por resposta, que o inquérito se encontrava em fase de investigação.
O processo foi agora arquivado pelo MP, sendo que o arquivamento se ficou a dever ao facto de existirem: “várias incongruências e contradições quer entre os depoimentos das várias testemunhas, quer entre os vários depoimentos [de cada uma] das testemunhas” o que levanta “sérias dúvidas sobre se tais factos realmente se verificaram”. Outro dos motivos é o facto de “ser necessário que os ofendidos apresentem queixa para que o inquérito possa prosseguir” e como apenas uma família terá apresentado queixa, o MP ficou “sem legitimidade para por si só proceder criminalmente“.
Deste modo a conclusão do MP é que “não resultaram indícios que permitam formular um juízo de que à arguida viria a ser aplicada uma pena em julgamento“. Embora o Ministério Público se tenha decidido pelo arquivamento, será ainda possível aos pais pedir a abertura da instrução do processo, levando-o a ser apreciado por um juiz de instrução, desconhecemos se há ou não essa intenção por parte de algum dos pais.
Finalmente, na verdade há momentos venturosos, uma vez que dificilmente o timing de divulgação desta decisão poderia ser melhor do que fazê-la coincidir com o último dia de campanha eleitoral para as autárquicas de 2017.