Viagem pelo património classificado do município de Mafra | Povoado do Penedo de Lexim

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Viagem pelo património classificado do município de Mafra:
Povoado do Penedo de Lexim

 

Povoado calcolítico, nascido do aproveitamento de um afloramento rochoso natural que, formando pequenas grutas naturais, serviu a instalação de uma pequena comunidade agro-pastoril que aqui deixou vestígios da sua atividade, como sejam, fragmentos de metalurgia do cobre e de cerâmica (decorada com folha de acácia, caneluras largas e motivos geométricos, e, ainda, posteriores exemplares com carenas acentuadas e vasos de colo alto), componentes pertencentes a “queijeiras” e pesos de tear, para além de fauna e ossos humanos. As condições naturais do afloramento rochoso permitiam que este formasse um autêntico castelo natural, que seria reforçado pela construção de muralha, constituindo-se como um exemplo das primeiras arquiteturas defensivas que surgem no terceiro milénio a.C. na Península Ibérica. Abrange uma área total de c. 8 hectares, grande parte da qual é ocupada por penedos sem qualquer condição de habitabilidade, divide-se em três plataformas: a superior, formada por um pequeno reduto delimitado pelos penedos no cume do afloramento rochoso, formando uma fortificação natural reforçada por estruturas, onde foram encontrados vestígios de ocupação humana desde o Neolítico final/Calcolítico inicial ao período Romano; uma plataforma intermédia delimitada internamente por penedos e externamente por uma linha defensiva, com pequenas plataformas entre os afloramentos, distinguindo-se, a nascente, uma área rodeada por rochas verticais, formando uma “gruta” ou “abrigo”, que corresponde à zona de maior ocupação humana (essencialmente do Calcolítico pleno); a plataforma inferior, o sopé do afloramento, envolvido em coberto vegetal, onde foi identificado um troço de muralha calcolítica.

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Época Construção: Calcolítico

Materiais: Afloramentos basálticos

Protecção: Imóvel de Interesse Público desde 26 fevereiro 1982.

PL2Enquadramento: Rural, isolado. Situa-se no ponto mais alto de uma elevação que se ergue a partir da ribeira de Cheleiros, na sua margem direita, sendo visível da Estrada de Pero Pinheiro, ao lado direito, após a rampa de Cheleiros. Encontra-se semicoberto por vegetação, nas suas imediações erguem-se, no sopé do planalto, pequenas construções destoantes em tijolo. A noroeste, situa-se a Aldeia da Mata Pequena, e, a nascente, a pequena povoação do Lexim.

Propriedade: Privada

Descrição Complementar: Espólio: foram recolhidos do local artefactos do quotidiano, como cerâmica decorada calcolítica (com folha de acácia, crucífera e canelada), cerâmica lisa, pedra lascada e polida (lâmina, lamela, ponta de seta, núcleos e lascas de sílex e quartzo hialino), osso trabalhado e metal (metalurgia em cobre e bronze), fauna e ossos humanos que se encontram no Museu Nacional de Arqueologia e no Museu Municipal Professor Raul de Almeida, em Mafra.

