OPINIÃO POLÍTICA | José Martinez (CDU) – Os caminhos que temos de trilhar em Mafra

JOSE MARTINEZ

OPINIÃO POLÍTICA | José Martinez (CDU)
Os caminhos que temos de trilhar em Mafra

 

Hoje não vos vou falar das vacinas e do crime de que estamos a ser vítimas por razões “ideológicas”.

A defesa intransigente dos interesses das grandes empresas farmacêuticas, assunto que merece toda a nossa atenção pela sua gravidade, por parte dos partidos do regime, PS, PSD, CDS e sucedâneos, é inqualificável e os argumentos de defesa esbarram na mais elementar apreciação critica.

As minhas preocupações, embora sendo um reflexo das verdadeiras razões que fazem com que a irracionalidade seja a linha orientadora da direita e dos que fazem a sua política, vão para as evidências concretas das desigualdades sociais de classe, de género, que dominam a nossa vida.

Esta reflexão tem suporte no estudo do nosso co munícipe, Doutor Eugénio Rosa, que em recente estudo analisa as nossas debilidades ante – pandemia evidenciadas pelas estatísticas oficiais   «o aumento da desigualdade na repartição da riqueza criada no País (PIB – Produto Interno Bruto) entre os trabalhadores e os “donos do capital” no período 2008/2019, assim como as profundas desigualdades salariais que existem entre os próprios trabalhadores e trabalhadoras, que não são apenas de género, e que permitem às entidades patronais apropriarem-se de uma parte ainda maior da riqueza criada no país».

A parte do “grande frango” nacional (a riqueza criada) recebida pelos trabalhadores, os salários, e a parte recebida pelos «donos do capital» aumentou 75,6% entre 2008 e 2019, de 7 303 milhões para 12 828 milhões de euros.

A repartição da riqueza criada no nosso país», nesse período, «a parte do “trabalho” no PIB diminuiu de 36,5% para 35% e a do “capital” aumentou de 40,6% para 41%».

O Doutor Eugénio Rosa chama-nos a atenção «esta desproporção na forma como é repartida a riqueza criada no País (PIB) ainda se torna mais clara quando se compara o número de trabalhadores com o número de “donos do capital”».

No fim do ano de 2020, os patrões seriam, segundo o INE, 222,6 mil (4,6% do emprego total) e apropriavam-se de 41% da riqueza nacional, enquanto o número de trabalhadores por conta de outrem eram 4 044 800 (83,2% do emprego total), e recebiam apenas 35% da riqueza.

Esta desproporção é agravada por uma repartição injusta dentro do conjunto dos trabalhadores, «o ganho mais elevado dos homens é 3,7 vezes superior ao dos homens com ganho mais baixo» e «o ganho das mulheres que recebem mais é 3,6 vezes superior ao das que ganham menos».

Na comparação entre homens e mulheres as desigualdades são gritantes, no escalão mais baixo, o ganho do homem é superior ao da mulher em 381 euros por ano, enquanto no escalão mais alto este diferencial ascende a 6127 euros por ano.

Estas debilidades estruturais foram agravadas pela pandemia, num estudo da União dos sindicatos de Lisboa podemos ler:

“1 – Até ao 3º trimestre de 2020, 151 empresas no Concelho de Lisboa tinham aberto processos de despedimento colectivo para despedir 1.687 trabalhadores (66,8% dos trabalhadores vítimas de despedimento colectivo no Distrito de Lisboa).

2 – O aumento do desemprego desde o início da pandemia foi exponencial.

No primeiro mês de 2021 (em Janeiro) estavam inscritos nos centros de emprego da Cidade de Lisboa 21 mil e 527 desempregados, correspondendo a um aumento de perto de 40% por comparação com o mesmo mês do ano anterior (acréscimo de 38,3%).

3 – Os primeiros trabalhadores a sofrerem a perda do emprego e a serem descartados foram os trabalhadores precários.

4 – Outra dimensão a destacar são os impactos nos mais jovens (particularmente atingidos pela quebra de emprego).

Na AML a quebra de emprego junto dos que têm menos de 25 anos foi de 15% entre 2019 e 2020, agravando ainda mais as dificuldades de entrada e de manutenção no mercado de trabalho das gerações mais novas. Esta é uma preocupação enorme.

5 – Merece também enorme preocupação a perda de emprego junto dos trabalhadores com mais baixos rendimentos.

6 – A perda de emprego junto dos trabalhadores por conta própria, muitos deles falsos trabalhadores independentes, vítimas das políticas que procuram mascarar verdadeiras relações de trabalho como falsas prestações de serviços.

A perda de emprego nesta camada foi de – 5,5% na AML, uma percentagem bastante superior à registada no conjunto do país (-2,7%).

7 – Perante tudo o atrás descrito crescem as situações de pobreza, privação e exclusão social.

Antes da pandemia, 10 em cada 100 trabalhadores em Portugal vivia em situação de pobreza.

Os salários no nosso país são tão baixos que não permitem a muitos trabalhadores saírem da pobreza. Como estarão estes trabalhadores a viver perante os efeitos da pandemia? Qual será o número de trabalhadores pobres durante e depois da pandemia?

8 – A área metropolitana de Lisboa (AML) é a região onde mais trabalhadores estiveram e estão em casa/teletrabalho.

No 4º Trimestre de 2020 mais de meio milhão de trabalhadores no país (597 mil e 500) trabalharam a partir de casa.

– 50,6% da população no país a trabalhar em casa (302.500 trabalhadores) residia na AML e a proporção de teletrabalho na região foi de 23,3% (a região com maior proporção de trabalhadores a trabalhar a partir e casa).”

E em Mafra?

Mafra, relativamente aos trabalhadores que residem em Mafra, mas trabalham noutros concelhos, estará em situação semelhante à da AML, o mesmo não se poderá dizer dos que trabalham e vivem no concelho EM que “O salário médio dos trabalhadores por conta de outrem é de 905,3 euros, contra 1 388.5 euros da AML e 1107.9 euros do continente. É o mais baixo salário médio de todos os concelhos da AML.”

Acresce que a maioria das actividades das pequenas empresas são as que mais estão a sofrer com o confinamento (cuidados pessoais e restauração).

Fará sentido que a resposta da Câmara ao PRR (Plano de Recuperação e Resiliência) aponte para acções que não sejam no sentido de baixar o custo de viver em Mafra e/ou tornar a vida mais fácil a quem vive em Mafra?

 

Mafra, 4 de Abril de 2021.


José Martinez
Membro da direção concelhia do PCP e deputado municipal pela CDU.

 


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