Área total:  8 hectares

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Cronologia
c. 72 Ma. – formação do Complexo Vulcânico de Lisboa, de que o Penedo de Lexim é parte integrante; c. 4000 a. C. – 2750 a.C. – a primeira fase de ocupação humana aqui encontrada data do Neolítico final, encontrando-se associada a uma estrutura habitacional subcircular e a fragmentos de cerâmica, lisos, taças de bordo denteado, vasos carenados e de outros exemplares cerâmicos já integrados no Calcolítico inicial, como sejam copos e taças caneladas; 2750 – 2300 a.C. – o segundo nível de ocupação encontrado, e o mais representativo, data do Calcolítico pleno e pré-campaniforme, serão já comunidades agro-pastoris, que nos legaram vestígios da sua atividade, como sejam, fragmentos de metalurgia do cobre e de cerâmica decorada com folha de acácia, caneluras largas e motivos geométricos, além de componentes pertencentes a “queijeiras” e pesos de tear; por esta altura também as condições naturais de defesa foram reforçadas através da construção de muralhas nascidas do aproveitamento do afloramento rochoso; 1300 – 700 a.C. – a terceira fase de ocupação corresponde à Idade do Bronze, altura em que parece observar-se uma diminuição na atividade humana, embora se tenham encontrado diversos artefactos metálicos e cerâmicos, estes últimos predominantemente representados por exemplares com carenas acentuadas e vasos de colo alto, não existem, contudo, exemplares de cerâmica campaniforme; ocupação Romana – foram detetados alguns vestígios construtivos (nomeadamente telhas) romanos na extremidade ocidental da plataforma superior; c. 1875 – Estácio da Veiga (1828 – 1891) descobre a estação arqueológica, da qual evidencia sobretudo a importância geológica e do coberto vegetal, não detetando vestígios da presença humana; 1879, 22 junho – 18 julho -Joaquim Scolla realiza, para a Comissão dos Serviços Geológicos, uma campanha de trabalhos em Mafra (cf. Arquivo INETI/IGM, SOUSA: 2010, vol. 1, pp. 45-46), recolhendo do Penedo do Lexim, pedaços de cerâmica, ossos de diversos animais, pontas de faca de sílex, uma seta e um machado; 1894 – Possidónio da Silva (1806-1896) desenha um fragmento de um machado de bronze encontrado em Lexim; 1931, 24 outubro – edital da Comissão Administrativa da Câmara Municipal de Mafra publicita a ida a hasta pública, a 15 de novembro, do “baldio denominado Penedo de Lexim, em 3 talhões”; 1968-1973 – labora no local uma pedreira de brita, responsável pela destruição de parte da sua encosta nascente e norte; com o início dos trabalhos da pedreira é descoberta uma gruta; 1970, 16 junho – é publicada, no jornal diário “A Capital”, uma notícia intitulada “Está a ser destruída (perto de Cheleiros) uma estação arqueológica do Eneolítico”, na qual, alertando para o perigo da sua iminente destruição, a estação é noticiada pela primeira vez, citando o senhor António Pedroso Ferreira que se havia deslocado ao local e identificado o espólio encontrado; 1970, 14 julho – os arqueólogos José Morais Arnaud, Vasco Salgado de Oliveira e Vítor de Oliveira Jorge são contactados pela Comissão Municipal de Arte e Arqueologia da Câmara Municipal de Mafra que lhes solicita a confirmação da importância da estação; o que não só atestaram como solicitaram a realização de uma sondagem de emergência; 1970, 27 agosto – a Direcção-Geral do Ensino Superior autoriza a realização de escavações, sob a orientação de D. Fernando de Almeida (1903-1979), conforme proposta dos arqueólogos citados; é então aberta uma sondagem na plataforma média do cabeço, a c. de 1 metro da pedreira de basalto, que permite uma primeira interpretação do povoado fortificado e estabelecer uma estratigrafia com quatro estádios de ocupação (do Neolítico final à Idade do Bronze), o espólio recolhido é entregue ao então Museu Nacional de Arqueologia e Etnografia; 1971 – a autarquia solicita delimitação das zonas de interesse arqueológico; 1973 – 1977, maio – instala-se no mesmo lugar uma nova pedreira; a estação é alvo de várias escavações clandestinas e consequente saque de espólio; 1975, 22 fevereiro – é publicado o Decreto n.º 80/75 no qual é fundamentada e proposta a sua classificação como Imóvel de Interesse Público (DG, 1.ª série, n.º 45); 1975, setembro – outubro – decorrem as primeiras escavações sistemáticas da fortificação pré-histórica do Penedo do Lexim, executadas por uma equipa liderada por José Morais Arnaud, que veem a confirmar a importância deste povoado fortificado para o estudo do Calcolítico do centro e sul de Portugal; 1981, 15 agosto – é fundado o Centro de Estudos Históricos e Etnográficos Professor Raul de Almeida, a funcionar na antiga casa da Câmara e Cadeia (cf. IPA.00006611), onde são depositadas a peças avulsas entretanto recolhidas por particulares; 1982, 26 fevereiro – é publicado o Decreto n.º 28/82 (DR, I Série, n.º 47), que o classifica como Imóvel de Interesse Público (IIP); 1995, 21 fevereiro – é constituído o Museu Municipal Professor Raul de Almeida, que sucede no espaço e atribuições ao anterior centro de estudos, herdando o espólio proveniente do povoado fortificado; a arqueóloga Ana Catarina Sousa estuda este espólio que cataloga como “Coleção Antiga”; 1998, 05 agosto – 05 setembro – a equipa do Gabinete de Arqueologia da Câmara Municipal de Mafra, orientada por Ana Catarina Sousa, realiza nova campanha com o triplo objetivo de retomar o estudo deste importante povoado fortificado, de verificar o seu estado após uma interrupção de mais de 20 anos entre escavações e de aprofundar o seu estudo procurando obter uma sequência estratigráfica e contextualizada de datação absoluta; 1999, abril – a estação arqueológica é alvo de vandalismo; 28 julho – 21 setembro – decorre nova campanha com o objetivo de avaliar os estragos produzidos pelo vandalismo e de continuar a caracterização das várias micro-realidades aí existentes; neste sentido, nesta nova campanha é escavada a plataforma superior do penedo e parte da intermédia, o seu setor oriental, onde se encontra o abrigo sob a rocha, já descrito desde o início da laboração da pedreira, e que permitiu clarificar a presença de uma ocupação doméstica do sítio e a existência de derrubes antigos de grandes blocos para o interior do abrigo; 2000, 17 julho – 13 setembro – decorre nova campanha arqueológica, sendo já possível a obtenção de uma estratigrafia de ocupação e a compreensão da sua morfologia durante vários períodos, na seguinte sequência estratigráfica, fase 1 Neolítico final/Calcolítico inicial; fase 2 Calcolítico pleno; fase 3 Idade do Bronze; 2002, 15 julho – 13 setembro – nova campanha, inserida no plano de trabalho 2002 – 2004, procura aprofundar o conhecimento da evolução histórica da ocupação do povoado; nesta campanha foi possível identificar uma ocupação do período romano, a mais recente das identificadas, o perímetro defensivo, com a identificação de um pano de muralha entre dois afloramentos rochosos, e a observação e reconhecimento da área de ocupação doméstica na zona do abrigo sob rocha, datável do Calcolítico inicial e pleno; 2003, 21 julho – 12 setembro – com a campanha arqueológica deste ano torna-se possível observar os vestígios de ocupação romana na plataforma superior, verificando que não tinham estruturas pétreas associadas; permite, igualmente, uma leitura estratigráfica da muralha (Calcolítico inicial e pleno), sedimentar o conhecimento sobre a datação da ocupação doméstica na plataforma intermédia e constatar a existência de novo troço fortificado na plataforma intermédia inferior, de estrutura calcolítica; 2004, 19 julho – 11 setembro – decorre a última campanha desta fase dos trabalhos, que incide essencialmente na área de ligação entre o abrigo, na plataforma intermédia, e o local de laboração das antigas pedreiras, permitindo observar as destruições sofridas pelo grande aglomerado pétreo que preenche os dois afloramentos verticais bem como o abrigo; permite igualmente observar o prolongamento da linha de muralha para norte, colocando-se a hipótese de esta marcar a delimitação da área de maior utilização doméstica (plataforma intermédia e abrigo); verificou-se que todas as estruturas defensivas do penedo, incluindo uma torre maciça adossada a uma muralha de 7 metros, se apresentam adossadas à rocha sem uma verdadeira face interna; tornou-se possível observar como última grande fase de ocupação da plataforma intermédia e abrigo o Calcolítico pleno; a escavação junto ao abrigo sob rocha evidenciou níveis de ocupação doméstica com uma provável estrutura habitacional encostada ao afloramento; foram, igualmente, identificados, pela primeira vez, escassos fragmentos de cerâmica campaniforme; foi possível observar a presença de restos humanos, como já havia acontecido sob a fenda rochosa; na proximidade foi ainda identificado um crânio de cabra em muito bem estado de conservação.

[Fonte e fotos: DGPC]

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